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A ordem alfabética na relação do jogo do bicho: a usada e a, estritamente, gramatical

O barão de Drummond (João Batista Viana Drummond), proprietário do zoo do RJ, atolado em dívidas com altos custos da alimentação dos animais no local, inovou, e muito, e criou o jogo do bicho. Selecionou os nomes de 25 animais e empreendeu o que seria lógico: organizou-os em 25 grupos, de 1 a 25, com a respectiva numeração (cada bicho tem 4 dezenas), de 01 a 00.

O Brasil passava por forte recessão econômica, e a inflação atingia a todas as classes. Com a Proclamação da República, o zoológico havia perdido a ajuda do Império, e poderia ser fechado. Corria o ano de 1892.

Criativo, o barão determinou um prêmio que valia 20 vezes mais o valor do ingresso. Curioso, o visitante começou a se interessar ‘pelo resultado do bicho escolhido’. Ele ‘sorteava’ um bicho e guardava ‘o número’ em um lugar especial e secreto. No final do dia, divulgava o resultado. Parte dos visitantes, interessada, permanecia no zoológico. Aumentou a venda de café, o movimento no restaurante, até recuperando a situação de um hotel que havia dentro do zoo. O jogo do bicho impulsionou os negócios locais.

Depois, foi proibido várias vezes, até ser liberado em 1941, como narra um texto relativo ao assunto. Com altos e baixos, o jogo do bicho se mantém, considerado, hoje, infração penal. Está vivo, e há a expectativa de ser transformado em jogo oficial, pagando-se impostos (os royalties?) ao Governo.

Se são 4 dezenas para cada bicho, de 01 a 00, há, portanto, 25 grupos, e com elas são formados os números, que são os milhares. Ex.: 0101, milhar do avestruz, na ordem alfabética escolhida pelo barão. Nesses números, existem as dezenas, as centenas e os milhares, e o respectivo grupo. Aliás, é comum o jogador dizer ‘a milhar’, por assimilação: dezena e centena são palavras femininas; como consequência, considera ‘a milhar’, mas contraria a gramática: (o) ‘milhar’ é masculino, da família etimológica de mil, milênio, milésimo, milhão, milheiro (termos masculinos). Existe prova de que a palavra milhar é masculina: “As formigas de correição passavam na estrada aos milhares”. “As andorinhas sobrevoam a cidade aos milhares”. “Os milhares de pombos que existem, em muitas cidades, danificam, com suas fezes, a fachada dos prédios”.

A ordem alfabética criada pelo barão é esta: avestruz (01 a 04, grupo 1); águia (05 a 08, gr. 2); burro (09 a 12, gr. 3); borboleta (13 a 16, gr. 4); cachorro (17 a 20, gr. 5); cabra (21 a 24, gr. 6); carneiro (25 a 28, gr. 7); camelo (29 a 32, gr. 8); cobra (33 a 36, gr. 9); coelho (37 a 40, gr. 10); cavalo (41 a 44, gr. 11); elefante (45 a 48, gr. 12); galo (49 a 52, gr. 13); gato (53 a 56, gr. 14); jacaré (57 a 60, gr. 15); leão (61 a 64, gr. 16); macaco (65 a 68, gr. 17); porco (69 a 72, gr. 18); pavão (73 a 76, gr. 19); peru (77 a 80, gr. 20); touro (81 a 84, gr. 21); tigre (85 a 88, gr. 22); urso (89 a 92, gr. 23); veado (93 a 96, gr. 24); vaca (97 a 00, gr. 25). Obs.: Para se saber o grupo, divide-se a última dezena de cada bicho por 4 e se obtém o número do grupo. Ex.: 72 (porco); dividido por 4, o resultado é 18 (gr. do porco).

Certamente, havia todos esses animais no zoológico.

Como a disposição escolhida pelo barão não segue, estritamente, a determinada pela gramática, a ordem alfabética é outra. Ele determinou que ‘porco’ viesse antes de ‘pavão’. Se a primeira letra é igual entre duas palavras, considera-se a segunda. Nesse caso, ‘porco’ deveria ter vindo depois de ‘pavão’. Por isso, avestruz e águia (ordem do barão) deve ser refeita, considerando-se a segunda letra: AV, de avestruz, não pode vir antes de AG, de águia. Se há duas iguais (CArneiro, CAmelo), deve ser considerada a terceira letra. Por isso, carneiro não poderia vir antes de camelo. Assim por diante.

Se o jogo do bicho for oficializado, vai ser mudada a ordem alfabética, com a consequente alteração das dezenas correspondentes a cada grupo? Cada bicho tem, como se diz, 400 milhares relativos a seus números, e isso é muita coisa. Seria necessária nova aprendizagem sobre a ordem dos bichos, com dezenas diferentes das tradicionais? Mesmo que haja grande impacto, o apostador assimilará com algum tempo de convívio.

Cumprindo, rigorosamente, a ordem gramatical, teríamos: águia viria antes de avestruz; borboleta antes de burro; cabra antes de cachorro; camelo antes de carneiro; carneiro antes de cavalo; cobra antes de coelho.

A numeração, portanto, seria outra, e o jogador, pelo menos de início, poderia estranhar. Elefante, galo e gato se mantêm. Seguem jacaré, leão e macaco. Pavão vem antes de peru (na ordem tradicional, está ao contrário). Peru antes de porco. Tigre antes de touro. Urso e vaca, e, depois desta, veado, que seria o último bicho. A vaca, no jogo atual, é o grupo 25; o veado, o 24. Ficaria de forma oposta: a vaca, o 24, e o veado, 25. Por que isso? VE, de veado, não pode vir antes de VA, de vaca (como está na ordem alfabética escolhida pelo barão).

A ‘nova‘ ordem alfabética seria assim: águia (01 a 04; altera); avestruz (05 a 08; altera); borboleta (09 a 12; altera); burro (13 a 16; altera); cabra (17 a 20; altera); cachorro (21 a 24; altera); camelo (25 a 28; altera); carneiro (29 a 32; altera); cavalo (33 a 36; altera); cobra (37 a 40; altera); coelho (41 a 44; altera); elefante (45 a 48; permanece); galo (49 a 52; permanece); gato (53 a 56; permanece); jacaré (57 a 60; permanece); leão (61 a 64; permanece); macaco (65 a 68; permanece); pavão (69 a 72; altera); peru (73 a 76; altera); porco (77 a 80; altera); tigre (81 a 84; altera); touro (85 a 88; altera); urso (89 a 92; permanece); vaca (93 a 96; altera); veado (97 a 00; altera).

Continuariam os mesmos bichos em ordem alfabética diferente, alguns com nova numeração, se for seguida a norma da Ortografia, estipulada na Gramática Normativa e seguida no dicionário.

Lembremos que as grafias ‘viado’ e ‘viadagem’ inexistem; trata-se apenas da pronúncia respectiva de veado e veadagem. Alguns, entretanto, já admitem que ‘viado’ é variante gráfica de veado, tamanho o uso popular. ‘Seu viado!’ saia daqui!

Pausa: 1. grafias corretas: miniférias, cão-robô. 2. Se temos afro-brasileiro, greco-latino, latino-americano (adjetivos compostos) hifenizados, por que aparece ‘infantojuvenil’? Seguindo a regra, deveríamos grafar ‘infanto-juvenil’, como fazem obras paradidáticas de muitas editoras. 3. ‘Não deu tempo do casal trocar as alianças’ deve ser reescrita para ‘Não deu tempo de o casal trocar as alianças’.

Professor João Carlos de Oliveira.

João Carlos de Oliveira

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