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‘Inho’, além de sufixo nominal, teria outras funções? Certo é que seu aspecto semântico atinge boa profundidade

Com trânsito livre na linguagem popular, que tem vertente com muitas faces e sabores, ‘inho‘, vindo do Latim inu, não indica somente aspectos de tamanho menor ou reduzido. Assim como a rosa não é somente ‘rosa’, há a vermelha, a branca, e dizem que existe até uma rosa negra, esse sufixo nominal formador de diminutivos varia como a fala ganha novas nuances. Ou varia com a linguagem do dia a dia, que tem suas tendências e raízes regionais.

O brasileirismo flui com(o) a água do corguinho ao pé da serra! (Correguinho ou corguete, um riacho.)

Inho‘ tem, ainda, variantes sufixais: torna-se ‘im‘ quando se usa bonitim no lugar de bonitinho, e ‘ino‘ quando se usa pequenino no lugar de pequeninho ou pequenininho. Caixotim, palanquim, tamborim. Um bolo fresquim, disse a mineirinha.

Ouça-se o canto diverso dos pássaros, e ouviremos a fala diversificada das pessoas.

Eta menininho bonitim! O filhote de porco já está fortim! O pequenino é um anjo do céu!

Esse o intuito de hoje: mostrar as facetas do ‘inho‘, que faz do nosso linguajar um turbilhão de falares, podcast moderno que nos envolve.

Inho‘ também sofre a consequência da escolha. O Português maior, que seria o erudito, não o prefere, e no seu lugar expõe ‘ulo‘, que varia conforme a palavra. O cara mora num cubículo.

Como exemplos, que estão no dicionário e na gramática, citem-se estes: no lugar de abelhinha, apícula (será que o popular aceitaria essa variante ou a entenderia de forma tão fácil?); no lugar de celazinha, célula. Corpinho, que tem ainda corpete (embora a semântica mude), passa a ser corpúsculo; folhinha, folícula; globinho, glóbulo; gotinha, gotícula; homenzinho, homúnculo; nozinho, nódulo; obrinha, opúsculo; ovinho, óvulo; partinha, partícula; pelinha, película.

Em texto de linguagem clássica, dizer que um pigmeu seria um homúnculo, poderá ser aceitável, mais ou menos como caracterizar um dos Sete Anões, mas no dia a dia falar para um pequeno homem, o chamado baixinho (1,50 m de estatura), que ele seria um homúnculo fica um pouco estranho. Esses termos, chamados diminutivos sintéticos eruditos, estão nos anais da História do idioma, mas não seriam de fácil uso, a não ser alguns que já se tornaram tradicionais, mesmo que mudem o significado ou se tenham tornado substantivos.

Vamos assistir a uma película? Os nódulos no seio podem indicar câncer. O ar está cheio de partículas.

Inho pode ser o apelido carinhoso do menino no seio familiar. Oh! Inho, venha cá. Sua mãe lhe trouxe o presente que você queria!

Nesse caso, o lado afetivo toma espaço e se fala com certa naturalidade.

Em família, a frase Neguinha acabou de chegar indica um membro da casa fazendo visita ou vindo de viagem.

Esse jovem é um rapazinho simpático. (O rapazote seria aquele corpulento, ressalvada a preferência regional.)

A criança nasceu franzina, mas já está bem grandinha! Que beleza!

O básico torna-se basiquinho, indicando o estilo de roupa na vida moderna.

Ela tem um seio lindo, desse tamaninho, parecendo um limão-mirim!

O Bom Velhinho, no Natal, sempre aparece para alegrar as crianças!

Neguinho da Beija-Flor de Nilópolis é um grande cantor!

Inho tem tantos lados semânticos, que podem ser desconhecidos de alguns: “Tenho no aquário vários barrigudinhos, lindos como eles mesmos!” (Talvez, não seja do conhecimento de muitos que ‘barrigudinho’ é uma espécie píscea.)

No entanto, o lado afetivo pode tornar-se pejorativo, ou irônico, que seria linguagem condenada e condenável na vida hodierna. A peça teatral Bonitinha mas ordinária, de um dos nossos maiores dramaturgos, Nelson Rodrigues, teria, hoje, uma versão crítica e analítica diferente?!

Inho pejorativo ganha espaço quando se quer pichar alguém.

“Esse cara não vale nada! Professorzinho, que só prejudica os alunos” (sic), teria dito seu inimigo.

Semelhante ao inho que ofende, temos eco, quando se usa “Ouvi dizer que naquela paróquia há um padreco que gosta de atacar as fiéis”, frase da historiografia regional do País. Padreco e padrezinho se situam no mesmo patamar.

Confirmando esses aspectos semânticos, sabe-se que diminutivos em certos contextos podem adquirir valores especiais. Assim como gentalha (aumentativo) é usado para designar ‘gente ruim’, livreco, jornaleco e padreco, como medicastro, são pejorativos. A agradável contrapartida é que amoreco, como amorzinho, não é amor pequeno nem pejorativo, mas ‘grandão’, o grande amor da vida de alguém. A mãezinha querida é a mais abençoada da face da Terra. “O filhinho querido da mamãezinha nasceu e coube numa caixinha; hoje, tem um 1, 80 de altura”, disse a mãezona emocionada.

Na poesia, ‘inho‘ tem uso salutar e dinâmico.

Em O Menino Maluquinho, história emocionante, obra-prima de Ziraldo, o adjetivo, no diminutivo, não pode ser tomado ao pé da letra.

Menininho se torna o inocente, mas querido. O primogênito, mesmo adulto, é o filhinho da mamãe, não no sentido de dizer aquele que nada faz, um NEM-NEM da vida.

A menininha inocente da Ribeira é a adolescente linda, como a flor de bonina que desponta na várzea e atrai abelhinhas aplicadas em busca de néctar.

Na minha, e nossa, querida Cachoeira Grande, distrito de Jacobina, Bahia, reside o conhecido Einho, nascido e criado ali, morador com seus 70 e tantos anos e mais um bocado de dias vividos com inteligência, trabalho e simpatia. De onde veio o nome, esse hipocorístico (apelido familiar carinhoso)? Quem sabe da expressão ‘É, Inho!? Você quer um pedaço de cuscuz?’ Já era Inho e se tornou Einho.

Inho ou inha, ambos indicam afeto. O Brasil tem O Poetinha, nosso talentoso Vinicius de Moraes (Marcus Vinicius da Cruz de Mello Moraes, nome completo), cuja musicalidade assombra, cujos versos metaforizam o mundo que nos envolve. Registrou: “De repente do riso fez-se o pranto” (…), in Soneto de separação.

O cotidiano nos dá ‘O trenzinho da alegria acabou de passar’; ‘Vou ao supermercado comprar um escondidinho’; ‘O socozinho-boi engoliu uma piaba-cachorro’.

‘Na bica, corre uma aguinha fresca’; ‘A morena usa uma calcinha transparente’; ‘Falou isso de mentirinha, mas foi punido’.

As famílias têm as Aninhas, ou Anninhas, e uma delas, que conheço, aos 15 anos, já tem 1,80 de envergadura. Nininho, Ninha e outros singram os mares da conversa familiar, e ninguém se importa com alguma discriminação, que não existe nesse caso. Neguinha, Pretinha. Coisinha da mamãe; lindo! Como é gostoso o arroz soltinho!

O shortinho apertado insinua beleza. A cidadezinha perdida no tempo, tão pacata, que a rua não tem uma vivalma!

A Igrejinha foi tombada como bem do Patrimônio Histórico.

Mas existem a atrevidinha, indesejada e penetra, e a safadinha que vive na mutreta, tentando enganar a todos.

Para fechar o de hoje, um pensamento famoso do eminente Abraham Linconl, ativista americano, que se tornou Presidente dos Ianques.

“Você pode enganar uma pessoa por muito tempo; algumas por algum tempo; mas não consegue enganar todas por todo o tempo” (em tradução livre).

Serve para qualificar inescrupulosos, que, ainda assim, se destacam na sociedade; mas se ‘tudo que sobe um dia cai’, vem a fase do descambo, e a fama vai morar nas grades podres do xilindró. O famoso entra na bancarrota, de nada adiantou tanta riqueza e notoriedade. Melhor ter vivido no seu ‘cantim’ sossegado.

Abraços.

João Carlos de Oliveira

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