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Ele ‘intermedia’ (sic) ou ele intermedeia? Existe regra que evitaria o erro?

Jornal divulga notícia na área de prestação de serviços e registra: “Roraildes (nome fictício) intermedia (sic) implantação…”, citando o respectivo serviço a ser prestado aos cidadãos.

O verbo intermediar, embora termine em iar, tem como modelo nomear nas formas formas rizotônicas, no presente do indicativo, cuja forma da primeira pessoa do singular é primitiva, e em todos os tempos derivados.

Se usamos ‘eu nomeio, tu nomeias, ele nomeia, nós nomeamos, vós nomeais, eles nomeiam’, obrigatoriamente, devemos usar ‘eu intermedeio (intermedio é estranho!), tu intermedeias, ele intermedeia (não ‘intermedia’), nós intermediamos, vós intermediais, eles intermedeiam.

Forma rizotônica é aquela em que a sílaba tônica da pessoa verbal recai no radical do verbo flexionado: eu, tu, ele, eles (nomeio, …eias, …eia, …eiam, presente do indicativo).

Nas pessoas nós e vós, cujas formas verbais são chamadas arrizotônicas – a sílaba tônica cai na desinência verbal), devemos respeitar a grafia do infinitivo: iar (intermediamos, intermediais).

Servem de paradigma, além de nomear, para verbos terminados em EAR, entre outros, os seguintes: estrear, grampear, recear.

Entretanto, alguns verbos terminados em IAR seguem ‘nomear’. A ‘ponte’ de referência é dada com uma sigla didática: MARIO (M de mediar; A de ansiar; R de remediar; I de incendiar; O de odiar), e, como perfeito seguidor destes, vem ‘intermediar’. Comparando, vemos que não tem boa eufonia a pronúncia eu ‘odio’, ele ‘odia’ nem eu ‘ansio’, ele ‘ansia’. Logo, ‘intermedia’ é gritante; não soa bem, apesar de largo uso.

Se usamos odeio, logo, intermedeio; odeia, logo, intermedeia; assim, anseio, anseia, remedeio, remedeia; incendeio, incendeia. Imagine a pronúncia ‘O empregado ansia por uma boa colocação na empresa’. Ele tem ânsia; mas ele anseia. Eu tenho ódio; eu odeio. E intermediar? Trata-se de um sinônimo de mediar, por isso, a eufonia manda que sigam o modelo ‘nomear’ as formas verbais medeio, medeia, intermedeio, intermedeia.

Depois que nos habituamos à prosódia de muitos vocábulos, a pronúncia ruim soa mal. Fale com ênfase: Eu odio você, seu vagabundo! Pega mal, e o bom falante evita esse som desagradável. ‘Intermedia’, grafia incorreta, é cacografia, que se torna cacofonia (som desagradável).

O presente do subjuntivo é derivado da primeira pessoa do presente do indicativo. Se usamos ‘nomeio’, logo temos que grafar ‘que eu nomeie, que tu nomeies, que ele nomeie, que nós nomeemos, que vós nomeeis, que eles nomeiem’. A grafia ‘ee’ em nós e vós obedece à forma primitiva ‘nomear’. Observada essa regra, se usamos ‘intermedeio, nesse mesmo tempo, devemos grafar ‘que eu intermedeie, que tu intermedeies, que ele intermedeie, (mas) que nós intermediemos, que vós intermedieis, e que eles intermedeiem‘. A grafia ‘ie‘ em nós e vós obedece à terminação no infinitivo de ‘intermediar’.

Um pouco mais.

O imperativo afirmativo requer cuidados: nomeia tu, nomeie você, nomeemos nós, nomeai vós, nomeiem vocês; logo, intermedeia tu, intermedeie você, intermediemos nós, intermediai vós, intermedeiem vocês. O negativo também: não nomeies tu, não nomeie você, não nomeemos nós, não nomeeis vós, não nomeiem vocês; não intermedeies tu, não intermedeie você, não intermediemos nós, não intermedieis vós, não intermedeiem vocês.

Bastam essas formas para chamar a atenção da conjugação do verbo intermediar.

Pausa: 1. ‘Segue’ (sic) algumas dicas. Coloquemos a frase na ordem direta: Algumas dicas segue (?). Algumas dicas seguem, logo, Seguem algumas dicas. Seguem os anexos. 2. A palavra prateleira, local em que eram colocados pratos e vasilhas na casa simples, vem de pratel, diminutivo de prato. Houve a cristaleira (palavra em desuso). O popular usa ‘partileira’, assim como alguns usam ‘estrupo’ no lugar de estupro. O registro da grafia ‘pratilheira’, quando se quer referir à sua similar, a gôndola, não é aconselhável. O músico que toca ‘pratos’ em orquestra, banda ou fanfarra é o ‘pratilheiro’. Por extensão, se uma pessoa do sexo feminino executar essa função, poderemos chamá-la ‘pratilheira’, verbete cuja semântica não tem relação com ‘prateleira’. ‘Pratel’ é termo arcaico, usado em Portugal, como deve ter sido usado no Brasil colonial. A prateleira é uma tábua disposta horizontalmente na qual se colocam livros, papéis e outros objetos. Trata-se de uma espécie de estante, usada em residências simples e nas vendinhas de todo o Brasil. Se o produto seria da melhor qualidade, o especial, seria colocado na ‘prateleira de cima’, daí o significado da expressão: os da prateleira de cima são produtos de boa qualidade. O termo ‘partileira’ ainda sobrevive na linguagem popular. Vendas, armazéns, farmácias e lojas de um Brasil histórico tiveram comerciantes conhecidos com cognomes (Seu Chiquinho, Seu Odilon do Toucinho, Seu Elias do Lajedo) cujas pernas cumpriram muitas idas às prateleiras: o freguês não tinha acesso direto à mercadoria, que tinha que ser trazida ao balcão para ser mostrada, e, sob pechincha, ser, talvez, negociada, com prazo até seis meses para pagamento. Não se conhecia ‘inflação’.

João Carlos de Oliveira

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