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Por um motivo ou outro, palavra há que pode oferecer dúvida de como seria grafada: convalescença ou convalescência?

Durante mais de 30 anos, viajante acostumado a pesquisar, costumeiro no uso do dicionário, batalhador no preparo de aulas para turmas de 8a. série e outras do Ensino Médio (a que chamávamos de Segundo Grau), a tradição seria o uso de convalescença, como usamos nascença, de nascer; renascença (o mesmo que renascimento), de renascer.

E agora, a grafia convalescência está correta, a Gramática a recomenda? Ou seu uso se dá por ter pronúncia mais bonita, que soa melhor?

Se observarmos o sufixo de cada uma delas, notamos -ença, que vem em menor quantidade de palavras: avença (acordo, contrato, por isso, o antônimo muito usado, desavença), benquerença, convalescença, crença, crescença (sinônimo popular de crescimento), diferença (chegando a haver a má pronúncia deferença, como se fosse diferenciação), Florença, indiferença, licença, mantença (o ato de manter, manutenção), onipresença, sentença, valença (forma popular de valência), assim como há má-querença e malquerença, a que o popular pode preferir malquerência.

A lista com esse sufixo não é tão longa.

Já o sufixo -ência é abundante, quantidade de vocábulos do dia a dia tão extensa como a Muralha da China, que vai de Sul a Norte do País. Não precisamos citar muitas, bastam algumas: anuência, carência, decadência, adolescência, dormência, impotência, turbulência, violência etc.

Para boa análise, adjetivos terminados em -ente e -ento, comumente, geram substantivos terminados em -ência: vivente, vivência; violento, violência; frequente, frequência; turbulento, turbulência; incandescente, incandescência; virulento, virulência. (Faça sua listagem e compare.)

Se há vocábulos terminados em -ença, por outro lado, podemos conviver com algo chamativo: a sofrência, forma inusitada de chamar a atenção para o sofrimento da ‘paixonite aguda’, cuja abrangência e ironia diriam mais que a simples dor de cotovelo, o sofrimento pelo amor não-correspondido. Sofrimento é café pequeno; chique é sofrência, que rima com tendência, transparência, sequência, e daí a gíria cria aborrecência, e por que não a diferência? (Não a confunda com deferência, o ato de respeito a uma autoridade.)

O poeta de cordel, para ironizar e rimar, já que temos querência, resolveu fazer bom uso de Vosselência (no lugar de Vossa Excelência).

O idioma cresce e vai mostrando novas faces; essas invenções serviriam de chacota para dizer que a linguagem culta nem sempre é a melhor, embora seja a aceita e preferida da classe social chamada dominante.

Depois desse blablablá, fica fácil entender: -ência é o sufixo mais usado, por influência do próprio Latim. Já a grafia convalescentia (latina), de forma direta, é que nos dá convalescência (culta), menos usada, e convalescença (popular), mais usada. A segunda é variante gráfica da primeira.

Fica claro, então, que o uso de convalescência não se trata de erro nem de inovação, mas de tendência da linguagem: a escolha fica a critério de um e de outro, e ambas as formas podem ser usadas sem nenhum constrangimento ou cogitação de ter cometido engano. O estilo é que determina que caminho seguir.

Se for curiosidade, isso serve: uma palavra bonita (pouco conhecida?) é luminescência (o ato de iluminar, a luminosidade natural), não atribuível diretamente a incandescência, como a fosforescência, fluorescência, observada nos pirilampos, chamada, também, bioluminescência.

A Natureza, em Uauá, no sertão baiano, já seria iluminada pelos vaga-lumes (por que não vagalumes?), uma vez que uauá, no Regionalismo, é o mesmo que pirilampo.

Fica assim, e isso basta para repisar as grafias convalescência e convalescença. Use ambas sem medo de errar.

Nestes dias de plena pandemia (e alguém me disse que a pandemia é ‘mundial’, isso é uma redundância; ‘pan’, sim, abrange ‘o mundo’), precisamos diferenciá-la de endemia e epidemia.

Numa linguagem simples, endemia é local. De menor porte que a epidemia.

Epidemia, mais abrangente, atinge grande região ou várias, como poderia ser epidêmica a febre aftosa em vários Estados do Brasil.

Pandemia, como diz o nome, ‘pan’ significa universal, ocorre em todo o Mundo.

Segundo a Filologia, Ciência Linguística que estuda o étimo das palavras, indicando sua origem, o Grego e o Latim registram a mesma grafia: pandemia, que a emprestaram a outros idiomas, como ao Português. Em Inglês, pandemic; em Italiano e Espanhol, pandemia.

Um dicionário define: Epidemia, doença que se propaga por todo um continente.

A pandemia é grave, extensa e quase sempre fora de controle. (Hoje, somente as vacinas levariam a combater e eliminar os surtos, e, claro, com os devidos critérios adotados pela Medicina e Áreas Paramédicas para conter sua expansão.)

A epidemia (menor que a pandemia) assim é vista pelo léxico: Desenvolvimento de uma moléstia infecciosa que afeta, durante um período determinado e em certo território, um grande número de pessoas.

A endemia, palavra vinda do Grego éndemos (com a semântica de aquilo que se fixa na terra), é a doença própria de determinada região, na qual ocorre constantemente. (Analisando os conhecimentos linguísticos, pode-se dizer que a anemia equina infecciosa é uma endemia, como ocorre no Pantanal Brasileiro.)

Esse acréscimo pode ter ajudado a você, que, talvez, tenha dúvidas quanto ao uso desses três vocábulos, indicativos de três males, que nos podem afligir.

Quanto a mim, posso dizer que sempre me dei ao uso de convalescença, considerando convalescência antipática e própria de quem gostaria de se exibir, como aquele que pronuncia ‘distingüir’, ‘contactei’, ‘récorde’, ‘restorante’, ‘o mácsimo’, ‘arguído’ etc.

Estranhou essas grafias e respectivas pronúncias? Então, recapitule o que sabe e use: distinguir (o u não é pronunciado); contatei, de contatar, e contato são grafias leves e preferíveis em nova concepção gramatical; recorde (palavra paroxítona); restaurante (pronúncia clara tau, e não to); máximo, como se fosse a grafia mássimo, da mesma forma que se pronuncia ‘aussílio’, cuja grafia é auxílio; e arguido, com três sílabas, e não quatro; não há hiato, mas um ditongo, como a pronúncia em sequela.

Incomoda muito o uso do verbo suicidar como pronominal (suicidar-se). ‘Sui’ já tem o valor de ‘se’; suicidar quer dizer ‘matar a si mesmo’, e isso basta porque ninguém ‘suicida’ o outro. A jovem suicidou.

Há quem queira condenar a linguagem popular ‘Quando a gente quis se falar, não deu certo’, razão por que se pode usar ‘Ele se mandou’ e ‘Eu me sorrio’.

Abraços.

 

João Carlos de Oliveira

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