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Qual o plural que fica mais bonito: ético-disciplinares ou éticos-disciplinares? Bonito ou que soa melhor

O fundamento do comentário de hoje é que foi usada a segunda opção para comentar o comportamento discriminatório de uma advogada que, há poucos dias, soltou verdadeiros impropérios a ofender os nordestinos, um povo que tem seu valor material e imaterial na História desta Nação, como outros o têm.

Quanto à grafia, a defesa: o erro foi de digitação (para alguém justificar o engano gramatical cometido).

Advogada mineira ‘ataca’ os nordestinos com sua fala horripilante, a que se chamou de xenofobia ou fala xenofóbica.

Não é somente isso. Além de ser discriminação brutal, grosseira, a fala da advogada quer ostentar ‘diferenças’ sociais e econômicas (socioeconômicas) entre brasileiros, quando somos uma Pátria una. Essa não é a primeira vez. Noutro momento, veiculado por alguém, também incauto, já houve essa grosseria com o Nordeste. Esperamos que não venha a se tornar costumeira.

Se o Norte tem suas belezas (o rio Amazonas, a ilha de Marajó, o Mercado Ver-o-Peso etc.), o Nordeste também tem os seus atrativos: o rio São Francisco, que nasce mineiro, na Serra da Canastra, torna-se grandioso em todo o Nordeste, e chega a ser de fato majestoso em Sobradinho, na Barragem; adiante, vêm os cânions. Salvador tem suas peripécias, mas ostenta, talvez, como pensa este poeta, a capital mais cosmopolita do País, e lá se vão outras grandezas.

Se Santa Catarina tem a ponte Hercílio Luz, Salvador tem o Elevador Lacerda.

Se São Paulo tem o Brás, que também grafam o Braz, o mundo soteropolitano tem o Pelourinho, que ficou em virtude da Escravatura, mas se tornou Patrimônio Imaterial da Humanidade.

Se o Rio de Janeiro tem samba, a Bahia tem samba-de-roda, como tem o samba-de-roda do Recôncavo, sediado em grande escala na cidade de Cachoeira, que deu a Liberdade do Povo Baiano, razão de ter consolidado a Independência do Brasil.

Se Minas tem lindas cidades, senhora advogada, a Bahia tem Feira de Santana, a Princesa do Sertão, e Vitória da Conquista, no Oeste, exemplo grandioso de cultura e diversidade humana, industrial e agropecuária.

Se o Paraná tem as Cataratas do Iguaçu, Pernambuco tem a Veneza Brasileira, Recife, a cidade do frevo, como Olinda, formando um conjunto inigualável para toda a Nação.

O País só pode ser grande pela sua performance ‘continental’, não só por uma cidade, região ou conjunto arquitetônico ou universitário. Não se faz um povo por ter uma única qualidade. Isso seria como dizer que todos somos belos apenas por termos uma característica. O corpo é um conjunto, e vêm as morenas, as ruivas, e todos os genótipos que classificam o ser humano. A Antropologia refere-se a um todo, e não a uma única qualificação do ser humano.

A riqueza de um povo não se concentra em um único aspecto.

Minas Gerais tem suas qualidades intrínsecas, mas esses conjuntos não teriam valia se o Estado não estivesse em harmonia com outras regiões. Uma cidade, se tivesse apenas um tipo de habitação, seria o bonito monótono, podendo-se usar outro adjetivo.

Não vamos agora usar as mesmas ‘qualificações’ ditas por ela, para fazer o nosso contraditório, atacando-a, pois estaríamos usando termos vulgares ou chulos, ou puramente depreciativos, pejorativos, discriminatórios. Ela foi infeliz. Qual foi a razão lógica? Não somos ‘grandes’ isoladamente; um prédio fica imponente por estar ao lado de uma casa simples, que também é bela, mas se o mesmo prédio fica ao lado de outro que teria a mesma grandeza de forma bem clara, um dos dois perderia o charme, ou ambos.

As comparações poderiam ser muitas, como cada um tem sua forma de ver e de fazer sua defesa, e a senhora causídica deve ser punida pela Ordem com rigor, além de outras sanções virem por efeito-dominó. A sociedade sabe o que faz.

O singular de um não pode vencer o plural de todos!

Vamos à resposta do questionamento inicial sobre o plural do adjetivo composto ético-disciplinar. A Gramática Normativa determina que, nesse caso, só o último elemento flexiona, concordando em número e gênero com o termo ao qual se refere.

Ferrovia sino-soviética. Porto sino-soviético. Ferrovias sino-soviéticas. Portos sino-soviéticos.

Sanção ético-disciplinar. Sanções ético-disciplinares.

Comum sabermos que assim se flexionam os adjetivos compostos.

Campeonato sul-americano; campeonatos sul-americanos. Filme neo-realista, filmes neo-realistas (grafia antes da Reforma Ortográfica). Grafia atual: filme neorrealista, filmes neorrealistas. Acordo luso-brasileiro. Acordos luso-brasileiros. Deputado democrata-cristão. Deputados democrata-cristãos. Olho verde-claro, olhos verde-claros.

Surgem, como se deve pensar, as exceções.

Menino surdo-mudo. Menina surda-muda. Meninos surdos-mudos. Meninas surdas-mudas. (Ambos os elementos flexionam em gênero e número.)

Olho azul-celeste. Olhos azul-celeste. Calça verde-oliva. Calças verde-oliva. Lenço amarelo-limão. Lenços amarelo-limão. Tecido furta-cor. Tecidos furta-cor. Raio ultravioleta, raios ultravioleta.

O fato de ter sido usado o termo bonito é que alguns costumam tomar uma decisão, quanto à dúvida da flexão de um vocábulo, pela aparência da escrita ou pela pronúncia, e esta, sendo agradável, pode ser a razão para se escrever.

Bonito ou audível seria para dizer o que ‘soa’ melhor. Para uns, éticos-profissionais soa bem, melhor que a sonoridade de ético-profissionais, a aceita pela Gramática, em que um termo deixou um vazio: ficou no singular. E pode isso? (Pensaria ele.)

A Gramática não opta pelo aspecto ‘pessoal’, ou personalizado, de uma regra; o motivo é técnico, o morfológico, morfossintático, ou até histórico, com base na flexão lógica do termo.

Se se chegou a usar sanções éticas-disciplinares, as que seriam sancionáveis para a advogada, é que houve um lapso, por questão de hábito de usar o termo, ou por erro de digitação. O que relevamos.

Não vamos punir quem se esqueceu da regra gramatical, mas quem ofendeu a honra de pessoas, assim como ela não gostaria de ser ofendida. Ainda podemos analisar sua defesa: que sua fala não trata de discriminação, que não vê crime no que disse.

Que pena!

Eis o que hoje escrevemos, a contragosto, mas foi. Como nordestino, baiano e catingueiro, escritor e advogado, fiquei arretado com o que ela disse.

A propósito, adquira, junto à Editora Scortecci, minha mais recente publicação: Crônicas do vovô. Até a capa é magistral. Você não vai se arrepender. Trata-se de uma série de vinte crônicas atuais, narradas pelas crianças aos adultos, ou ditas pelos adultos às crianças. Seus filhos e/ou seus netos vão gostar. O que é felicidade? (Há uma resposta em suas páginas, que não se trata de conceito da Psicologia, mas é algo supimpa.)

Boa leitura.

E eu ‘vorto’ em breve.

 

 

 

João Carlos de Oliveira

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