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Regência verbal: ‘Namoro com ele. Namoro ele. Namoro-o’. Qual é a sua? (capítulo 2)

No momento do amor, a Gramática não importa. Namorar é namorar. Talvez, a Gramática correta desvie o caminho dos amantes. Desentendimentos há se a fala é corrigida. O bom amante olvida o erro e eleva o amor aos píncaros do Himalaia.

É chato falar errado, mas nessa hora, quando o amor flui, o melhor é ‘amemos agora e falemos de Português mais tarde’. Depois de eu aprender a sua ‘gramática’ e você aprender a ‘minha’, é que vamos em busca do que nos ensina Domingos Paschoal Cegalla.

Numa tarde fresca, ‘Oh! meu amor, como eu gosto de tu, de teu sotaque, de tua linguagem descontraída, de teu idioma, de tua meiguice no falar. Tu é o homem do meu inferno astral, tão amoroso como um bife de boi magro. Com tu, vivo feliz como um macaco que descobre um cacho de banana madura na floresta’.

Pausa: “Amor, o que é idioma?” “Ora, amor! Idioma é língua!” Mais tarde… “Amor, você vai à rua? Traz um ‘idioma de vaca’ para mim!”

Após essas bobagens, bobeiras ou bobices (as três existem), quero-me redimir: o verbo namorar, mesmo com várias acepções, é sempre transitivo direto, como nestas: Mariá namora o garçom da lanchonete (corteja). A menina faceira namorava a calça da moda na vitrina (olhava com cobiça). Há duas semanas, namoro o novo modelo de um carro importado (desejo com ardência). Eduardo namora Ana há muitos anos (mantém com ela um relação de namoro).

No popular, namorar é usado seguido da preposição ‘com’, que o transformaria em verbo transitivo indireto; essa linguagem é condenada pela Gramática Normativa. Fica o impasse: “Namoro com ele” desobedece à norma gramatical, e “Namoro-o” não tem o charme da simplicidade para revelar as ousadas intenções.

Na escrita, a prevalece a norma; na convivência habitual, deve ser relevante a junção do sorriso com ‘vamo que vamo’ por que o tempo não nos espera!

E vamos às opções da poesia popular: Namoro tu. Te namoro. Namoro a ti. Namoro com você. Namoro com tua cara de paquerador já que namorá-lo é difícil!

Outros verbos flagrados no erro cotidiano: pagar. Paguei o banco. Ops! Se você não o comprou, como pode pagar por ele? “Paguei ao banco o boleto”. Pagar pede objeto direto de coisas: Pagou o cafezinho, e objeto indireto de pessoas: O motorista pagou a ele (pagou-lhe) os prejuízos.

Pagar, na velha tradição do crime, é cumprir pena, expiar uma culpa: Ele está pagando os crimes que cometeu.

Preferir é problemático: vive sempre chateado com seus usuários. Se for dada a primazia de uma escolha, é transitivo direto: Como sabe escrever, prefere a norma culta. “Não podendo lutar, preferiu a morte”. (Machado de Assis)

Na escolha de uma coisa ou outra, é simultaneamente transitivo direto (o objeto direto vem em primeiro plano) e transitivo indireto (o objeto indireto vem em seguida): Prefiro café a leite. Ele preferiu o chocolate à coca-cola. Devemos preferir a justiça ao descalabro social. O homem polido prefere a Ética ao suborno.

Nunca use preferir seguido da expressão ‘do que’, já que a frase não é comparativa: “Prefiro ficar sem dinheiro do que trabalhar”, diria o inapto. Prefiro ficar sem dinheiro a trabalhar. Após a alforria, o negro brasileiro preferiu a morte à escravidão.

Está fora do contexto temático de hoje, mas a frase deve ser analisada: o enunciado de uma instituição escolar diz “Mensalidades a partir de R$… por mês”. Você concorda que ‘alguma mensalidade’ não aconteça em algum mês? O enunciado sem esse pleonasmo vicioso ao nível de ‘descer para baixo’ pode ser: 1. Mensalidades a partir de R$…. 2. R$… por mês. 3. Valor mensal a partir de R$…

A instituição comete vício de linguagem imperdoável, pois é ela quem cobra conhecimento gramatical na redação e nas questões escabrosas de Língua Portuguesa no vestibular.

Aguarde o próximo capítulo.

Teixeira de Freitas, BA, 26 de janeiro de 2017.

 

João Carlos de Oliveira

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