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Depois entregaram cartão que não a pertencia… Depois, entregaram o cartão que não lhe pertencia

Analise, com bastante calma, a redação desses dois enunciados.

O cartão pertence ‘alguém’ ou pertence ‘a alguém’?

No aspecto semântico da mensagem, o verbo pertencer pede o objeto indireto (a quem, a alguém, a uma pessoa).

O carro de boi pertence ao homem do campo.

(Pela ordem, o sujeito simples: o carro de boi; o verbo transitivo indireto: pertence; o objeto indireto: ao homem do campo.)

O rio pertence à Natureza.

Dona Maria, este cartão não lhe pertence? (Não pertence à senhora? Não é da senhora?)

Duas frases, uma popular e uma de nível erudito, de certa autoridade.

Isto me pertence. Frase popular, para dizer a alguém que não leve um objeto que está ali, ao seu alcance, mas não é dele (não lhe pertence).

Pedro, este lápis é meu, não leve o que não lhe pertence. Pedro, este lápis não é seu. Ele me pertence.

O futuro a Deus pertence. Frase culta, para dizer que não sabemos o que nos acontecerá amanhã, que somente Deus tem consciência desse caminho, e que não adianta reclamarmos daquilo que não sabemos.

Pessoas mudam essa frase para esta redação Nosso futuro pertence a Deus, para que dizer que Deus sabe do que nos vai acontecer, e nós não o sabemos.

No título do comentário de hoje, a primeira frase vem de uma redação sobre o fato de um estelionatário (salafrário, amostradinho, bem safado, tido como moderno, enganador etc.) ter enganado uma senhora em agência bancária. Ofereceu-se para ajudá-la, fez as devidas trapaças, disse que não havia saldo e trocou o cartão dela, dando-lhe outro, falso e inoperante.

O analista, então, usou a redação “Depois entregaram cartão que não a pertencia” (era mais de um, bem vestidos, para enganar).

Na nossa análise, houve o lapso de regência verbal, momento em que o redator deveria ter escrito: “Depois, entregaram um cartão que não lhe pertencia”, que não era (o) da senhora.

Deram-lhe um cartão que não pertencia a ela (que não era o dela).

O idioma é assim, oferece dúvidas; os verbos, às vezes, são traiçoeiros e nos enganam.

Um vocábulo tem sempre três aspectos básicos: a grafia, o significado e a pronúncia, e num momento podemo-nos enganar com um deles, daí os ledos enganos ao praticarmos a linguagem.

A prática é fundamental para evitarmos certos lapsos, além da consulta à Gramática Normativa e ao nosso querido dicionário, guardião de nossas dúvidas, em especial, as ortográficas.

Qualquer um deve estar atento.

Quaisquer uns devem estar atentos.

Fechando o visto de hoje, lembre-se de quando você pronuncia ou escreve certos numerais.

21. Vinte e um.

E sua pronúncia? Normalmente, falamos ‘vinte um’, mas devemos dizer ‘vinte e um’, para ficarem bem claras a dezena (20) e a unidade (1).

100. Uma centena. Cem. Um centro.

Seu Manuel, quanto custa um centro dessas laranjas?

101. Uma centena e um. Cento e um.

51. Cinquenta e um.

Compare a pronúncia do 21 com a do 51.

Se nos enganamos e falamos ‘vinte um’, já não cometemos esse lapso com 51, pois não falamos ‘cinquenta um’, mas como deve ser: cinquenta e um.

Curioso, não?

Assim vejo.

Grafias cuidadosas:

imbróglio (palavra de origem italiana, com o significado básico de confusão, trapalhada, mixórdia);

perspicácia (esperteza, vivacidade, agudeza de espírito, sagacidade);

resiliência (resistência, modo de enfrentamento da realidade com segurança e sabedoria);

convalescença (ato de recuperar-se após uma cirurgia, o repouso prescrito pelo médico);

empecilho (obstáculo, impedimento, dificuldade em cumprir um ato).

 

Obrigado.

 

João Carlos de Oliveira

João Carlos de Oliveira, professor jubilado, advogado com OAB-BA e OAB-MG, poeta, membro-efetivo da Academia Teixeirense de Letras (ATL), de Teixeira de Freitas, BA. Autor de várias obras de poesia, como O dia que nunca acaba, Colóquio com o Silêncio, e Crônicas do vovô. Em 2024, obteve o primeiro lugar no Concurso Flip Tchê, categoria Poesia, com o texto Tresloucado Poema Abstrato. Tem tido boas colocações na versão interna da ATL, cujo site divulga autores premiados.

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