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Adequado, inadequado: o que esses adjetivos nos ‘dizem’? Sua semântica transcende nosso olhar?

A adjetivação, rica e salutar, é sempre bem-vinda; saber usá-la enriquece o texto, quaisquer que sejam suas tipificações, momento em que é instrutiva.

A descrição, por si mesma, precisa de adjetivos que a embelezem, qualificação típica que é de texto descritivo: a poesia, a metalinguagem, o uso das cores para torná-la mais harmoniosa e coerente.

A descrição agradável de um ambiente ou pessoa chega à estupenda sinestesia: a visão multicor se destaca, verdadeiro arco-íris poético-literário.

Até esse momento, vê-se (como) ‘adequado’ saber inserir um adjetivo no momento certo, na frase bela, na linguagem culta ou cotidiana, e se tem uma redação de encher os olhos, senão, de deixar o coração ofegante de tanta magnitude pulcra.

Um de nossos maiores talentos nessa arte, entre tantos, foi nosso humilde Bandeira, que soube descrever com maestria o lugar em que se dava um fato, a personagem que precisava ser destacada: “Vou-me embora pra Pasárgada/ Lá sou amigo do rei/ Lá tenho a mulher que eu quero/ Na cama que escolherei/ Vou-me embora pra Pasárgada”. “É noite. A Lua, ardente e terna,/ Verte na solidão sombria/ A sua imensa, a sua eterna/ Melancolia…”

Outro baluarte dessa arte (rimando, é claro!) foi a simpática luso-brasileira a carioca Cecília Meireles. Lê-la, com sábia leitura ou com a visão voltada para a imagem cotidiana, é sempre comovente: “Leve é o pássaro:/ e a sua sombra voante,/ mais leve./ E a cascata aérea/ de sua garganta,/ mais leve./ E o que lembra, ouvindo-se/ deslizar de seu canto,/ mais leve./ E o desejo rápido/ desse antigo instante,/ mais leve./ E a fuga invisível/ do amargo passante,/ mais leve.” In Leveza.

Um crédito ligeiro para o audaz Oswald de Andrade: “A escrava pegou a filhinha nascida/ Nas costas/ E se atirou no Parnaíba/ Para que a criança não fosse judiada”. In Medo da Senhora.

São muitos os nossos grandiosos poetas; mais um somente: Moraes, o Vinícius, por sua musicalidade em poesias e letras ‘dançantes’, como em A rosa de Hiroxima, que nos encanta. O mundo sabe de sua estonteante grandeza literária.

Após essa introdução, talvez, nem tanto interessante, o comentário de agora é analisar o que são esses dois adjetivos.

Adequado, tudo que está de acordo com o que pode ser dito, feito, usado etc.; apropriado, próprio, condizente, pertinente, compatível, conveniente. (Um terno bem caído é adequado para um momento solene.)

Inadequado, certamente, pela oposição do prefixo in, o oposto: o que não está de acordo com os ditames do que foi estabelecido em mútua ou plural assembleia de indivíduos conscientes e responsáveis; indevido, incompatível, não-pertinente, inconveniente, impróprio. (Uma roupa fina é inadequada para o tempo frio; uma roupa pesada, assim o é, para o tempo quente; miseravelmente, inadequada é nossa trágica e massificante política nacional.)

Basta para definir o que é adequado ou inadequado? Se o item for tomado em sentido amplo, se o tema envolve detalhes de uma verdadeira dissecação, parece que não! Se for tudo à base do simples, sem se dizer o porquê, o onde, o quando, o como, deve ser o suficiente, mas, como sabemos, pode ficar a eterna dúvida. Se não fica claro, por que se toma tal decisão?

Tudo o que é inadequado pode ser incômodo, delicado (indelicado), inoportuno, difícil, ruim, incorreto, descabido etc. (somente, para citar alguns dos sinônimos desse adjetivo tão múltiplo, que exige destreza no seu uso cotidiano). E seu antônimo não deixa passar batido, fato bem conhecido de quem nos visita neste momento.

Existe a prática inadequada de pessoas se apropriarem de bens que não lhes pertencem. Há algo pior nesse aspecto?, e muitas exercem funções públicas.

Toda essa análise se intumesce de impaciência com a nova ‘técnica’ de se corrigirem redações escolares, criada ou normatizada há pouco, segundo o que se comenta sobre Educação, apenas com a qualificação adequado, inadequado.

Resolveria a falha na nossa tradicional e capenga educação escolar? Nossa linguagem já sofre demais! Assim, seria encaminhada ao lugar certo?

Em se tratando de validação de texto em concurso público, como não há contato físico com o candidato, poderia ser, a não ser que uma revisão oficial, por via jurídica, seja exigida.

Não precisa o mestre fazer cara feia ou esboçar trejeito de senador romano enfurecido pelo fato de o aluno ter produzido incompatível texto com o tema, além de ter redigido em linguagem de má qualidade. O mestre vem com um sorriso, ou mesmo sério, mas sem ferir, e vai dizer e anotar os empecilhos.

Deve ser assim.

Esse é o processo didático-pedagógico, que não constrange nem fere. O jovem precisa ser bem orientado, com calma e educação peculiares ao bom mediador, essa a postura docente em sala de aula.

Há alunos de curso superior que não escrevem sob o prisma do padrão culto. Por um texto, tomei conhecimento de cursistas de Letras que desconhecem até regência verbal; lendo um livro famoso, de escritor notório, nota-se que o verbo ‘implicar’ foi tomado, na linguagem culta, como transitivo indireto (pelo uso da preposição em; inadequada e desnecessária); implicar é transitivo direto. (Sua ausência implica sua culpa.) E se seguem outros casos.

O aluno, em especial do segundo grau, precisa ter claro esclarecimento do mestre de Língua Portuguesa dos itens em que não vai bem; da ortografia, da regência, da concordância, de toda uma teoria e prática que o façam melhor naquilo que escreve.

Tive enorme dificuldade em dissecar para uma boa aluna (em outros momentos e aspectos) de um erro que a atormentava: confundia ‘lhe dar’ com ‘lidar’, e no lugar de um usava o outro, sempre.

Escrevia algo parecido: “Comecei lhe dar com todo tipo de gente”, quando queria dizer “Comecei a lidar com pessoas diversas, de mau e bom comportamento”. E se fosse para dizer “Comecei a lhe dar as primeiras informações”, a redação lhe pareceria estranha. Os itens inteiros não cabem neste espaço.

É preciso que o mestre mostre a seu pimpolho (com paciência, educação e simpatia) os passos para uma boa escrita. A grafia muçarela até o momento não está bem divulgada; a pronúncia estupro ainda não está totalmente socializada; a concordância ‘nós somos um povo rico‘ ainda não é bem vista; o uso de ‘mal‘ e ‘mau‘ (mau hábito, mal súbito; mau companheiro, mau amigo; as más línguas; os maus-tratos), e tantos outros derivados e próximos ainda causam transtornos, têm momentos de eterna dúvida.

Adequado, com parabéns, mostrando-lhe os pontos positivos. Inadequado, com firmeza, mostrando-lhe o que faltou, sem magoar. Assim, certamente, haverá nova ‘aula’ ministrada na redação corrigida; o puro e simples adjetivo, de um lado ou de outro, não diz nada nem serve para juntar as pontas de linhas que se perderam no novelo embaraçado.

Este o pensamento deste blogueiro, que vê o nosso idioma como Unidade Nacional, assim dizem os compêndios, e sua estrutura deve ser respeitada e seguida.

 

 

João Carlos de Oliveira

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