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Por que foi usado o acento circunflexo em ‘Portuguêsa’, critério adotado pela Gramática Normativa em período anterior ao atual ao referir-se ao nosso idioma?

Sabemos que nosso idioma é a Língua Portuguesa, grafia atual; antes, ‘Língua Portuguêsa‘.

Analisando a acentuação gráfica, entende-se, claramente, que o acento agudo em ‘língua‘ tem o objetivo de distinguir a sílaba tônica: palavra paroxítona terminada em ditongo crescente (ua), regra da nossa Gramática, que inclui outros exemplos: aéreo, árduo, áureo, cutâneo, glória, história, mágoa, Núbia, série, sério, tábua, tênue, vídeo etc.

Já o acento circunflexo em ‘portuguêsa’ se justifica por diferenciar a sílaba tônica de vogal fechada, ê, chamado acento diferencial, da vogal aberta, é, em palavra homógrafa (ele portuguesa, forma verbal). Do mesmo naipe, tivemos: eu acordo, o acôrdo; eu governo, o govêrno; eu selo, o sêlo, em que há uma extensa relação de vocábulos.

Essa regra foi abolida pela Lei Federal 5.765 (tantas vezes citada aqui e alhures), de 18.12.71, rejeitada por uns na época, mas hoje de plena aceitação, embora, talvez, desconhecida ou não discutida.

Para se entender o porquê do circunflexo em portuguêsa, que hoje não mais o leva, comecemos a ver exemplos de palavras terminadas em ês, que pode ser um sufixo, uma forma verbal ou a terminação de vocábulo no plural. Até esse momento, o acento se dá por ser palavra monossílaba ou oxítona, observados os exemplos a seguir.

Monossílabos: mês, rês, e nomes de letras: os bês, os cês, os tês etc., além de formas verbais: dês, lês, vês etc.

Oxítonas: cortês, montês, pedrês, e muitos gentílicos: francês, holandês, norueguês, além do nosso conhecido português.

Os nomes das letras já estão no plural (os bês); as formas verbais no plural passam a ter a terminação eem (deem, leem etc., antes dêem, lêem); os monossílabos e oxítonas recebem es e as, para formar o plural, conforme cada caso, no masculino ou feminino. Meses, corteses, portuguesas, holandeses etc., sem o circunflexo.

Do vocábulo português, fato pouco divulgado, podemos formar os verbos portuguesar e aportuguesar, a razão do comentário de hoje.

E agora, que significado têm? Como conjugá-los?

Portuguesar e aportuguesar são sinônimos, com o significado de ‘acomodar (um costume, um hábito) ao uso português; dar forma portuguesa a, tornar português’: aportuguesar palavras estrangeiras.

Esse processo seria fácil, desde que se entenda que nossa LP tem muitos vocábulos aportuguesados, vindos de vários idiomas: Francês, Inglês, Japonês, até o Russo, e uma leva de outros termos usados em Artes, Esportes, Ciência, Economia, Culinária etc., circulando por aí. O modismo é imenso ao se querer introduzir vocábulos estrangeiros na Língua Portuguesa, e se caem no gosto do público, se essa ‘enxertia’ é valiosa, é hora de essas palavras serem aportuguesadas.

Sob o aspecto formal do significado de ‘portuguesar’, e sua grafia, conjugado na terceira pessoa do singular, no presente do indicativo, toma a forma ‘ele portuguesa‘, de som aberto, razão por que o adjetivo em Língua Portuguêsa foi acentuado por ter a vogal tônica de som fechado.

Esse acento, claro, foi abolido por ser diferencial.

O verbo portuguesar flexionado em alguns tempos verbais.

Presente do indicativo: eu portugueso, tu portuguesas, ele portuguesa, nós portuguesamos, vós portuguesais, eles portuguesam.

Pretérito perfeito do indicativo: eu portuguesei, tu portuguesaste, ele portuguesou, nós portuguesamos, vós portuguesastes, eles portuguesaram.

Se você considera essas flexões estranhas, além da estranheza, esse verbo não é usado nem conhecido, mas foi esse o motivo de a palavra ‘portuguesa’, grafia de hoje, na hipótese dessa flexão verbal, ter sido usada com acento circunflexo diferencial.

Consultando uma Gramática de edição antiga, antes de 1971, encontra-se lá a expressão Gramática Normativa da Língua Portuguêsa.

O curioso, também, é que não se grafavam com o mesmo acento palavras com o sufixo ês no feminino singular e plural: holandesa, holandesas; francesa, francesas; norueguesa, norueguesas etc.

Se o verbo for conjugado no presente do subjuntivo, estas são as flexões: que eu portuguese, que tu portugueses, que ele portuguese, que nós portuguesemos, que vós portugueseis, que eles portuguesem. Atenção: a vogal do dígrafo gue tem som aberto.

No plural, para se diferenciarem das formas verbais, de som aberto na vogal tônica, é que, como adjetivos ou substantivos, os termos portuguêsa, portuguêsas e portuguêses vinham grafados com acento circunflexo diferencial, por terem a vogal tônica de som fechado. Assim, circulou, por muitos anos, Língua Portuguêsa, e se o acento não fosse usado, seria erro de grafia.

Uma leva de portuguêses chegou ao Brasil. O aluno que estuda Exatas, normalmente, não gosta da Língua Portuguêsa. As jovens portuguêsas gostam de danças típicas, como o vira-vira, cantada por Roberto Leal.

Consultando-se obras diversas do período antes dessa Lei sobre a alteração da Acentuação Gráfica, possivelmente, textos existam em que são acentuados com circunflexo os verbetes portuguêsa, portuguêses e portuguêsas, como estão.

O sinônimo de portuguesar é aportuguesar, hoje usado; a flexão ele aportuguesa não teve acento gráfico, nem hoje o teria, em virtude de sua maneira de grafar.

Mesmo estranho, assim fica conjugado, como o terá sido: eu aportugueso, tu aportuguesas, ele aportuguesa, nós aportuguesamos, vós aportuguesais, eles aportuguesam (presente do indicativo).

Eu aportuguesei, tu aportuguesaste, ele aportuguesou, nós aportuguesamos, vós aportuguesastes, eles aportuguesaram (perfeito do indicativo).

Que eu aportuguese, que tu aportugueses, que ele aportuguese, que nós aportuguesemos, que vós aportugueseis, que eles aportuguesem (presente do subjuntivo).

Sempre lembrando que a vogal do dígrafo gue tem som aberto.

Meu acervo tem uma gramática de Verbos, editada pela Fundo de Cultura S. A., dos mestres Albertina Fortuna Barros, do Colégio Pedro II, e Zélio dos Santos Jota (em sua 3a. edição brasileira, de 1964), com centenas de verbos conjugados e seus respectivos modelos, mas sequer citam esses dois verbos.

A gramática virtual é que deve trazê-los.

A forma de aportuguesamento se dá pelo aspecto gráfico e/ou fonológico. Foot-ball, do Inglês, gerou futebol, com uma gama de palavras a partir da grafia concebida pelo nosso modo de falar.

A relação de termos de origem anglo-saxônica, e do Inglês americano, no Português tupiniquim vai longe.

Em Francês, dossier faz dossiê; premier, premiê; gourmet, gurmê ou gourmê. E outros.

Antes da lei citada, grafava-se Êle fêz, exemplo clássico a ser analisado. Êle, o pronome reto, com acento diferencial, para não confundir com o nome da letra L (o ele), de som aberto. Fêz, forma verbal de fazer, terceira pessoa do singular, pretérito perfeito do indicativo, para ficar diferente de fez, singular de fezes (excrementos). O acento circunflexo nessas palavras, nos dias atuais, seria verdadeira aberração.

A palavra toda, de vogal tônica fechada, já foi acentuada (Tôda mulher é uma rainha) para ficar diferente de ‘toda‘, de vogal tônica aberta, nome de uma pequena ave do Continente Africano. Que lógica, hein!

Pior que essas regras, o que chama atenção hoje, é o fato de, ainda, não se saber se toda formiga ‘escuta’. Uma grandona, se escuta, ao ‘ouvir’ um baque forte, talvez, tome um susto. Uma formiguinha de doce, minúscula, mudaria sua rota se ‘ouvisse’ um estrondo?

No supermercado, há sabonete de todas as cores, mas todo sabão em pó é de única cor, o azul, como todos o são. Por quê?

Abraços

 

 

João Carlos de Oliveira

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