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Procuro ‘ele’. Procuro-o. Procuro por ele. Que forma de se expressar lhe parece mais aceitável?

As variantes linguísticas são sempre interessantes e curiosas.

Mesmo que uma descumpra a norma gramatical, é usual e manda ver o que lhe cabe como mensagem.

Nesse aspecto, os falares fluem, e isso é bom para a comunicação, em especial, na nossa coloquialidade.

Analisadas as três formas de expressão do título, pode-se dizer que a primeira seria ‘coloquial’; a segunda, culta, e a terceira, popular.

As expressões ‘pegar ele, ver ele, procurar ele‘, como outros vieses da nossa coloquialidade, seriam criticadas, ainda que por poucos, e não aceitas na norma culta, mas têm circulado e sobrevivido em meio ao nosso falar de múltiplos valores.

Deixemos acontecer, e não seria de outra maneira na informalidade ou do próprio falar de alguém que não aprendeu a regra gramatical, ou de quem tenha esse conhecimento, mas considere desnecessário ‘cumprir’ com rigor o que diz nossa Patrícia Pouco Amada Norma Gramatical, às vezes, meio chata. Para a comunicação coloquial, o melhor é do nosso jeito, do modo que ‘nóis qué falá’, e pronto.

O que você tem com isso? (Nem eu!)

Além desses aspectos, outro objetivo é mostrar como ficariam essas três formas em vários tempos verbais.

Passemos do presente do indicativo, na primeira pessoa do singular, como estão, para a terceira pessoa do singular no mesmo tempo e, após, para outros.

Esse processo serve para se analisar como seria o dia a dia dessa fala ou o conceito que cada pessoa tem dessa linguagem, quando a aceita, e quando não.

Procura ele, procura-o, procura por ele.

Procurou ele (por tudo quanto foi canto e não achou), procurou-o, procurou por ele.

Procurava ele, procurava-o, procurava por ele.

Procurara ele, procurara-o, procurara por ele (passado mais que perfeito, pouco usual).

Procurará ele, procurá-lo-á, procurará por ele (até o fim do mundo, mas vai achar).

Procuraria ele, procurá-lo-ia, procuraria por ele (se lhe pagassem bem).

Eis os seis tempos simples do indicativo, e cada um tem seu valor no momento de ser feito o enunciado, com ou sem ênfase. Importante observar que, a depender do nível intelectual do usuário, todos os falares têm sua razão de ser.

Vale também ver como fica a mesma expressão no infinitivo impessoal: procurar ele, procurá-lo, procurar por ele.

Há quem diga que a forma de falar diverge pelo fato de haver a procura por interesse ou por obrigação.

‘Procurar ele’ é o natural, sem nenhuma obrigação, pelo mero fato de encontrá-lo. ‘Procurar por ele’ seria quando há a necessidade extrema de encontrar ‘o desaparecido’ (um idoso que some do mapa) ou por obrigação judicial, vinculada ao dever de cada um. Valem as hipóteses, tidas como ‘verdadeiras’.

Jornais populares e sites regionais costumam usar ‘procurar por’, linguagem comum e popular; ao que parece, mais fácil de se entender a mensagem.

Linguisticamente falando, trata-se do mesmo viés: há a procura, e o modo de dizer não importa. Gramaticalmente, o verbo procurar é transitivo direto, cujo complemento verbal (o objeto direto) aparece em três matizes: ele (o coloquial), o (a forma culta), por ele (a popular), mas todos dizem o que precisa ser dito.

O contraste é que o culto não quer o ‘ele’, e o ‘por ele’ pode depender do Regionalismo, do jeito de cada um falar, adquirido na sua vivência comunitária.

E o uso da preposição por obriga a que se classifique o complemento verbal como objeto indireto? Isso não, mesmo que os doutos discordem, e não se trata de regra pacífica. Continua o mesmo objeto direto, e como a preposição não se caracteriza como obrigatória, exigida pela regência verbal, temos o objeto direto preposicionado, que surge por ênfase, por ligeira mudança semântica, e não pela regra gramatical.

Comparem-se os casos: sacar a arma, sacar da arma (objeto direto, objeto direto preposicionado); comer o bolo, comer do bolo; beber a água, beber da água; chamá-lo e chamar por ele; cumprir a palavra, cumprir com a palavra; aguardar o momento certo, aguardar por um momento certo; esperar um transplante de rim, esperar por um transplante de rim.

A Gramática Normativa diz que o objeto direto preposicionado se dá por razões estilísticas ou por necessidades semânticas, e que completam verbos transitivos diretos.

Podemos dizer que as razões estilísticas, isso é claro, variam de pessoas para pessoas: os poetas, os jornalistas, escritores de linguagem fluente, que criam suas expressões novas, arretadas, e precisam ser diferenciadas. As necessidades semânticas estariam ligadas a uma mudança de significado ou a uma diferenciação do momento: comer o bolo seria comê-lo todo; comer do bolo, devorar uma parte dele, um pedaço, um naco, e não o todo.

Matou ao vilão o herói (para evitar a dúvida ou ambiguidade: o vilão, o morto; o herói, o autor). O estudo não prejudica a ninguém (para ficar mais claro e enfático). Console aos necessitados, saque do revólver e seja rápido (para dar destaque ao modus operandi).

Com a palavra Deus é quase sempre necessário usar objeto direto preposicionado por questão de respeito: Amar a Deus (para que se diferencie do amor carnal).

Amo-te, eu te amo, eu amo a ti (o último objeto direto preposicionado).

O mestre o inquiriu, e a mim, como aos colegas (os dois últimos são objetos diretos preposicionados).

Assim, vamo-nos comunicando, e cada um segue o que lhe convém, com o devido respeito ao nível, ao estilo e ao padrão do outro.

Procurar é verbo de origem latina, fincado na raiz procurare, a cuja família etimológica pertencem procurador, procura, procuração, procuradoria etc.

Interessante lembrar que procurar tem sua variante regional não contemplada no léxico: percurar, que ainda tem sobrevida no nosso Regionalismo.

No imperativo afirmativo, na pessoa você, temos: procure ele, procure-o, procure por ele já (ao contrário, vai haver um desastre).

No negativo, não procure ele, não o procure, não procure por ele.

Que não se use ‘não procure-o’, pois o advérbio negativo não exige que haja a próclise. Se ‘não o procure’ seria elitista, a variante ‘não procure por ele’ fica de bom tamanho e mais fácil de falar e ser entendida.

Por último, se usássemos essas frases na primeira pessoa do plural, teríamos: procuramos ele, procuramo-lo, procuramos por ele. Esta segunda não seria usada na linguagem tradicional, por isso, veio a terceira: fácil, solta, naturalíssima: procurar por alguém, procurar por um emprego, procuramos por ele em todos os lugares.

Fica assim.

Obrigado.

João Carlos de Oliveira

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