0

Paralimpíada ou paraolimpíada? Por quê? E o que é ‘para’?

Esse processo de criação de palavras já existe na Língua Portuguesa. Se juntarmos dois elementos sem alterá-los, temos a Justaposição. Se houver alteração de fonemas, dá-se a Aglutinação. Se os elementos forem de dois ou mais idiomas, surge o Hibridismo. A variante ‘paralimpíada’, que se assemelharia a um neologismo, não está incorreta, mesmo que pareça estranha. Não se trata de uma novidade linguística, mas de um falar jornalístico ‘moderno’. Lembremos que há ‘hidrelétrico’, bastante popular, e ‘hidroelétrico’, termo mais técnico. Ambos fazem parte do VOLP – Vocabulário da Língua Portuguesa -, “adj. (hidro+elétrico) V. hidroelétrico”, como consta. Quem deseja mais informações deve ir juntando as partes até ter a noção completa do vocábulo: formação, significado, pronúncia e grafia. Hidro é água, do Grego. Há o registro de que ‘elétrico’ vem de ‘electro, eletro’, também do Grego. Dicionário há que diz que ‘elétrico’ é do Latim ‘electricus’. Nada mais. Dessa família, temos o substantivo feminino hidrelétrica ou hidroelétrica. ‘Hidroelétrica’ não caiu no gosto popular – não se vê alguém falar ‘A hidroelétrica de Belo Monte’. Vê-se muito ‘A Hidrelétrica de Sobradinho’. A grafia hidrelétrica, que perdeu o fonema ‘o’, passa a ser Aglutinação, como ‘boca’ se junta a ‘aberto’ e formam os dois elementos o vocábulo ‘boquiaberto’, que o povo chama de ‘boca-aberta’.

O elemento hidro, radical grego, é rico e variado, fazendo parte de muitas palavras. Hidrocefalia, hidrofobia, hidrofilia, hidrogenia. Observe este par: hidroavião ou hidravião. Qual você prefere? O primeiro seria mais usual. Observe que gostamos de variedades gráficas, como terraplenagem, terraplanagem; garage, garagem; vitrine, vitrina; nuance, nuança; catorze, quatorze; cota, quota. Uma pende para o popular, outra para o culto. Vivemos um idioma múltiplo, cujas riquezas semânticas nos podem deixar atônitos. A palavra estrela em Português vem do Latim ‘stella’, e daí surgem Stela, Stella, Estela (nomes próprios), o verbo estrelar, o adjetivo estelar, e toda uma família cognata.

Então, o que é melhor – paralimpíada, em plena evidência no momento – ou paraolimpíada, de uso mais histórico? Aprendemos ‘Olimpíadas’ em datas priscas, isto é, quando os livros nos ensinaram o que seria Olimpo, lugar de morada de deuses, e daí nasceram a maratona e outros esportes. Os deuses podem estar chateados. Use o que lhe der mais na telha, sem se preocupar com a escolha do vizinho. Não se preocupe com ele – quem manda em você, quanto a seu falar e escrever, é o seu estilo, único e soberano. Observe ainda que usam ‘placar paraolímpico’, e não ‘paralímpico’. Por que se começa com ‘paralimpíada’ e depois se passa a ‘paraolímpico’? Na explicação deste blogueiro é que a sonoridade de uma palavra manda muito. Que termo soa melhor? E o que é ‘para’ nesse aspecto? Não é o mesmo elemento usado em para-brisa, para-quedas, para-raio etc. Para, em paraolimpíada, é ‘paralelo’ – que acontece à parte, sem ser o principal. ‘Paramédico’ é secundário a médico; ‘paramilitar’ indica organização particular de cidadãos sem pertencer à organização militar.

Similar às variantes gráficas ‘paralimpíada’ e ‘paraolimpíada’, arrisco a dizer que esse comportamento tem muito a ver com a pronúncia do Latim em que ‘ae’ e ‘oe’ têm o primeiro elemento ‘mudo’: em Curriculum Vitae não podemos ler ‘vitai’, como alguns jovens fazem, mas ‘vite’, assim como se pronuncia ‘et caetera’ (e tudo o mais) – ‘eticétera’; Regina Coeli (‘céli’); Caesar (‘césar’). A grafia ‘Aedes aegypti’ exige a pronúncia similar a ‘edes egípti’, em que o ‘a’ é mudo nos dois termos – aedes, que seria odioso, é grego, e aegypti, ‘do Egito’, é do Latim. Esse mosquito venenoso, causador da dengue e outros males, veio do rio Nilo, na África, para nossos quintais.

Note que, quando falamos rápido ‘compreende, empreendimento’, sai uma pronúncia que se assemelha a ‘comprende, emprendimento’. Não é nossa culpa – é da vivência, em que seria normal dizer ‘gafo’ para garfo, ‘viajá’ para viajar, ‘normau’ para normal etc. E ainda – bebida ‘alcólica’ para alcoólica, ‘zológico’ para zoológico, ‘quento’ para coentro, ‘queio’ (e outras) para coelho. Assim vamos vivendo os nossos falares em que não podemos buscar a erudição nem pendermos para o vulgar absoluto.

Mas a fantasia é um bálsamo. Albert Einstein, o alemão da Física, com suas visões estratosféricas, escreveu: “O dom da fantasia significou mais para mim do que meu talento para absorver conhecimento positivo“. Quem sou eu para julgar tão rica verdade diante da Vida? E você?

 

 

 

João Carlos de Oliveira

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *