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Qual seria o aspecto mais importante de uma palavra? A escrita, a pronúncia ou o significado?

Qualquer que seja a resposta, todos são de relevante importância, mas devemos ter muito cuidado com o ‘sentido’ que queremos dar a uma palavra no contexto. Todas elas têm esses três ‘panoramas’, embora, comumente, não se discuta a escrita da palavra menino, mas de rescisão; a pronúncia de irmão, mas a de inexorável, nem o significado de ontem, mas de morte. Por aí.

Seria bom que olhássemos estes dois momentos: ‘significado’ é o registro do vocábulo no dicionário, contemplando, em primeiro plano, o aspecto denotativo (uso natural do termo) e, em seguida, ficarmos bem atentos ao conotativo, o figurado, metafórico, o que quisermos dar a uma palavra. Muitas vezes, o uso regional seria diferente do comum, o que nos leva a entender possível outra significação, e sabermos respeitar o que existe nesse caso em todo o Brasil, sem chacota ou sem dizer ‘O povo aqui fala muito errado’, ‘O povo aqui fala diferente’, justamente por que a individualidade é bem-vinda, e não devemos querer que todos usem o mesmo tipo de linguagem. Do individual chegamos a uma diversificação esplendorosa, e é essa nuance que enriquece os nossos falares.

A escrita, como registra o léxico, deve ser única: mesa, maisena, paralisia, exceção, excesso, reivindicar, ressurreição, ressuscitar, salvos os casos da variante gráfica: assobio, assovio; cota, quota; bêbedo, bêbado; bílis, bile; catorze, quatorze; coisa, cousa; cociente, quociente; cotidiano, quotidiano; infarto, enfarte, enfarto; loirado, lourado; percentagem, porcentagem; relampejo, relampeio etc., vocábulos chamados por alguns gramáticos de ‘oscilação de grafia’ (palavras há que admitem mais de uma grafia correta), e existem milhares delas.

Este exemplo não é regional: in memória. Há uma mistura latina com portuguesa. Optemos por ‘em memória’, forma aportuguesada, ou usemos o latinismo em si: in memoriam. Duas grafias corretas, e uma inadequada. A primeira aparece muito em nota de luto.

A pronúncia, respeitada a Fonologia, também requer cuidados, mas o Regionalismo não seria para criticar e sim para analisar. Não devemos abominar a ‘linguagem oral’ de quem tem seu estilo e talvez não conheça as teorias gramaticais. Devemos, por outro lado, observar com muita acuidade a pronúncia culta que diz ‘tioria, catiguria, disconto, pirigo’, como muito se vê na oralidade de programas televisivos. Ruim seria pronunciar ‘adevogado, o ‘fluído do isqueiro’ (mas o ‘fluido’), ‘Nóbel’, ‘zenite’, ‘récorde’, ‘côndor’ etc. Considerada a prosódia, devemos dizer: cateter, condor, recém, sutil, ruim, ureter, hangar (oxítonas); avaro, clímax, decano, erudito, filantropo, fluido, gratuito, ibero, recorde, têxtil (paroxítonas); álibi, âmago, mano, etrodo, eope, ínterim, ômega, Niágara, nite, trânsfuga, misa, protipo (proparoxítonas).

Há, ainda, a oscilação de pronúncia, que é aceita: acróbata e acrobata; colmeia e colmeia (fechada e aberta, cuja diferença antes foi marcada pelo acento agudo na forma de som aberto; hoje, colmeia (sem acento agudo), mas pode haver duas pronúncias); lêvedo e levedo; hieróglifo e hieroglifo; projétil (plural: projéteis) ou projetil (plural: projetis); réptil (plural: répteis) ou reptil (plural: reptis); zângão (plural: zângãos) ou zangão (plural: zangões).

Atenção com a ortoépia ou ortoepia, que trata da verdadeira pronúncia de vogais fechadas ou abertas: fechar (fechada); obeso (fechada, por tradição; aberta, por opção ou Regionalismo); obsoleto (timbre fechado); alcova (fechado).

Há dúvidas nessa área: escoltar, verbo, com a vogal ‘o’ de timbre fechado, por isso, o substantivo, escolta, deve ter o mesmo timbre, fechado, mas não vemos essa pronúncia, que não é distinta, no dia a dia.

Sabemos que a forma verbal controle tem a vogal ‘o’ aberta, mas no substantivo controle é fechada.

A crosta do pão (crósta) ou a crosta do pão (crôsta)? A Gramática diz que é ‘crôsta’, sem o sinal gráfico (crosta).

Um jogo, dois jogos (fechado e aberto), mas dois ‘joguinhos’, que vem de jogos, deve ser aberto. Entretanto, muitos pronunciam dois ‘jôguinhos’, assim como fazem dois ‘ôssinhos’, e seriam dois ‘óssinhos’.

Os casos a serem mostrados nessa área são diversos, e ficam por conta de cada leitor, conforme sua região e costume.

Sobre a pergunta introdutória.

O mais importante da palavra é o significado, que deve ser levado em conta em todos os momentos, para que se evite a pejoração, a discriminação, a ofensa, a injúria etc., além de uma série de crimes que hoje vêm à tona no dia a dia, com relação a costumes e comportamento.

Casa é a moradia, o lar, mas a casa do botão, a casa comercial, a dona de casa, a casa bancária, a casa de espetáculos, o governo da casa, a casa de marimbondos, a casa de força, a casa de máquinas, a casa dos Bourbons, a casa dos nobres.

Se nos deixarem, vamos amanhecer o novo dia falando das várias acepções da palavra ‘casa’, que se torna polissêmica, além de outras que podemos inventar, como se pode dizer que toca é uma ‘casa de aconchego’, conforme o animal que nela reside.

Uma palavra é rica, e assim a podemos usar, sem desclassificar o sentido que alguém deu a ela em certo momento, por estilo de linguagem.

O cinema é arte, o cinema é a cinematografia, o cinema é a casa de espetáculos onde filmes são vistos.

Crie cinco frases com a palavra ‘céu’, e você verá a gama de sentidos.

Uma loja, uma tapera, um viveiro, um formigueiro (de gente?), um momento; dez horas e ‘dez minutinhos’, isso é diferente de ‘dez horas e dez minutos’?

Leve em consideração a gíria, reveja o significado de um termo no dicionário e o sentido dado a ele em uma região do País, de Norte a Sul, de Leste a Oeste. Leia um conto de Guimarães Rosa e o compare a um de Ariano Suassuna, como Jorge Amado diria o mesmo conteúdo com palavras típicas, e Monteiro Lobato definiu o homem ribeirinho de uma maneira, viu-o com esse ou aquele costume e usou termos em sentido especial. O Jeca-Tatu, apesar de o vermos como atoleimado, é um filósofo, com muitas sabedorias.

O sentido da vida; um homem sentido; o sentido que se dá a uma seta no espaço; preste ‘sentido’ ao que você diz; não guarde sentido de alguém que o tenha ofendido; o sentido com que uma mãe cuida de seu filho.

Para fechar, estude a Semântica, mesmo com frases simples: Ele morreu do coração; Maria não tem coração; O coração é órgão vital, assim como a Semiologia e a Semiótica nos ensinam muitos signos.

Abraços.

João Carlos de Oliveira

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