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Sou eu que digo… Sou eu que diz… Sou eu quem diz… Sou eu quem digo. Todas essas concordâncias estão corretas?

No momento em que a linguagem culta se assemelha à popular, e vice-versa, mesmo que esta seja uma visão hiperbólica, no seu máximo exagero, tudo se confunde. E o usuário popular é que se perde no caminho sinuoso da nossa linguagem cheia de liames.

O Português nacional, às vezes, é um campo minado do certo e do errado. ‘Eu vou‘, mas, em dado momento, diz o cara “E lá vai eu!”, referindo-se a uma decisão brusca, a que antes seria impensada. ‘Eu vai?’, isso pode? Não, mas se estiver precedido de ‘que’ ou ‘quem’, a coisa varia e se amplia. “Sou eu quem vai agora!”, diga, meu caro, sem medo de ser feliz!

Gramaticalmente, inusitada, porém, no contexto do regionalismo, vai passando, e ninguém reclama dessa concordância, desse linguajar em que a forma verbal da terceira pessoa do singular, normalmente no indicativo, toma o lugar da primeira.

A desinência verbal da primeira pessoa, no presente do indicativo, é a conhecida ‘o’: compro, falo, digo (eu), inclusive em verbos irregulares. Exceto: dou, sou, vou. E em outros continua, predominante que é; e há verbos enigmáticos quanto ao uso incorreto: anseio, caibo, ceio, copio, divirjo, doo, excluo, firo, grampeio, hasteio, incluo, insiro, meço, opto, poluo, possuo, rio, roo, voo (eu). Etc.

Basta para entendermos a materialidade linguística da exigência da Gramática Normativa.

No entanto, se o texto traz pronome relativo intercalado (há dois verbos e um antecedente: eu, tu, nós etc.), é diferente e as opções surgem, embora possa permanecer a dúvida.

Em casa, seria comum alguém perguntar “Quem está aí?” àquele que se encontra no banheiro, no quarto, no portão etc. O que responde diria comumente “Sou eu”.

O ouvinte entende e sabe quem fala. Ótimo, até aqui. Mas se o consultado resolver usar a própria frase da pergunta em sua resposta, isso pode?

“Sou eu quem está aqui” (no banheiro, no quarto, no portão), e a resposta está certa, mas fica estranha para a linguagem falada cotidiana.

Outros exemplos.

“Quem é o dono deste caderno?”, numa sala de aula. “Sou eu quem é o dono”, e está certo.

“Quem falou isso?”, sobre o que foi dito e seria asneira, injúria ou discriminação. “Fui eu”, resposta curta, quase um monólogo. E aquela mais completa: “Fui eu quem falou que ela é uma (…)”, esboçando indignação ou direito de resposta.

“Fui eu quem falou”, momento em que o segundo verbo (após o relativo) vem na terceira pessoa do singular não é fato corriqueiro, muitos não o conhecem nem o usam, e o achariam estranho, mas está correto.

Nesse ínterim, é que as duas linguagens se chocam, se divergem, se digladiam, e se o aspecto culto se diferencia do popular, este acha graça sem saber dizer o porquê.

No título, podemos comparar essas nuanças diferenciadas, esses vieses caprichosos de um riacho poético entre as serras de Jacobina, o Rio do Ouro, que encontra o Itapicuru Mirim, e descem ambos pelas encostas no Piemonte da Chapada Diamantina, banhando as riquezas locais, o arroz vermelho, o marmelo de Caatinga do Moura (aliás, indo de Jacobina para esse distrito produtor de doce de banana e de marmelo, há uma linda cachoeira na Serra do Tombador, que dá origem a esse ‘mar’), e toda essa grandeza ambiental vive sorridente por entre as serranias que nos fazem respirar mais fortes em virtude do ar puro e da beleza estonteante do lugar. Isso é ótimo.

Dei uma paradinha para ter mais forças!

Vale isto: sou eu que diz, verbo na terceira pessoa do singular. Sou eu que digo, tudo igual, primeiro e segundo verbos na mesma pessoa. E agora, para quem gosta de mudança, vem a troca de ‘que‘ por ‘quem‘ (qual sua preferência?).

Sou eu quem diz; sou eu quem digo. Este último é divergente ao extremo, mas a Gramática diz que assim também pode.

No tocante ao uso do pronome relativo (em especial, ‘que’ e ‘quem’), item comandado pela Concordância Verbal, há estes exemplos: 1. “Fui eu quem derramou (ou derramei) a água”, pg. 240, João Domingues Maia, Ed. Ática, e explica: “Quando o sujeito for o pronome relativo quem, o verbo vai para a terceira pessoa do singular ou concorda com o antecedente do pronome”.

Estamos diante de uma construção especial, portanto, de uma concordância diferenciada. Aqui, primeiro foi citada a frase para depois vir a regra, que seria estranha para muitos, razão do título deste artigo. O sujeito a que se refere a regra é o da segunda parte da frase (começada pelo relativo quem, como está acima), e na segunda possibilidade, iniciada com a forma verbal fui, seguida de seu respectivo pronome (eu), como consta.

Qual seria a ideal? Fui eu quem derramou… Fui eu quem derramei?

Compare com as frases-cabeçalho, e dê seu parecer.

Se quiser, prefira quem, nível cultoa que, o popular, muito usado, já que no dia a dia usamos ‘que‘ para tudo: Sou eu que mando, que vou, que faço, fui eu que fiz isso. Mas… Sou eu quem fez isso (quem, estranho!?).

Frase dessa Gramática: Fui eu que paguei o jantar. A explicação: o verbo que tem como sujeito o pronome relativo que concorda com o antecedente deste pronome. Foste tu que pagaste o jantar.

Damos os nossos exemplos: Fomos nós que pagamos a conta. Fostes vós que pagastes a conta. Foi ele que pagou a conta. Fui eu que paguei a conta. Foram eles que pagaram a conta. Foste tu que pagaste a conta. A ordem das pessoas verbais não importa. E tudo numa só: Fomos nós, fostes vós, foi ele, fui eu, foram eles, foste tu – quem pagou a conta.

Ainda persiste a dúvida se o poeta, por ser inovador, ou alguém preferir inovar e usar quem? Poderia surgir, mas a regra não deixa ninguém errar: Fomos nós quem pagou (ou pagamos). Fostes vós quem pagou (ou pagastes). Foi ele quem pagou (que pagou). Fui eu quem pagou (que paguei). Foram eles quem pagou (que pagaram).

Quando se usa o pronome quem com a primeira pessoa do singular é que a concordância verbal parece estranha, mas é aceita. O popular é que acharia difícil ou inusitado: eu fui (fui eu) quem bateu à sua porta, fui eu quem chegou cedo, fui eu quem escondeu o celular. “Fui eu quem arranjou esta melodia”, tradução em Português (diria a linda Nadia, do conjunto Las Fenix, ela, a grande baixista, em que se destacam também as quatro irmãs, um fenômeno musical: Berna, Adela, Lesli e Anahi).

Vamos reviver o título: sou eu que digo, sou eu que diz, sou eu quem diz, sou eu quem digo.

Ninguém erraria concordância tão diferenciada, a um tempo poética, culta e popular, que se misturam, mas seguem firmes. Muitos é que não as seguem ou não as contemplam como opção da fala e da escrita.

Crie os seus exemplos.

Volte amanhã, que vamos trocar outras ideias.

João Carlos de Oliveira

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