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‘Enquanto’ pessoa, devo agir desta forma. ‘Enquanto’ professor, vou dar aulas do meu jeito. ‘Enquanto’ coordenadora, afirmo que a violência na escola deve ser vista sobre outro prisma

Que significado tem esse ‘enquanto‘ usado no dia a dia por muitos profissionais e pessoas do meio público?

Se olharmos a fala comum ou coloquial, enquanto nos conduz à semântica de ‘um instante, um momento’, o tempo curto entre um fato e outro.

Pedro, meu filho, ‘enquanto’ eu estou aqui, na casa de sua tia, vá comprar pão para tomarmos um café.

‘Enquanto’ ele trabalha, também canta.

A mulher lava roupa ‘enquanto’ sua filha brinca no quintal.

‘Enquanto’ cozinha, Dona Maria alinha uma blusa para costurá-la mais tarde.

Esses exemplos indicam que as frases cotidianas com o uso da conjunção subordinativa adverbial de tempo enquanto são bem simples, populares, sem rodeios ou alguma figura de linguagem (metáfora, metonímia etc.) que possa dificultar seu entendimento ou significado.

João, você vai viajar hoje?

Não. Por enquanto, eu fico aqui três dias para descansar mais.

Enquanto o poeta escreve seus versos, pensa na ex-namorada e no tempo em que tinha seus quinze anos e se sentia, embora um rapazola, pronto para se casar. Que coisa, hein?

O dicionário e a gramática não explicitam, literalmente, esse aspecto, mas ‘enquanto’ indica o tempo passageiro, fugaz, rápido, durante o período em que (isto é, enquanto) exercemos uma atividade paralela.

Enquanto dormimos, nós sonhamos.

Enquanto a jovem toma café, telefona para o namorado.

Enquanto toma banho, a menina canta sua música preferida.

Enquanto o avião decolava, caiu uma tempestade que assustou a todos, mas não houve nenhum fato negativo.

O bom sinônimo de enquanto seria o momento em que, durante o tempo em que, quando. Em muitos casos, no lugar de se usar enquanto cabe como, mas fica a cargo de cada um, a seu gosto e estilo, a escolha pelo vocábulo mais adequado.

Diríamos: Como professor, não aconselho você a trancar sua matrícula na Faculdade. A situação financeira agora pode não ir bem, mas amanhã pode ser pior. Segure o tranco até o tempo passar.

No lugar desse como, muitos usam enquanto.

Enquanto mulher, eu uso o sabonete íntimo dessa forma (e explica sem mostrar).

Mas alguém recentemente, o que nos motiva a escrever este comentário, disse ‘Enquanto pessoa, vou ficar no cargo por alguns dias’. Sim, a função política não é vitalícia, mas o ideal seria ‘Como político, fico no cargo por apenas o mandato de quatro anos’. O uso de ‘enquanto’ referindo-se a uma pessoa, ou a si mesmo(a), ensina que a ‘pessoa’ é passageira. Não o é; pessoa é pessoa, embora não seja imortal fisicamente; o cargo é que é passageiro.

Melhor, a nosso ver, que se diga ‘Enquanto presidente, busco o melhor que posso para o nosso País’.

Mostremos expressões com um e outro termos:

Como professor, fico no cargo de diretor até o final do ano.

Enquanto professor, estou no cargo de diretor até o final do ano.

Enquanto diretor (já que o cargo é passageiro), vou administrar esta Unidade com toda a atenção voltada aos alunos que mais precisam, além de minha obrigação comum.

Uma pessoa teria dito: “Enquanto mulher, faço isto” (e contou seus momentos, suas coisas, seus casos). Oxente! E ela vai mudar de ‘mulher’ para outra coisa? Nesse momento, é que o uso desse conectivo deixa uma vacância de significado.

Enquanto tomo o cafezinho, converso com o Diretor da Câmara, que está presente, e vou lhe fazer vários pedidos em prol do povo da cidade.

Para terminar, uma frase poética: Enquanto o homem sonha, o condor sobrevoa os Andes em busca de presas.

Frase popular: Enquanto chovia, ficamos debaixo da marquise (isto é, sob a marquise).

‘Enquanto’ pode ter o valor de contraste: Enquanto Pedro é simpático, Rita é o oposto.

Isso basta.

Mais uma vez, levantamos a questão: o que significa ‘fatal’?

No senso de todos nós, fatal é o que mata, como a droga é letal, como o veneno é muito letal, como um acidente pode ser fatal, matando alguma pessoa.

O normal é isso, em que fatal leva a um fato que tira a vida. Pois é, pois bem, pois, pois… por que alguns autores de artigos em sites tratando do trânsito, de acidentes, dizem ‘a vítima fatal é fulano’, ou que houve um acidente de automóvel, com morte, e que ‘Godofredo’ (nome fictício) é a vítima ‘fatal’. Se o acidente é que foi fatal, por que matou, como é que a vítima também é fatal?

Maneira imprópria de pensar: assim a vítima, já que foi fatal, foi ela que teria tirado a vida? De quem? Dela mesma?

O criminoso deu uma facada fatal e tirou a vida de seu oponente.

Conclusão rasa e simples: o acidente é fatal, não a vítima. Vítima de morte. Acidente com morte. Acidente fatal, que tirou a vida de cinco pessoas da mesma família.

Um dicionário diz sobre fatal: adj. 2 gên. Marcado pelo destino; inevitável, inexorável. Mortal, derradeiro, final: doença fatal, acidente fatal. Funesto, nocivo, letal: decisão final (o criminoso foi condenado à morte).

Se assim é, como a vítima pode ser fatal? O mau uso desse adjetivo tem grassado por aí, de modo que alguns já consideram correta essa aplicabilidade. Isso não.

Abraços.

 

João Carlos de Oliveira

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