Este pode ser um artiguelho na visão de uns, mas esclarecedor na de outros.
Artiguelho, professor? O que é isso, companheiro? Artiguelho tem a variante artiguete, pequeno artigo, talvez, sem valor (estético, linguístico ou filosófico).
Os prefixos e os elementos mórficos que indicam ‘colocação’, à primeira vista, são fáceis – bi, tri, tetra, penta -, mas o comprimento da lista, até chegar ao que indica ’12 vezes’ ou o décimo-segundo lugar, dificulta a aprendizagem ou assimilação. Durante anos vendo e revendo esses termos, as explicações encontradas não me foram tão convincentes, vista a semântica de cada étimo ou lexema.
Optando pelo uso do substantivo ‘campeão’, termo comum no futebol, para se indicarem as colocações, todos sabem usar: bicampeão, tricampeão, tetracampeão, pentacampeão. Até aqui, tudo bem. E o sexto colocado? O nono? O décimo ou o décimo-segundo? A partir daí, ‘campeão pela décima-terceira vez’ etc. até a décima-nona. A vigésima, a trigésima etc. até a centésima.
Em um momento, chama a atenção a grafia – bi campeão, bi-campeão, bicampeão – que deveria ser clara. Não existe mais o período gramatical-histórico da chamada ‘pseudo-ortografia’ em que o étimo do vocábulo ficou obscuro, surgindo as suposições.
Agora, o ‘artiguelho’ passa a ter grande utilidade. Pelo menos, é o esperado.
Feita a pesquisa, encontram-se essas três grafias e, certamente, só uma está correta.
A melhor explicação didática é que prefixo (bi, tri, tetra etc.) não pode ficar ‘solto’ em relação ao termo a que se refere: ‘tri campeão’ não é grafia adequada, que seria escrita esdrúxula. Suposta grafia, antes da atual Reforma Ortográfica, seria ‘tri-campeão’, forma hifenizada.
Ambas estão incorretas para qualquer fase.
O aprendiz precisa ter uma resposta clara: pelo fato de o termo básico (campeão) não ser vocábulo que comece por vogal, H, R ou S , o uso do hífen (bi-campeão, tri-campeão, tetra-campeão, penta-campeão) não tem amparo gramatical. Grafa-se: bicampeão, tricampeão, tetracampeão, pentacampeão (sob a visão da anterior e da atual Reforma Ortográfica).
Considerados os derivados tri-atleta, bi-harmônico (mas bisavô), deca-hidratação (mas decacampeão), tri-reme e penta-sílabo, são duas as ponderações: respeitadas as regras anteriores, tri-atleta é correta, mas hoje triatleta; bi-harmônico segue o ontem e o hoje, assim como deca-hidratação; tri-reme e penta-sílabo (ontem), mas hoje trirreme e pentassílabo.
As conclusões não são fáceis. Compulsada a grandiosa Gramática Houaiss, de Língua Portuguesa, e outras, depois de muita ‘luta’, é que se aprende a grafia moderna.
Se usamos ‘tricampeão’ (corretamente), tanto antes como agora, precisamos rever as regras: em caso de vogais iguais, o hífen é obrigatório: poli-insaturado, tri-instrumental. Se diferentes, o hífen não é exigido: triatleta (agora); antes, tri-atleta; sempre, ‘triângulo’, polígono de três ângulos.
Outros exemplos atualizados: triácido, tríade (tríada), triagem, triálcool, triangulado, triangular; tríceps, tricolor, triciclo; tríduo, triédrico, tri-hormonal, trisavô.
A listagem dos campeões é: bicampeão (2 vezes), tricampeão (3), tetracampeão (4), pentacampeão (5), hexacampeão (6), heptacampeão (7), octacampeão ou octocampeão (8), eneacampeão (9), decacampeão (10), hendecampeão ou undecampeão (11) e dodecacampeão (12 vezes). Curioso é que, como existe duodécimo, o décimo-segundo colocado, caberia o estranho ‘duodecampeão’, o mesmo que dodecacampeão, já que existe duodecaedro (poliedro de doze lados). Dodecapétalo indica botão de rosa com doze pétalas; dodecassílabo, vocábulo ou verso de doze sílabas.
Esses prefixos, elementos compostos ou lexemas nos conduzem a várias interpretações semânticas, mas sempre indicando o quanto numérico, contido nos numerais ordinais e cardinais: três, quatro, cinco, e sua vasta sequência, de vigésimo, centésimo até bilionésimo. Só a linguagem culta ampara essa ‘tradição’.
São usados eneágono (polígono ou poliedro de nove lados) e eneassílabo (quão difícil!), vocábulo ou verso de nove sílabas. Decágono ou decaedro, polígono de dez lados; decassílabo, por isso, decacampeão. Undécimo, colocado em décimo-primeiro lugar, por isso, undécuplo (11 vezes mais) e undecampeão, mesmo com pronúncia pouco aceitável.
Não se trata de uso prático. Sua sonoridade também dificulta a boa prosódia, por isso, parece inadequados. Mas essas são as formas.
Os polígonos, ou poliedros, a partir de 4 faces, têm estas denominações: tetraedro, pentaedro, hexaedro, heptaedro, octaedro, eneaedro, decaedro, undecaedro e dodecaedro. Têm pronúncia fácil e bonita? Professores das áreas de Matemática, Geometria e similares dirão que sim, mas outros, talvez, o contrário.
O populacho não acha graça nenhuma. “Que palavras estranhas!”, exclamar-se-ia, com extrema e evidente razão.
E agora, professor? Se o termo básico fosse ‘neto’, até a décima-segunda geração, como seriam as palavras? Bisneto, trineto e tetraneto são comuns. Bis tem o mesmo valor de bi. Tri já é conhecido. Tetraneto, linguagem culta, e tataraneto, linguagem popular, duas variantes gráficas ‘teúdas’ e ‘manteúdas’, no nosso dia a dia. A partir desses, os seguintes não são usuais, mas poderiam ser grafados: pentaneto, hexaneto, heptaneto, octaneto, eneaneto, decaneto, hendecaneto e dodecaneto.
Termos assim existem? O dicionário não os registra, mas o poeta e o redator, para chamar a atenção, usando sua capacidade ‘neologista’, poderiam registrá-los.
Outras palavras que têm esses prefixos. Penta: pentadátilo (animal que tem cinco dedos); pentágono (polígono de cinco lados); pentassílabo (verso ou palavra com cinco sílabas). Hexa: hexágono, hexagonal (polígono com seis lados); hexassílabo (verso ou vocábulo com seis sílabas). Hepta: heptatlo (modalidade olímpica com sete provas diversas); heptágono (o mesmo que heptaedro). Octa: octaedro (que tem oito lados); octo: octossílabo (que tem oito sílabas); octangular (que tem oito ângulos); óctuplo (que é oito vezes maior). Enea: eneassílabo (que tem nove sílabas). Eneágono, o mesmo que eneaedro. Deca: decassílabo (que tem dez sílabas); decatlo, prova em que o atleta disputa dez diferentes provas de atletismo. Decenal, que dura dez anos. Unde: undécimo (colocado no décimo-primeiro lugar). Undécuplo: que é 11 vezes maior. Dodeca: dodecassílabo (vocábulo ou verso com doze sílabas). Dodecágono, o mesmo que dodecaedro.
Evidente que a explicação possa ter falhas, mas esses elementos rondam a nossa linguagem e nos deixam atônitos quanto ao significado e quanto à maneira de serem grafados (se ficam separados por hífen). Soltos, nunca.
Esta análise me fez queimar o bilionésimo neurônio.
Teixeira de Freitas, BA, no ‘octodia’ de outubro de 2017.