São muitos os pleonasmos viciosos, além dos conhecidos ‘subir para cima, descer para baixo’, sem se considerar a linguagem do iletrado – que costuma usá-la de forma espontânea (sem nenhuma maldade) por que desconhece a linguagem pleonástica; o iletrado, chamado de apedeuta, é muito criticado. O cidadão de melhor nível cultural, muitas vezes, é ‘perdoado’ ou seu linguajar pleonástico, sequer, é percebido. Ninguém desconfia que uma pessoa bem vestida cometa deslizes linguísticos. Um repórter noticia um fato e narra garboso seu modo falante – “Neste momento agora, está acontecendo um sequestro…”
Tem coerência o uso simultâneo de ‘neste momento’ e ‘agora’? Releia a manchete e pense um pouco – ‘Neste momento, está acontecendo um sequestro’ ou ‘Agora, está acontecendo um sequestro’. Haveria a necessidade de os dois termos estarem juntos no mesmo enunciado, tão curto como é?
Um locutor com boa dicção apregoa anúncios, e entre os muitos aparece este – ‘Venha para o esporte mais querido do Planeta’. Logo depois, cita ‘o futebol de salão’ (também chamado soçaite) como sendo esse esporte. Não seria o futebol – o futebol de campo a que nos referimos todos os dias, esporte em que o Brasil não é mais o destaque número um? Essa linguagem é ruim. Pior que um pleonasmo vicioso. Outro anúncio diz que um supermercado, na Semana da Criança (que acabou de passar), estaria vendendo produtos pelo menor preço da cidade. E logo em seguida anuncia ‘latas de cervejas’. Ora, crianças têm bebidas incluídas em seu cotidiano?
Esses são pleonasmos viciosos de mau comportamento – a incoerência ética, pior que a linguística.
O jovem está conversando bem falante sobre a vida atual – a violência, a saúde, a segurança, a educação etc. com opiniões bem formadas, dignas de louvor. Mas a todo momento repete ‘Você entendeu, tipo assim, na verdade’ e outras preciosas frases repetidas ‘mil’ vezes. Nem bem teria terminado um enunciado, interrompe sua própria fala, e pergunta suntuoso ‘O que acontece?’, sem dar chance ao outro de falar. Ele mesmo é que responde ao que perguntou. Trata-se de grande vício de linguagem. O ‘tipo assim’ se torna uma locução adjetiva cotidiana mais forte que um cabo de aço – o celular ‘tipo assim’, o hambúrguer ‘tipo assim’, a viagem ‘tipo assim’. Cansa um pouco. Quando usa ‘na verdade’, está confirmando que tudo que disse antes seria mentira? Parece que sim. Você concorda com essa interpretação? Se você usa esse modelito de falar com constância, dê uma parada.
Quando o grande orador evangélico diz que o membro da igreja ‘exulta de alegria’, como se fosse uma frase de grande efeito poético e propagandístico, está usando pleonasmo vicioso – exultar é ter alegria, estar contente, verbo definido como ‘demonstrar grande alegria, jubilar-se’. Nesse momento, nenhum ouvinte admite que o orador cometeu pleonasmo vicioso similar ao ‘desceu lá para baixo’. E ainda é elogiado. Prefiro a fala do apedeuta a esse. O inocente repete “Ele condena nós, mas porém, nois não aceita isso”. Aliás, caríssimo leitor, ao usar ‘mas’ não sequencie a frase com ‘porém’, e vice-versa. “Mas porém, não deu certo” não se trata de conjunto gramatical aceitável.
Se um meritíssimo disser em audiência que a sentença ‘foi proferida em voz alta’, também está cometendo vício de linguagem – proferir significa, exatamente, ‘dizer em voz alta’. Bastaria que o mestre tivesse dito ‘Proferiu a sentença’ ou ‘Leu-a em voz alta na sala de audiência’.
Vamos concluir, caro leitor, que ‘carga horária de 20 horas’ é plenamente repetitivo por que contém dois termos com o mesmo sentido – são dois cognatos. Simplifiquemos a frase em “Carga de 20 horas”. Note ainda que esse dizer é próprio de cursos de formação técnica, muitos comandados por faculdades famosas. Não se trata da linguagem do iletrado.
O verbo suicidar já é completo para dizer o que se pretende – que fulano se matou. Suicidar não é pronominal; não é aconselhável suicidar-se. ‘Sui’ é ‘de si mesmo’. ‘Cida’ é o que mata. Inseticida – que mata inseto. Fungicida – que mata fungo. Uxoricida – que mata a esposa. Conte o quanto de ‘cida’ você conhece. Há uma boa relação. Então, não é boa linguagem “Vou-me suicidar, Vamo-nos suicidar”. Ninguém suicida o outro. Logo, “Ele suicidou” é o bastante para se dizer a autodestruição de fulano. Um grande professor da área disse que suicidar-se está correto por que se trata de uma tradição da linguagem brasileira. Este blogueiro não vê assim. Use apenas ‘suicidar’, sem o pronome oblíquo átono, para se dar bem – A jovem suicidou ao saber que estaria com câncer. A não ser que diga “Ela se matou…”
Meus cumprimentos.