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Palavras árabes. ‘Oxalá’, interjeição, grafia em Português, já faz parte da nossa linguagem cotidiana

(Parte 2)

Venho supor que alguns visitantes tenham gostado do relato anterior sobre o empréstimo de palavras árabes ao nosso idioma.

Até já se tornaram ‘patrimônio’ de nosso falar e escrever, fato que alguns, talvez, nem percebam ou saibam: muitos dos vocábulos aportuguesados são de origem árabe.

A interjeição ‘oxalá‘, alvissareira que é, com pronúncia agradável, desde que em suave entonação, é palavra integralizada à nossa cultura, mesmo que o usuário, falante ou escrevente, qualquer que seja seu nível de instrução, não se dê conta dessa história. Mas todos a usam com inteira desenvoltura.

Oxalá, complemento de expressões optativas (que exprimem desejo). “Que façam boa viagem!”, ao que respondem “Assim, queira Deus!”, ou simplesmente: “Oxalá!”

Essa intenção é de cunho humano e religioso. O momento em que indivíduos expressam palavras alvissareiras reforça o relacionamento pessoal, aguçando a vontade de mais viver; em seguida, agradece-se com fervor a quem deseja os bons presságios.

Queira Deus!

Está consolidado o uso desta pérola: a expressão árabe ‘wa xa illah’, em Árabe, em Português, oxalá (queira Deus!), que passou a ser usual entre nós. ‘Tomara, que Deus permita, assim seja, queira Deus’, seriam seus sinônimos mais chegados.

Podemos dizer que a expressão ‘amém’, muito usada no final de orações, como também no dia a dia ao agradecer a quem nos deseja bons resultados nos nossos empreendimentos, seja a expressão de outro idioma (Hebraico, via Latim) mais próxima do significado de ‘oxalá’.

Seria certo dizer que, diariamente, ‘Assim seja, Amém, Oxalá e/ou Queira Deus’ se alternem em nosso linguajar.

Dito isso, antes da apresentação de mais uma lista de palavras de origem árabe, lembremos que Jesus, o Mestre, o Grande Psicólogo Universal, com a incumbência de mostrar à grande parte da Humanidade preceitos religiosos, adotados pela maioria cristã que segue a Igreja Apostólica Romana, a Ortodoxa Grega e tantas outras, usou em Seus contatos com o povo da Sua época, não o Árabe, mas o Aramaico, como narra a História.

Um bom dicionário define o Aramaico com estes termos: “Relativo ou pertencente aos arameus ou à sua língua. (…) Língua dos arameus ou grupo de dialetos semíticos, dela derivados, que a partir de 1000 a. C. suplantaram as línguas mais antigas da Babilônia, Assíria, Síria e Palestina. Um desses dialetos era a língua falada no tempo de Cristo, neste último país”. In Michaelis 2000, vol. 1, ed. Melhoramentos.

Certamente, Cristo se utilizou desse idioma, na região da Palestina, para transmitir Suas profundas, bonitas e didáticas parábolas.

Neste comentário, são menos palavras, mas o objetivo está cumprido: o realce à importância do Árabe e a amostragem de muitas de suas palavras, hoje, integradas ao nosso idioma. Outras há.

Chafariz, a bica pública, cujo H2O seria de boa qualidade, motivo do comparecimento de muitos com sua latinha para ter em casa o precioso líquido. ‘Construção de alvenaria provida de uma ou mais bicas, por onde corre água potável’, diz uma obra. Em Árabe, significa ‘cisterna’.

Cifra, ‘zero’. Pelo Latim tardio, cifra. Montante, valor total, de uma coisa: as cifras roubadas do Erário chegam a milhões, e os larápios riem dizendo que nada fizeram, que tudo foi legal, que estariam prestando serviço ao povo. Como isso dói! Esses ladravazes, que se dizem ‘lídimos representantes populares’, são lobos-maus vestidos de cordeiros, lesando a saúde, a educação, a segurança. Com dinheiro alheio, ostentavam-se, e o pior é que alguns os tenham reverenciado. Dói mais ainda. A Lava a Jato, pelo volume de dinheiro apreendido, faz-nos crer que cifras napoleônicas, épicas, valores de navios afundados abarrotados de ouro e prata, serviram para banquetes nababescos, cena cinematográfica inacreditável.

Somos induzidos ao ‘erro’ de votar ‘certo’ pela excessiva propaganda eleitoral, que seria enganosa, e propaganda enganosa é crime. Isso é verdade, companheiro?

Enxaqueca, dor insistente, rotineira, considerada ‘dorzinha chata’. ‘Afecção caracterizada por crises repetidas de cefaleia que só atingem um lado da cabeça, geralmente acompanhadas de mal-estar, distúrbios oculares e náuseas’, ótima definição de outro dicionário. Será que atinge um indivíduo do lado direito e outro, do esquerdo? A enxaqueca, famosa cefaleia em termo técnico, por atingir apenas um lado do crânio, tem sinônimos pouco usuais: hemialgia (‘metade da dor’) e hemicrania (‘metade do crânio’). Algo interessante.

Espinafre, comida do Popeye! Por isso, chamem-no para nos dissecar essa planta hortícola, originária do Oriente. Tem folhas verde-escuras, sinuosas e comestíveis, cujas flores pequenas são esverdeadas. Sabor? Cada um diz que é isso ou aquilo.

Ginete, cavalo de boa raça, ligeiro, dócil e bem adestrado; um corcel. Por extensão, o bom montador de cavalgadura. O cavaleiro que monta bem. No nosso querido Nordeste, do vaqueiro nordestino, diferente do gaúcho, ginete é a sela rústica usada no campo.

Leiloeiro, organizador ou pregoeiro de leilões. Isso basta.

Refém, o que está sub judice de um malfeitor, que nos rouba a tranquilidade, o direito de ir e vir, que nos tira o que foi adquirido com suor e muita criatividade. O dicionário diz que refém é prisioneiro, o sequestrado…

Sicrano, o fulano, momento em que pode alternar-se mais um vocábulo sinonímico: beltrano. Pela ordem, beltrano, fulano, sicrano. Eta nós! Tudo isso para camuflar o nome de quem é vítima das más-línguas.

Tâmara, a castanha sagrada do deserto, fruto da reinante tamareira, palmeira originária da África e do Oriente Médio, que seria abundante no Saara. Hoje, cultivada em vários países pela sua beleza e pelo seu fruto nutritivo-dietético. Essa palavra bonita se tornou antropônimo feminino, isto é, um nome dado à menina. Em meu tempo de colégio, tínhamos uma colega chamada Tâmara, muito bonita, mas pouco chegada a falar com os mais feiinhos. Vemos, nos dias atuais, a grafia e pronúncia ‘tamara‘, como palavra paroxítona. A grafia original, de fato, é sem acento gráfico, mas a nossa, por questão gramatical, recebeu o acento circunflexo, e a ortoépia, que trata da pronúncia das palavras, diz que ‘tâmara’ é palavra proparoxítona.

Tambor, instrumento musical que consiste em uma armação, geralmente, cilíndrica. Por extensão, espécie de tonel, peça cilíndrica do revólver etc. Curioso registrar o que diz a filologia sobre a origem dessa palavra árabe: nossa grafia nasceu de attanbur, a grafia do Árabe.

Tarefa, um eito, um trabalho a cumprir, o dever escolar, e lá se vão outros significados. “Estou atarefado”, diria o cidadão com pressa. A pressa pouco nos conduz bem e pode deixar-nos atônitos. Por isso, nosso estresse moderno, que se tornou marca d’água do viver que nos pode render dissabores ou doenças graves.

Zero, número cardinal, do Árabe sifr (vazio). Sabemos da ironia ‘um zero à esquerda’, para dizer que nada vale. Zero expressa quantidade ou valor numérico nulo. O nada, o inútil, o sem-valor.

Esfiha (ainda não aportuguesada; pronúncia aproximada ‘esfirra’, e, possivelmente, seria essa a grafia adequada em Português), espécie de torta assada, fechada ou aberta. Há outros detalhes, com vários tipos.

Outras palavras arábicas: alcaide, alcaguete (nosso ‘caguete‘), álcool, alfinete, alforria, aljôfar, aljofre, almofariz.

Volte depois para mais um diálogo com este escrevente.

João Carlos de Oliveira

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