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A provinha, ela provinha: são homônimos perfeitos. Por que eles acontecem, às vezes, sem percebermos?

A provinha foi fácil. Não foi uma ‘prova’, mas uma provinha.

Ela provinha de família humilde. Toda a sua riqueza provinha de recursos adquiridos por meios ilícitos.

A Língua Portuguesa apresenta tantas flexões envolvendo os seis tipos de palavras variáveis, que casos assim não seriam tão perceptíveis.

Os homônimos, na sofrida Língua Portuguesa, são variados e, de minuto a minuto, pintam em nossa frente inesperadamente. É preciso que paremos para analisá-los e vermos que circulam em todos os níveis da linguagem.

O exemplo acima seria curioso por este motivo: a primeira palavra é o diminutivo sintético (pelo uso do sufixo –inho, no feminino) do substantivo prova, e a segunda, a forma verbal, na primeira e terceira pessoas do singular no pretérito imperfeito do indicativo, do verbo provir, que não seria tão usual ou conhecido, pelo menos na linguagem coloquial.

Como nos ensina a Gramática Normativa, os homônimos se caracterizam em três tipos:

Homônimos perfeitos (que seriam os mais fáceis de serem entendidos) têm grafia e pronúncia iguais e significado próprio.

Ela não saiu do coma. Coma bem, meu filho. Eu como pouco. Não sei como ele vai chegar aqui. O amo tratou mal o empregado. Eu amo a Natureza. O acesso à casa foi proibido. Eu acesso a Internet para ler bons textos. O morro está tomado pela pilantragem. Eu morro de paixão por uma piabinha frita com farinha de mandioca e rapadura. A venda está aberta. Espero que ele venda tudo. O cravo furou o pé da criança. Há músicos que tocam muito bem o cravo. Não se deve fiar em todo mundo. Começou a fiar a linha e se perdeu.

Opinião com a qual se pode discordar: mal e mau, na linguagem coloquial, podem ser tachados como dois homônimos em virtude de serem usados com a mesma pronúncia, embora cada qual com seu significado e grafia diferente. Ele está mal. Ele é mau com seu filho (espanca-o por motivo à-toa). Ele é mal-educado. Ela gosta de um mau bocado. A mulher sofreu um mal súbito. Ele adora ter um mau olhado com a vizinha.

Homônimos homógrafos: têm mesma grafia e prosódia diferente (pronúncia aberta e fechada), com significado próprio.

Eu governo meu próprio caminho. O governo tem sido criticado. Ele é um bom menino. O ele maiúsculo tem formas diversificadas. O acordo contra o efeito-estufa está incompleto. Eu acordo ora cedo, ora tarde.

Homônimos homófonos: têm mesma pronúncia, grafia diferente e significado próprio. Esse seria o grupo mais difícil.

Caçar (apanhar, pegar) e cassar (anular). Espiar (Ela espia o que não é de sua conta) e expiar (O pecador expia as culpas no Purgatório). (Mercedes é espiã, e seu marido, o espião mais famoso. O bode-expiatório paga culpa pelo que não fez.)

Acender, ascender; espectador, expectador; esterno, externo; sela, cela; extrato, estrato; ás e az; cheque e xeque; tachar e taxar. (Um homem tachado de imprudente; o arroz foi taxado no ICMS a 20 por cento.) Arrochar, arroxar (roxear).

Censo e senso, conhecidos do dia a dia, mesmo assim podem aparecer com uso indevido. Nosso órgão supremo para analisar e medir a Economia e o número de habitantes, o IBGE, seria o setor que mais divulga a palavra censo, com todo o seu significado (aspecto que fica aqui sem resposta para que o leitor a identifique a seu modo). Essa palavra tem conhecida família etimológica: censura, censurar, censurado, censor, censitário. Senso tem relação com sensação, sensual, sensitivo, sensor, sensível, sensibilidade etc.

Cozer (cozido, cozimento, cozinheiro, cozedura, cozinhar), coser (cosido, cosedura). Os derivados de coser seriam poucos, verbo que pode ser sinônimo de costurar, de que formamos boa relação de palavras, inclusive com significado figurado (costura, costurar, costurado), entendendo que cada construção frasal tem sua nuança.

Compare cosedura com cozedura. O crime organizado faz verdadeira cosedura de situações para confundir a Justiça. A carne colocada no feijão já está num bom nível de cozedura. A cosedura de todos os vestidos não ficou boa. A cozedura do carvão está no ponto ideal.

Podemos errar a grafia de uma palavra, mas, se compararmos outros termos com sua ‘família’, chegamos a uma conclusão e evitamos o engano. Se confundirmos a grafia de excesso com a de  exceção, podemos ver que de exceder temos excesso, excessivo, excessivamente, e de exceto, como fica claro, excetuar, excetuado, exceção.

Pode-se admitir que as definições, ensinadas pela norma culta, não teriam aprendizagem imediata, embora possamos entender cada caso pela grafia, que é a sua aparência; pela pronúncia e pelo significado, o que se pode levar em conta para uma boa distinção, esses os três aspectos que fazem um vocábulo ser diferente do outro, fato que devemos distinguir, a menos que queiramos errar mais.

Provinha, como forma verbal, vem do verbo provir. Podemos analisar um pouco este trio: provar, prover e provir, destacando as três conjugações verbais.

Provar, do Latim probare, é verbo regular. Eu provo, tu provas, ele prova, nós provamos, vós provais, eles provam. A partir desse tempo, pode ser conjugado sem possibilidade de erro em todos os outros. Se alguém já aprendeu a conjugar o verbo amar, saberá conjugar provar.

Prova (do Latim proba) e provar estão juntos nos diversos níveis da linguagem. O Direito, por sua razão e função de punir ou libertar, usa o termo prova com muitos significados. Da sua família, temos provado, probatório, provação, provável, improvável etc.

Prover, do Latim providere (tomar providência, abastecer), é um verbo irregular, que tem como modelo de conjugação, em parte, o verbo ver. Eu vejo, eu provejo. Tu vês, tu provês. Se ele visse o caso, teria outra opinião. Se ele provesse a dispensa, teria boa reserva para a época de escassez.

Comparados entre si, ver e prover têm semelhança. Eu vi, eu provi; tu viste, tu proveste. Se ele vir o homem que assaltou o dono da loja, avise-nos (pede a PM), como ficam diferentes no pretérito imperfeito do subjuntivo: se ele visse, se ele provesse; se nós víssemos, se nós provêssemos; se eles vissem, se eles provessem.

Provir é inteiramente conjugado como vir: eu venho, eu provenho. Eu vim, eu provim. Eu vinha, ele vinha; eu provinha, ele provinha.

Agora, curta melhor provinha, a forma verbal, comparada ao diminutivo provinha, de prova.

Eu provinha, tu provinhas, ele provinha, nós provínhamos, vós provínheis, eles provinham. Pretérito imperfeito do indicativo.

Eu vim, eu provim. Tu vieste, tu provieste. Ele veio, ele proveio. Nós viemos, nós proviemos. Vós viestes, vós proviestes. Eles vieram, eles provieram. Pretérito perfeito do indicativo.

Obrigado pela visita.

 

 

 

João Carlos de Oliveira

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