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A grafia ‘buzu’ está correta? É aconselhável usar “Tem gente na rua”?

 

Este pode parecer um artigo muito simples e desnecessário, mas não um artiguelho, que seria de má qualidade, em linguagem pejorativa. Pode ter um pouco de graça. ‘Buzu’, tão usado no cotidiano, vem de ‘bus’, termo inglês para se dizer ônibus. Ônibus, por sua vez, vem do Latim ‘omnibus’, que significa ‘para todos’. Esse mesmo étimo gerou o respectivo vocábulo em Inglês. Repitamos: em Inglês, omnibus, que tem a forma reduzida ‘bus’, e em Português, apenas, ônibus. Na gíria da juventude, que hoje não é ‘transviada’, mas irreverente e sarcástica, surge o buzu, veículo urbano e interurbano coletivo. Se uma grande artista estivesse nele, e se quiséssemos fazer uma chacota modelar dos tempos idos, diríamos que esse veículo seria o lotação, daí o filme A dama do lotação. A propósito, a lotação é o número de passageiros; o lotação é o veículo, que pode ser o ônibus. Mudei de assunto? Mas trouxe uma informação. Isso é um tratado paralelo, similar à história machadiana em que o mestre de Memórias Póstumas de Brás Cubas dava um corte na sequência textual para fazer um paralelo – tornou-se assim o mestre desse tipo de ação de suspense, e logo voltava ao conteúdo maior. Foi assim em quase todas as suas obras, por isso, fica uma dúvida – Capitu traiu ou não traiu Bentinho? Capitu traiu, pois chorou diante do corpo no féretro.

Agora, sim, a grafia boa é ‘busu’, com S, por que vem de bus; é uma palavra onomatopaica, isto é, nasce de um som, como se tem tique-taque, bem-te-vi, craque-craque (quanto se mastiga alguma coisa). A regra é – a palavra derivada conserva o S  da primitiva – lápis – lapiseira; cortês – cortesia, freguês – freguesia. Luís, Luisinho; país, paisinho. Eta paisinho cheio de fricotes este nosso! Bus, busu.

Se o vocábulo terminar em Z (cruz, cicatriz), seu derivado será com Z – cruzar, cruzada, cruzeiro; cicatrizar, cicatrizante, cicatrização. Se o primitivo não tiver S nem Z, o derivado será com Z – canal, canalizar.

A grafia com Z (buzu) destoa da regra, embora seja a forma usual; a grafia com S (busu), que obedece ao étimo, não é aceita, não é simpática, não é usual. E pode ser contestada. Não?

A língua tem grafias não explicáveis, como pântano, palavra proparoxítona, que, segundo a Gramática Histórica, deveria ser grafada sem acento gráfico – pantano – sendo, pois, uma palavra paroxítona. Temos outros exemplos – recorde (cuja pronúncia circula com acento tônico na primeira sílaba – corde; similarmente, vemos muitas pessoas dizerem brica e não rubrica, como manda a regra. A nossa prosódia, a pronúncia correta de um vocábulo, pode variar de região para região. Admite-se isto – a grafia é única, mas a pronúncia pode ser variável. Deixemos o povo com sua liberdade, pelo menos na linguística cotidiana, uma vez que não possa ser nos seus direitos pétreos e usuais.

E “Tem gente na rua” quando é que você pode usar sem medo de ser tachado de tacanho? Quando você estiver exatamente usando uma linguagem popular, sem compromisso com a regra, quando você está imbuído de pura liberdade de expressão – tem isso, tem aquilo, tem peixe no rio, tem uma pedra no sapato. Mas se você estiver redigindo seu texto para publicar, sua tese de formatura, use uma linguagem escorreita, talvez elegante, – Há gente na rua -, que muitos acham meio ‘cacete’. Para variar, pode usar Existe gente na rua, que vai para o plural “Existem pessoas na rua”. Em “Há gente na rua” não flexione o verbo – Há pessoas na rua. Nunca diga “Houveram muitas pessoas na reunião” – trata-se de um erro grave de concordância verbal. O solecismo de que falei há poucos dias. O verbo haver, no sentido de existir, é impessoal. Já existir é rico, doidão, variado, é pau para toda obra – existirem, existissem, existirão etc. Mais uma faceta – se você quer ser chique, não use o popular ‘Tem frutas no pomar’, use com segurança ‘O pomar tem frutas’, e siga esse estilo – O rio tem peixes, a rua tem gente, o prato tem comida, a praça tem movimento todos os dias. Meu pé tem muita frieira.

Então, este é um artigo simplório, meio tolo, parecendo o bobo da corte, que tem o papel de fazer o rei rir. Para terminar, não use “Busque outras alternativas”, por conter um forte pleonasmo – em alternativa, ‘alter’ significa ‘outro’. Use de forma mais branda esta saída: Busque alternativas. Ficará bem.

Como analisa este comentário?

João Carlos de Oliveira

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