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Presidente ou presidenta? ‘Presidenta’ seria modismo linguístico para demonstrar charme?

Quanto ao uso de masculinos e femininos, tradicionais ou esdrúxulos, a Gramática não faz rodeios nem deixa dúvidas – vai direto ao assunto e diz – ‘A ideia de gênero é meramente gramatical, algo estabelecido por uma convenção, por pura arbitrariedade’. Este analista, não quanto aquilatado como um filólogo, acrescenta que o gênero (masculino/feminino) é mera formalidade, sem que a regra seja absoluta ou única. O que há em ‘cadeira’ para ser palavra feminina e em ‘banco’ para ser  masculina? Só por causa da respectiva terminação? Que sexo têm ambos? O que se vê a olho nu num inseto para se dizer ‘este é masculino e aquele é feminino’? Mas se sabe, como praxe, e não poderia ser diferente, já que temos certa vivência, que substantivos que designam pessoas e animais se flexionam em gênero (o macho e a fêmea) e, de modo geral, se apresentam com duas formas – o ser do sexo masculino (o menino, o gato), terminado quase sempre na desinência ‘o’, e o ser do sexo feminino (a menina, a gata), da mesma forma, quase sempre terminado na desinência ‘a’. Por isso, aprende-se, com o ouvido atento às coisas, que palavras terminadas em ‘A’ (mesa, cadeia, casa) são femininas, e outras terminadas em ‘O’ são masculinas (buraco, campo, veículo). Daí a pouco, começam as exceções – poste, terminado em E, mas é masculino; e estepe, com a mesma terminação, é feminino. Danou-se!, como diria o caboclo pouco afeito a essas bobagens de gente sabida. Melhor seria dizer de outra forma – se couber ‘o’ é por que é masculino; se couber ‘a’ é por que é feminino. Por isso, o grama, o fonema, o telefonema – são masculinos; a estupidez, a síncope, a verminose – são femininas. Melhor dizer assim.

No entanto, a Gramática vai infernizando a cabeça de todos nós – homem, masculino; mulher, feminino. E faz um rol de palavras capazes de chegarem até a Lua. Rei, rainha; cavalo, égua; e vai mudando – juiz, juíza; oficial, oficiala. Na rua, conversamos com seu Geraldo, com dona Geralda; surgem o Manuel e a Manuela, o Gabriel, a Gabriela; seu Conrado, dona Romualda,  e outros – o leitão, a leitoa; o trabalhador, a trabalhadeira – que costuma trabalhar muito; a trabalhadora (a mulher operária); o embaixador, a embaixatriz (esta somente sua esposa) e a embaixadora, que pode ser uma jovem solteira, aquela que exerce funções diplomáticas numa embaixada, que não é o conjunto de chutes leves para cima, as embaixadinhas, dados pelo craque para expor habilidades futebolísticas. Então, começou a complicar – a depender do modo de se usar, a palavra se torna masculina ou feminina, e tem novo aspecto semântico – o lente é o professor; a lente, o objeto que você conhece, que nem sempre é de vidro nem somente usado em óculos de grau. O grama é unidade do peso (um anel de dois gramas); a grama (a relva). O que é isso, companheiro?

Espere um pouco, leitor, que vamos chegar ao cerne do assunto – estes exemplos nos dizem: ‘Se temos tantas variedades’, por que não podemos ter ‘a presidenta‘? Soa mal para uns ou parece modismo exibicionista para outros? Então, já temos uma resposta – se temos o elefante, a elefanta (aliá é a fêmea do elefante ainda jovem (ela) para a espécie indiana); se temos o parente, a parenta, o gigante, a giganta, daqui a anos vamos ter o tenente, a tenenta… Não, essa não! seria forma não-usual – o dicionário diz que ‘tenente’ é um substantivo masculino, e, com certeza no quartel, diante da incerteza, para não se cometer uma gafe, vão dizer o tenente, a tenente, assim como o gerente, a gerente, o chefe, a chefe – são os chamados comuns-de-dois; mas tome cuidado, meu caro – o ídolo (para ele, para ela), sem se dizer “Ela é minha ídola” – meus tímpanos acabaram de ficar feridos, assim como seria feio dizer que “Vovó é uma carrasca”. A criança, o soprano, a testemunha – indicando ambos os sexos, esses são os sobrecomuns. Não é mais o bacharel, a bacharel – passa-se a ter a bacharela, como de o general se faz a generala. Cuidado – o sargento, a sargento, o soldado, a soldado. Será que estão usando a sargenta? Vamos lá – se inovamos muito, um dia será termo comum.

Então, vem uma regra – substantivo terminado em e faz o feminino trocando-se e por a: o governante, a governanta, o mestre, a mestra; por isso, o PRESIDENTE, a PRESIDENTA – corretíssimo, embora, pareça estranho; é ruim apenas quando essa forma é usada com certa exibição, no caso, para a chefe maior da Nação, mas pode ser a mandatária de uma empresa, já usado de há muito. Pelo comentário, basta. Tenha cuidado para não dizer ‘a cônjuge’, e pior quando alguém se esquece que se trata de um vocábulo proparoxítono – tem que haver o acento gráfico e a pronúncia forte na antepenúltima sílaba (o côn-ju-ge, tanto o homem como a mulher). Como advogado, uso – para dirimir dúvidas – o cônjuge masculino (ele) e o cônjuge feminino (ela). Fica mais leve. Evita-se aquele insosso ‘o cônjuge-varão’ e ‘a cônjuge-varoa’. Seria melhor se usar logo o varão (o homem), a varoa (a mulher). Vamos terminar, professor?!

Não é estranho se usar ‘a papisa‘ se uma mulher nunca pode ou pôde ocupar esse cargo na Igreja Católica? Não seria mais poético se usar ‘a poetisa‘ (Cecília Meireles) que se dizer, com a boca cheia de saliva, ‘a poeta’? Fica meio enxabido, não fica?

Ponto final. Você já praticou um bigu? (É uma viagem clandestina em qualquer veículo. Gíria fluente no Nordeste.)

João Carlos de Oliveira

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