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Frases cuja semântica é estranha, piores que as de pleonasmo vicioso

Salvo melhor juízo, há frases ruins, piores que aquelas de pleonasmo vicioso, estas geralmente emitidas por quem desconhece regras gramaticais ou não acata segui-las.

Uma, com pleonasmo vicioso, que se vem tornando tradição, é iniciada com o verbo haver, normalmente, na terceira pessoa do singular (há, houve), seguido do advérbio ‘atrás’. Embora sejam de classe gramatical distinta, ‘há’ e ‘atrás’, no mesmo conjunto frasal, se referem ao passado, motivo por que não devem estar ‘no mesmo barco’. Torna-se charme, e dá início à fala de palestrante, “Há muito tempo atrás, falava eu para uma plateia igual a esta”. Tão costumeira, nem parece conter vício de linguagem: ‘há’ indica tempo decorrido, portanto, passado; ‘atrás’ refere-se a um período que ficou em meses ou anos idos, também, por conseguinte, referente ao passado. Os dois termos não podem estar no mesmo conjunto frasal. “Há muito tempo, estive nesta cidade.” “Tempos atrás, estive nesta cidade.” Ou uma, ou outra.

Essa não é pior que esta, incomodativa, escrita em panfletos: “Não jogue este impresso em vias públicas.” Professor, essa frase contém ‘erro’ de Português? Sim, a frase, além de preconceituosa, alega o impossível: o mesmo panfleto ser jogado (várias vezes) ‘em vias públicas’.

Semanticamente, a expressão ‘vias públicas’ indica vários logradouros, e o mesmo impresso teria que ser jogado ‘muitas vezes’ na rua. Não há lógica. A mensagem ‘Não jogue papel nas vias públicas’ é afetiva e tem outros aspectos: não é elegante que um cidadão ande jogando papéis diversos pela cidade afora. Não se dizem quais são esses papéis. Supostamente, os que o cidadão carrega no seu dia a dia. A do panfleto é direcionada: não o jogue nas vias públicas. Se isso for (fosse) possível, o mesmo cidadão teria que jogá-lo em uma via pública, pegá-lo e jogá-lo novamente em outra. O recado panfletário insinua ‘muitas vias públicas’. Se não for o primeiro ‘sujão’, outro vem, pega-o e faz a mesma coisa: joga-o em vias públicas. Isso não é possível.

A frase é péssima em se tratando de gente culta que a criou para divulgar ‘seu texto’. Naturalmente, para não incorrer em erro linguístico, deveria dizer ‘Não jogue este impresso em via pública‘. O primeiro incauto escreveu no plural (vias públicas), o seguinte copiou, e continua repetido o mesmo lapso.

A mensagem quer dizer que o cidadão não deve sujar a rua, mas quem recebe tem a obrigação de carregar ‘cada bobagem’ (colocar na agenda ou no bolso) até encontrar um local para depositá-la? Ou levá-la para casa?

Outro detalhe é que recebemos diversos desses míseros textos por dia, conforme o tipo da cidade. Juntá-los todos e levá-los para nossa casa?! Isso dói. Portanto, a frase é ruim. É melhor abominá-las. Preferíveis as simplórias: ‘Nestante, vi um homi de bonel passar puraqui’. ‘Peraí, qui já vô’.

E mais: sua Prefeitura dispõe cesta de lixo para o cidadão jogar esses papéis e não jogá-los em via pública?

Um pregador empolgado fala que fala. E se diz sabedor da psicologia (não a animal), querendo convencer o ouvinte de que está certo, e diz: “Recomece agora, novamente, sua vida”.

Se escreveu ‘re’, por que ‘novamente’?

Escrito de uma loja: “Toda loja com desc. especiais, apenas essa semana”.

Companheiro, a abreviatura ‘desc.‘ está no plural ou no singular? ‘Essa’ já passou; portanto, não existe mais desconto.

‘Toda a loja com desconto especial (descontos especiais), apenas esta semana’.

No fim de semana, deve tirar o aviso. Se deixar, usa de má-fé, e a propaganda é enganosa. A não ser que use ‘enquanto durar o estoque’.

A frase, por ser de uma loja, seria pior que ‘Pro mode nois ir de novo pra riba da casa’.

O coordenador de um curso de dança, dando aulas para jovens, ao ser entrevistado, disse várias vezes: “Essa dança ela visa recuperar meninos e meninas de rua.” E repetia: “Essa dança ela (…).” Adiante, “Essa dança ela (…).”

Seria ótimo apenas ‘A dança visa a recuperar meninos e meninas em situação de risco’.

Há dificuldade para serem usados verbos terminados em EAR na terceira pessoa do singular e do plural no pretérito perfeito do indicativo: a qualquer momento, ouvimos alguém falar ‘Ele estreiou idade nova’. Escrita de um cartaz: ‘Esta loja sorteiou o bilhete premiado’.

Confundem as formas rizotônicas do presente do indicativo (em que há um ‘i‘ eufônico na sílaba tônica) com as arrizotônicas das terceiras pessoas no perfeito (em que não há esse i): O prefeito nomeia o secretário, mas O prefeito nomeou o secretário. A loja sorteia o bilhete premiado, mas A loja sorteou o bilhete premiado. Manuel estreia idade nova, mas Manuel estreou idade nova.

Grande apresentador é fã de usar “Ele estreiou nova série” (ferindo nossos tímpanos).

É moda no momento o uso de CEO. Empresários adoram isso. O que é? Está na Internet para todo mundo aprender: CEO, sigla do Inglês Chief Executive Officer. Em  tradução livre, ‘Diretor Executivo’. CEO é uma autoridade na empresa. O curioso é colocar um chip no funcionário para saber de todos os seus passos. Seria assédio moral, embora haja quem considere lícito. Querem tornar ‘o colaborador’ subordinado a todos os atos da globalização escravagista?

Melhor vender banana na feira (e ser livre) a estar preso a quem vigia o funcionário até no momento de estar no banheiro. O excesso da hierarquia empresarial estressa o cidadão, prejudicando-o emocionalmente. Usam o plural CEOS (para dizer vários chefes). Isso não existe. O plural de siglas com letras maiúsculas, como CD, DVD, PM, é com esse minúsculo: CDs, DVDs, PMs, portanto, CEOs etc.

Os CEOS são autoritários?! Meu Deus! Os céus estão negros!

O que é isso, companheiro?

João Carlos de Oliveira

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