Formas verbais e substantivos, em Português, terminados no hiato oo são muitos. Basta recordar, tendo como base o conhecido ‘voo’, tanto a forma verbal (eu voo) como o substantivo (o voo). Para ficar mais evidente, conjuguemos o verbo voar no presente do indicativo: eu voo, tu voas, ele voa, nós voamos, vós voais, eles voam.
Ela sofreu um enjoo forte durante o voo a Nova Iorque. Eu corroo o material até que se solte do invólucro. O ensaboo da toalha foi necessário para sair toda a sujeira.
Com as mesmas desinências, outros verbos se destacam: eu abalroo, tu abençoas, nós abotoamos, ele aleiloa (ele leiloa), eu aperfeiçoo, nós assoamos (limpamos o nariz), os meninos caçoam do colega, o mau vizinho enodoa a família ao lado, a lavadeira ensaboa a roupa, o jovem cantor entoa uma linda canção, o trabalhador esboroa a árvore, perdoai a quem vos ofende; tu reboas esse barulho para incomodares os vizinhos?
As frases acima, de propósito, foram flexionadas, aleatoriamente, em pessoas diversas, no presente do indicativo, e uma no imperativo afirmativo (perdoai), com a finalidade de serem entendidas as terminações verbais oo, oas, oa, oamos, oais, oam.
Há muitos verbos terminados em oar? Além de exemplos já citados, há outros. A relação é grandinha, mas não se assuste, uma vez que podemos recordar: abençoar, arpoar, atordoar, atroar, coar, coroar, doar, enjoar, esboroar, escachoar, escoar, perdoar, soar, reboar, ressoar, retroar, revoar, zoar.
E de onde vem too? Trata-se da primeira pessoa do singular (eu), no presente do indicativo, do verbo toar, em sentido figurado ou não, o mesmo que soar, ecoar, trovejar, estrondear, retumbar. Figuradamente, ficar bem, dar certo, agradar, condizer.
Se fizemos a flexão de voar, vamos ver a desse toar: eu too, tu toas, ele toa, nós toamos, vós toais, eles toam.
Não é verbo usual, tanto na linguagem culta como na popular, mas sua flexão inicial é esta, e está correta. Fi-la para justificar a pergunta da introdução do artigo (Você conhece a forma verbal ‘too’?). Parece que nem existiria, mas está aqui para ser comparada e usada, caso necessário.
Na conjugação no presente do indicativo, todos esses verbos apresentam a grafia oo, que antes da Reforma Ortográfica era acentuada com o circunflexo. Eu vôo, eu dôo, eu ressôo.
Apesar de não terminar em oar, o verbo remoer, nesse mesmo tempo e pessoa, tem esta terminação: eu remoo. E moer? Todos nós o conhecemos: eu moo, tu moas, ele moa, nós moamos, vós moais, eles moam.
Ficou fácil agora o entendimento sobre toar?
Encontrei num dicionário de rimas a forma hidroo, que, nesse caso, seria a flexão de hidroar, um verbo, com o possível significado de hidratar; hidro (água) é radical muito usado para formar palavras conhecidas: hidrófilo, hídrico, hidrofobia, hidrogenar, hidrogel, hidroginástica, hidrografia, hidráulico, hidrelétrica, hidrólise etc. Assim, não seria novidade a poesia popular, como o cordel, usar acoo, supostamente, a flexão na primeira pessoa do singular, no presente do indicativo, do verbo acoar, uma variante de acuar. O cachorro acoa a caça, isto é, ele acua o animal na toca.
Um termo vai gerando outro, e chegamos a exemplos que não estão na linguagem culta, mas no cotidiano bem à vontade. Se conjugássemos hidroar, seria: eu hidroo, tu hidroas, ele hidroa, nós hidroamos, vós hidroais, eles hidroam.
O popular nos dá ‘eu zoo’, do verbo zoar, cuja grafia é a mesma da abreviatura do conhecido zoológico. O zoo de BH ficou interditado por algum tempo no ano passado. Muitas cidades têm um zoo com animais nativos do Brasil e outros de origem exótica (zebras, hipopótamos, cangurus, rinocerontes etc.).
Certamente, num momento, poderíamos admitir que a forma ‘too’, como verbo, seria uma utopia, mas não o é.
Se usamos eu soo, de soar, temos outras pouco usadas que teriam a mesma aparência estranha: eu ecoo, eu atroo, eu reboo, eu arpoo, eu escachoo, eu retroo.
Repitamos frases clássicas com o verbo coar: eu coo o café, ela coa o suco; nós coamos a matéria para lhe tirar as impurezas.
Outros verbos com a mesma terminação: A água escoa pelo ralo. Eu escoo e-mails que me enviam, pois alguns não têm pé nem cabeça (hipótese de linguagem figurada). O homem atordoa a si mesmo. O empresário doa bens ao orfanato.
De forma livre, usando-se a conotação, para que a palavra adquira o sentido figurado, surge eu too, isto é, produzo um som. Ele toa no tamborim as músicas mais bonitas.
Seria uma novidade o uso desse verbo?
Se podemos usar soamos, passamos a toamos, e daí eu soo, como eu too, eu zoo, doo, ecoo, revoo etc.
Fechando o artigo simplório de hoje, mostremos alguns parônimos e formas variantes, que existem em abundância em textos diversos e na fala popular: descriminar, discriminar; rufar (o tambor), ruflar (as asas para voar, como o faz a borboleta); forçar (obrigar), forcar (revolver com forcado); atoar (ficar à toa), atuar (agir); paço (palácio), passo (modo de caminhar, passada).
E mais: Onde você está agora? Aonde vai amanhã?
Eu tenho ficado triste com tanta violência. Eu havia ficado chateado com a agressão dela, mas já a perdoei.
Havia muita gente na rua. Havia muitos sócios no clube. Havia outras vítimas no acidente.
Tenho comprado pouco. Tínhamos chegado cedo. A conta foi paga. Eu tenho pago todos os meus débitos em dia. Eu tinha pagado a conta de energia, mas não foi comprovado isso.
O diretor tinha expulsado o aluno por motivos justos. O aluno foi expulso pelo crimes que cometeu.
Fiquemos por aqui hoje. Obrigado pela visita.