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“Você vai sair?” “Runrum”. “E você também?” “Tuntum” (Esses alguns ‘códigos’ da linguagem oral)

‘Runrum’ pode ter como variante ‘ranram’ (‘anram’?) para dizer sim. Existe um runrum, que seria zunzum, para representar a onomatopeia da abelha, ou sinônimo de mexerico.

‘Tuntum’ tem como sintonia o não, e não se trata da onomatopeia para indicar barulho, estrépito ou o que se lhe pareça. Curioso que existe no Maranhão uma cidade com o nome Tuntum, cujo habitante é o tuntuense (tuntunense?). Por que lhe deram esse ‘apelido’?

No campo da linguagem onomatopaica, “fácil é falar; difícil é escrever”. Alguns iriam preferir a grafia com H, como ‘Hein, você vai?’ Mas lembremos que H com som de R é próprio do Inglês: ‘Hah, ha, ha… That’s a very funny joke’. Em tradução livre: ‘Ra, ra, ra… Esta é uma piada muito engraçada’.

Assim somos no dia a dia quando usamos nossa oralidade, espontânea e fantástica, que, além de onomatopeias, atitudes gestuais (‘dar de ombro’) e outros requisitos dos quais o falante faz uso para se comunicar, tem palavras ‘inventadas’, os neologismos populares. ‘Fez créu, e engoliu tudo!’

‘Fazer beicinho’ para dizer não ou sim também vale.

São inúmeros os recursos orais e gestos, com o bambolear do corpo, meios os quais ‘alimentam’ nossa fala, que varia de pessoa para pessoa, de região para região, estendendo-se de Norte a Sul nesses vários Brasis, a depender também do nível cultural e da necessidade de cada um; do momento até.

O companheiro está distante do outro, e gritar não seria atitude educativa. Faz um gesto, então, com a mão no pavilhão auricular, que quer telefonar, e fica dado o recado. O outro quer dizer que fulano surrupiou algo e faz o conhecido gestual de uma mão côncava ‘rapando’ a outra. E seguem-se os rituais comunicativos.

Alguém perto do outro faz esses gestos, insinuando que sicrano afanou um objeto, que fulano quer falar algo; a fala e o gestual, ao mesmo tempo, fazem com que a ‘qualidade da improvisação’ se perca, com a possibilidade de ser um ato incomodativo, sem graça.

Ou um modo ou outro.

Ou se fala ou se faz a devida gesticulação para que a linguagem cumpra sua missão de comunicar, de dizer algo que o outro interprete como legítimo.

Nosso cotidiano tem interjeições, onomatopeias, até aliterações, das mais variadas formas, para dar um recado.

Essas tentativas de escrita do título são algumas delas. E por que não usar o H no lugar do R?

‘Hum’, no momento em que se saboreia um petisco, indica um sim forte, que o produto tem sabor e qualidade. Por isso, ‘hum-hum’ fica diferente de ‘rum-rum’ (runrum), e crianças são magistrais nesse recado, tão pensativas estão e não querem falar, balançando ainda a cabeça como recado de que aceitam ou confirmam o que dizem ou lhe perguntam.

Em outro momento, a fala é ‘muda’, e, para uma resposta óbvia, o tom do murmúrio é outro: ‘tum-tum’ (tuntum) para dizer não.

Na família, a menina Dodó (Isadora) adora esse recurso da comunicação: rum-rum (quando confirma que sim), acompanhado de um sorriso; e tum-tum (quando não confirma), e o semblante fechado, fazendo menesgueio gestual para reafirmar o não. E se a pergunta for repetida, a zanga vem de imediato, falando alto: “Já falei que não!” (“Num já disse que não quero!”)

‘Runrum’, quanto à grafia, assemelha-se ao ronrom do gato que dorme ou recebe carinhos. Ele ronrona quando se sente ‘confortável’.

‘Tintim’, aquela onomatopeia que indicaria detalhes de um fato.

‘Dindim’, da moeda que cai, ou quer dizer dinheiro, linguagem infantil bem usual. ‘Não tenho nenhum dindim nem para comprar um sonho’ (o docinho recheado com goiabada).

Todos os chilreios ou chilreares das aves são onomatopeias, cujos termos ou verbos são chamados ‘as vozes dos animais’. A onça-parda ou suçuarana que rosna no Cerrado marcando espaço ou chamando o parceiro para o encontro amoroso (quando está no cio). O cio é da fêmea somente, e o macho só copula se houver esse pré-requisito.

Mu da vaca que berra, mesmo que mu seja sinônimo de mulo, ou burro.

E temos as conhecidas grafias: bem-te-vi, tique-taque, toque-toque (a chamada da campainha, que confundem com companhia, ou escrevem errado, ‘campanhia’), chuá-chuá (chuva que cai), au-au (do cachorro, ou o próprio, tão usado por crianças), gluglu (do peru, ou água no gargalo da garrafa), fiu-fiu (assobio, assovio), dindom (campainha), fonfom (buzina) etc. Muito interessante ‘relincho’ (relinchar) para indicar a voz do cavalo.

Curiosa é a tirinha que indica o flato (flatulência ou peido), ou quando alguém quer dizer que o outro fez isso (pum!); outras existem, e cada uma com seu devido destaque.

Hei, você aí! Para onde pensa que vai agora?

Se alguém não sabe o que dizer, fala o óbvio: Que Sol quente! (quando o Sol a pino estorrica). Ou esturrica.

Que mulher bonita! (se a mulher de fato é bonita, e as morenas também, não somente as loiras de olhos azuis).

Como é alto este pico!, se está diante do Everest (aliás, por que tanto lixo nesse local e por que tantos alpinistas têm morrido lá?).

A linha gestual, que substitui a fala no momento certo, é boa; fora isso, pode não servir ou ter fim escuso. Se não é, mas beira a onomatopeia, a aliteração; nesse momento, o laconismo, no lugar de ser incômodo, é comunicativo e eficiente.

A menor forma do famigerado verbo ser (é), lacônica por si só, serve para o sim e para o não.

Você mora nesta casa? É.

Ele é não é seu pai, é? Não. Meu padastro.

Você não trabalha nesta loja, trabalha? É, não trabalho.

É possível ir com você? É, mas não quero.

Fulano é cheio de mimimi, isto é, não-me-toques, cheio de melindres. Próprio do dengoso, do enfarruscado por qualquer bobagem.

O gauchês: trilegal, tchê.

O mineirês adora uai, miudim. O baianês, supimpa, e outros.

O carioquês tem os seus, que você pode relacionar.

Para terminar, como se diz ‘colocar fogo’? As respostas variam conforme o momento, a necessidade e o nível cultural do usuário. Atear fogo, botar fogo (tão popular), tocar fogo (rural?), tacar fogo (desabafo).

Se alguém tem um ponto de vista, e se o outro discorda, diz-se que esse modo é unívoco, isto é, tem apenas uma via, com a qual tem-se que concordar. E pronto. Fulano, um dia, deixará este mundo. Alguém vai contestar? Papo unívoco.

‘Meter a faca’ (o figurado ‘cobrar a mais indevidamente’) não é o mesmo que ‘esfaquear’ (furar com faca, tentativa de homicídio doloso).

Um abraço.

João Carlos de Oliveira

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