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Dona Ambrósia, a senhora ainda vende ambrosia? (E outras palavras que não seriam tão conhecidas)

O senhor Ambrósio é um homem simples, trabalhador, que tem pequena propriedade, cria animais e pratica agricultura de subsistência. Toda a família atua nessas atividades.

Dona Ambrósia é uma doceira de mão cheia, faz brevidades, biscoitos de polvilho de mandioca, cocadas, doce de leite cortado e a famosa, muito saborosa, ambrosia.

A ambrosia, em todo o Nordeste, como deve ser também em outras regiões deste País, é o doce de leite em calda, com certa consistência, tendo como maiores ingredientes leite, ovos e açúcar. Talvez, um pouco de canela em pó, ou em pedaços, alguns cravos da índia, e uma pitada de boas mãos para preparar a guloseima, excelente sobremesa.

Essa definição provém da experiência deste caboclo, que saboreou muito as ambrosias nas feiras-livres no interior da Bahia, como em Jacobina e nos distritos de Cachoeira Grande e Riachão (este, hoje, chamado Itaitu, com uma grande cachoeira denominada Véu de Noiva). Cuidado, companheiro, para não poluir o ambiente com latinhas, garrafas de bebidas e sacos plásticos, material usado na hora do lanche, fato comum quando o turista por lá aparece, fazendo o tão famigerado piquenique, sob árvores, mas deixando ‘esse entulho’ para trás. Observe que todos chegam carregando sacolas (cheias) e, na volta, as mãos estão vazias.

É um desastre esse comportamento! E nas praias?

O léxico diz que ‘ambrosia’ é o manjar dos deuses, que alimentou por muito tempo os habitantes do Olimpo, cuja poesia é de conhecimento universal.

E por que esse nome? Porque a salutar ambrosia seria o doce capaz de dar e conservar a imortalidade dos moradores do Olimpo, deuses eternos.

De ambrosia surgiu ‘ambrosius’, adjetivo latino, que significa ‘da ambrosia’, gostoso ou cheiroso como a ambrosia, que tem o gosto da ambrosia, e teria gerado o nome próprio Ambrósio, como o conhecemos.

Essa história foi motivada pelo fato de ter procurado a ambrosia numa loja, ou casa comercial. Ao perguntar à moça se vendia ‘doce de leite em calda’, fez uma cara de espanto e disse que não tinha. Se não tem o produto, ou se não o conhece com esse nome, por que não faria a pergunta se se trata da mesma coisa com nome diferente?

Então, usei o nome ‘comercial’ que muitos adotam como legítimo, ambrosia, e respondeu que sim. Deu a demonstrar que o uso de outro nome, diferente do dela, seria desclassificar o que vendem. Veio, então, a confirmação de que essa ambrosia vendiam, que faziam esse doce caseiro, mas estava em falta. Num restaurante em cidade mineira, alguém admirou uma ‘bela buchada’ (de boi), mas a dona disse que não era ‘buchada’, mas ‘dobradinha’. Os detalhes entre uma coisa e outra não precisam ser descritos.

Cutucando (ficou mais alegrinha para vender outro produto), viu numa prateleira (a chamada gôndola) que havia uma embalagem industrial com esse doce, vindo de fora, registrado com o nome ‘ambrósia‘ (acentuado graficamente, que me chamou a atenção).

Fiquei a pensar e não quis discutir algo como o certo ou o errado; se ambrosia (palavra paroxítona com quatro sílabas gramaticais; ia forma hiato) também seria chamada ‘ambrósia‘ (palavra paroxítona com acento agudo e três sílabas gramaticais, na sua normalidade; ia forma ditongo crescente, do mesmo modo como se fala e escreve história). Essa mudança de acentuação tônica se dá por corruptela (má pronúncia), um vício de linguagem, a que chamam silabada (ureter, oxítona, pode aparecer como uréter, paroxítona, em desacordo da regra gramatical), ou constitui variante gráfica do próprio idioma?

Foi o caso de pantano, paroxítona na sua origem, que se tornou proparoxítona para nós, pântano.

No dia a dia, a Gramática Normativa discute que palavras podem ter dupla pronúncia, razão de não ter levado em conta ‘ambrósia’, como estava no rótulo.

Há quem diga acróbata no lugar de acrobata, e ficaria chique, assim como sóror e soror, zângão ou zangão, projétil e projetil etc. A lista não é pequena.

‘Ambrosia’ é dado como vocábulo de origem grega, que ganha acento agudo e é usado no Vocabulário Onomástico, relação de nomes de pessoas e lugares (antropônimos e topônimos), tornando-se Ambrósia, feminino de Ambrósio.

Podemos encontrar Ambrósio e Ambrósia, Ambrosino e Ambrosina, derivados dessa raiz grega, inclusive de ‘ambrotos’, como nos orienta um compêndio.

Resta-nos, agora, dizer que pessoas há que ‘chamuscam’ a fala de alguém que usa um termo regionalista ou fala palavra que não é do conhecimento delas.

A boa educação tenderia a que o desconhecedor pergunte ao outro o que é isso, pois conhece a mesma coisa com outro nome. Até a palavra facão, que designa a arma branca, pode ter significado diferente, ser uma simples faca grande, como a facoa para cortar cana de açúcar, ou outro termo para designá-lo, como pode acontecer em alguma parte do País.

Outro viés seria alguém, ao usar certa palavra, poder lhe dar o tom pejorativo, o que não é bom, por ser ato discriminatório e longe da convivência civil e civilizada.

Uma senhora feirante explicava como fazia uma esteira de taboa, que cortava o produto no brejo e colocava para secar no ‘terreiro’ da casa. A possível compradora olhou para ela ‘admirada’ e lhe sacou a questão: “A senhora é macumbeira?”, fato que presenciei numa feira-livre, há muitos anos.

Por aí vão os fatos. O viável é nunca dizer que o povo fala ‘errado’ simplesmente porque alguém usa uma palavra diferente da sua ou não é do seu conhecimento.

O falar regional é riquíssimo justamente por essas nuanças.

O nome Ambrósio é bonito, embora pouquíssimo usado hoje, e significa ‘o imortal’, surgindo versões em outros idiomas. Ambrose, versão inglesa. Ambrosin (que se falaria ‘ambrosã’), versão francesa, de onde talvez venha a grafia Ambrosina, derivado da possível versão feminina ‘Ambrosine’, no mesmo idioma, assim como usam ‘Josefine’, para Josefina. O Italiano usa Ambrogino, que deve ter pronúncia forte: ‘am-bró-gi-no’, ou algo similar. O alemão adota Ambrosius, com esse final que chama a atenção: o sufixo –us aparece em muitas palavras comuns ou próprias, como Celsius, Apollonius, Amadeus. O mesmo livrinho que ora consulto apresenta Anastasius, mas com acento agudo, para o Germânico, o que seria, também, erro de grafia nos idiomas inglês, alemão ou espanhol. O nosso é Anastácio, e para eles Anastasius (sem o agudo). Como as variantes surgem do nada, viria a grafia Anastásio, com a pronúncia imponente, do mesmo modo de Anésio ou Anísio, Gildásio, Edésio, Césio etc.

No nosso viés, a gramática enxerga que Ambrosino é um simples diminutivo de Ambrósio.

Ao final de toda a celeuma, como fica o nome? Tasque aí: ambrosia, ou se quiser ser chique, ambrósia, lembrando que assim se pode chamar a uma pessoa do sexo feminino. Estudando Espanhol, como estou no Duolingo, me veio o termo que usei, feminino, inovador para mim, na grafia que eles usam: femenino, femenina. Feminine, Inglês; féminin, Francês; femminile, Italiano. É preciso corrigir ‘Banheiro Femenino’, num estádio de futebol (em cidade do interior baiano).

Fechando, posso dizer que A queijaria e cafeteria Fino do Leite, nesta Cidade, de fato, uma loja renomada, vende excelente ambrosia, de cunho caseiro. Parabéns.

A finalidade de mais um artigo é mostrar as variantes linguísticas e seus aspectos, mas que todos as usem sem discriminação de qualquer natureza, na maior normalidade possível, sem beicinhos ou gestos indevidos.

Abraços.

 

João Carlos de Oliveira

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