A todo um instante, as dúvidas nos atormentam bastante, tantas as variedades linguísticas, o que nos deixa atônitos, com possibilidade de erros quanto ao uso da linguagem.
Se a forma de se escrever ou falar um vocábulo não teria respaldo na Gramática Normativa, como proceder?
Se a grafia de uma palavra não consta do VOLP, o que o consulente deve fazer?
O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, que se trata de arquivo e documento, além de acervo linguístico-cultural, registra cerca de 381.000 verbetes, com as respectivas classificações gramaticais e outras informações, conforme exige o Acordo Ortográfico. Se não constam outros esclarecimentos quanto ao uso gramatical, à ortografia e outros saberes, como se deve proceder para que a grafia de um vocábulo seja considerada correta?
Mas todos sabemos disso? Todos seguimos os critérios exigidos, ou cada um usa como lhe aprouver o raciocínio?
Certamente, ao deus-dará, muita coisa gira, circula, porque os erros de grafia e concordância, constantes em artigos, são da dimensão de um deserto.
Isso não é bom.
A norma culta de todo idioma precisa de padrão, de critérios para que seja usado adequadamente; ficam livres, pelo menos em parte, a criatividade, o popularesco, com todas as liberdades poéticas, que servem de base para que a Poesia, como a Literatura em geral, tenham um pouco de folga (vez que deixariam de ser Arte se tudo só coubesse sob normas). Se a Arte estiver restrita a critérios, deixa de haver ‘o novo, o inusitado’ e passa a ser ‘costume, regra, comportamento, como um ritual do Império Romano, sem o gosto e o perfil da criatividade’.
Dessa forma, a Arte morreria, e não se teria o Belo.
Para o registro de uma grafia, a consulta deve ser a base, mais que fundamental; o alicerce para que o usuário, em especial no momento da escrita, atenda às normas gramaticais, e não haja gafes.
Há tempo para isso no frenesi moderno, na pressa de se escrever o artigo? A resposta é individual, e de modo comum ‘o caminho seguido’ é a intuição’. E nem tudo dá certo.
Os erros cometidos, ou os lapsos, são eloquentes e abundantes. A todo o momento, faltou um hífen (hoje, em microondas) ou houve um desnecessário (como em anti-envelhecimento).
A partir de uma escrita, como Tudo vai dar certo, temos uma gama de exemplos que nos pode levar ao acerto e, ao contrário, ao erro.
Um termo pode funcionar como advérbio ou adjetivo (em certas construções frasais). Não respeitada a prudência, ‘a leitoa torce o rabo e dá um nó cego, duro de ser desatado’, enfatizando o porquê de não se precaver para evitar enganos.
Buscando o fio da meada, a frase da introdução está correta. ‘Errado‘, nesse contexto, não é adjetivo, mas advérbio, o equivalente a erradamente. O mesmo caso de se usar Saíram rápido (isto é, rapidamente). Pode o usuário partir para outro modelo de concordância gramatical: “Vão logo! Sejam rápidos”, uma vez que o verbo ser exige a concordância do adjetivo com o sujeito da frase. Mudado o verbo, pode-se mudar o critério, havendo bifurcação: Saíram rápido (advérbio, rapidamente); Saíram rápidos (adjetivo, por isso flexionado no plural).
O redator pode escolher sua versão: Bateu o chicote rígido ou Bateu o chicote rigidamente (mesmo que dada outra ordem aos termos da frase), e todas devem continuar corretas.
Ainda: Bateu rígido o chicote. Rígido, bateu o chicote. O chicote bateu rígido. O chicote, rígido, bateu. (No lugar de rígido, pode-se usar rigidamente.)
Se flexionado ou concordando com o substantivo, rígido funciona como adjetivo (O guia bateu rígidos os chicotes); se não flexionado, tem-se um advérbio (Bateu rígido o chicote; Bateu rígido os chicotes). Como advérbio, rígido equivale a rigidamente.
A redação pode eliminar dúvidas, se o estilo do redator considerar de bom alvitre ser usado: Bateu o chicote rigidamente. (Sujeito no singular seguido de advérbio.) Bateu os chicotes rigidamente. Bateram-se, rigidamente, os chicotes (plural).
A semântica de rígido e a lógica do contexto é que determinariam o modo de ser usado.
O cuidado é fundamental, podendo haver mais de uma versão para a construção frasal, a depender do momento e da sua finalidade.
Ele saiu apressado. Eles saíram apressados. Ele saiu apressadamente. Eles saíram apressadamente.
No entanto, não se pode registrar Eles saíram apressado.
A frase da introdução está correta, mas podemos usar Quando as coisas dão erradas (não dão certas). Errado, como advérbio, na introdução, tem o valor de erradamente; como adjetivo, deve flexionar, concordando em gênero e número com coisas (erradas, no feminino plural, acatando a regra da Concordância Nominal).
Quando as coisas dão erradas. Quando as coisas dão errado. Qual fica melhor?
Ambas são boas, e corretas. O futuro é descobrir se uma nova frase se enquadraria em critério similar, e assim o redator teria que pensar, pesquisar e usar o seu conhecimento armazenado para evitar dissabores gramaticais.
De novo, ‘a leitoa torce o rabo’ e deixa o cara sem saída. Para o novato na escrita, o caminho é tortuoso, e deve consultar o redator-chefe. O outro viés, se não quiser alegar que não sabe, é sofrer o risco de cometer erro gramatical.
A segunda análise é a grafia ‘narcosubmarino’, registrada na introdução (apenas com um S), que não está correta. Na visão da antiga Gramática Normativa, poderia ter sido ‘narco-submarino’, assim como já se fez ‘pseudo-serviçal’; na atual, conforme a Reforma Ortográfica, o S inicial do segundo vocábulo deve ser dobrado: narcossubmarino, o mesmo uso de psicossocial, psicossomático. Pode haver prefixação: minissaia, minissérie, contrassenso, ou até contrarrumo. Por isso, suprassumo, suprarrenal.
Narcossubmarino, grafia correta, introduz-nos um neologismo em que um radical (narco, relativo a narcótico, usado também em narcotráfico, narcotraficante etc.) e um substantivo (submarino) se uniram para formar nova palavra, que não deve constar do VOLP.
O fato de a grafia estar incorreta é que o redator se esqueceu de buscar um critério: na junção de dois termos (narco e submarino) para formar uma palavra nova; nesse caso, deveria seguir o naipe da formação de palavra composta (aglutinação). Havendo prefixo e um vocábulo, adjetivo ou substantivo, respeita-se a derivação prefixal. Se começado por R ou S, surge o dígrafo desse tipo: ultrassom, ultrassonografia, antirrábico, altissonante, e outros.
O primeiro elemento, com o valor de adjetivo, terminou em vogal (narco), e adotada a junção de vocábulos, seguindo as regras da Reforma Ortográfica, a consoante inicial do segundo elemento deve ser dobrada, formando dígrafo (ss), grafia obrigatória.
Acostumado com grafias como psicossocial, psicossomático, o redator não titubearia: narcossubmarino, e teria segurança para, em outro momento, não ter dúvida. Que tal, já acostumado, também, a minissaia, minissérie, antirrábico, contrassenso etc., começasse a usar nipossocialista, italossomaliense (italossomali, italossomaliano), neossocialista, aristotelicossocrático etc.?
Seguiria, inclusive, a regra adotada para microrregião, macrorregião, e outros termos, videoconferência, videomonitoramento, videoaula, videocassete etc.
O substantivo narcossubmarino, novo verbete, tem relação com o tráfico internacional de drogas, que chega a ser realizado para o Velho Mundo via submarino (que não pertence à Marinha de nenhum país). O jornalista criou o vocábulo, o que é bom, mas teve dúvida quanto à forma de grafá-lo.
Na dúvida, faça-se a ‘pregunta’ ao Google: qual a escrita correta, narco-submarino, narcosubmarino ou narcossubmarino?
A primeira teria sido antiga; a segunda, que foi usada, nunca existiu, e a última, correta, segue a atual faceta gramatical.
Amanhã, ‘nóis dá as cara de novo’.