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Muçarela ou ‘mussarela’? Além desse, existem outros vocábulos cuja grafia requer cuidado

Costumeiramente, vamos a um supermercado e lá encontramos, com abundância, tipos de queijo; entre eles, o tão afamado ‘mussarela’ (sic); é assim que grafam o nome dessa fadada preciosidade.

A muçarela de búfala custa os olhos da cara. (Ops! Eis a grafia correta.)

Por que houve, com intensidade, a grafia mussarela? Seria o motivo de o idioma ter vivido, em algum período, um momento de ‘escuridão’?

Essa suposta fase, felizmente, de vida efêmera, expôs palavras que circularam sem ter a etimologia definida.

Logo depois, etimólogos descobrem o ledo engano e trazem à tona a grafia correta, justificando o étimo: de que idioma o vocábulo veio e como deve ser grafado.

O Italiano, também uma língua neolatina, isto é, vinda do Latim, portanto, irmã da Flor do Lácio, o Português, tem-nos emprestado muitas palavras, algumas bonitas (piano, gazeta), já incorporadas ao nosso falar.

Os empréstimos, termos linguísticos que se incorporaram ao Português, são abundantes. Originados, portanto, de outros idiomas, muitos usuários nem sabem ou percebem que palavras que usamos, diariamente, não nos pertencem originariamente, como as vindas do Tupi-Guarani.

Tivemos o luxo de furtar palavras de línguas africanas (mucama, muamba, moqueca, acarajé, munguzá, vatapá). Temos a riqueza semântica de radicais, prefixos e sufixos gregos e latinos, mas essa é outra história.

O Celta, idioma morto, emprestou-nos estas tão populares: cerveja, saia, carro, camisa; uma da linguagem culta, brio, e outras que hoje usamos regionalmente: légua, bico, cambiar, Coimbra (nome da histórica e culta cidade portuguesa).

O Francês, tão gutural, e mundialmente usado, uma das línguas aceitas na ONU, é riquíssimo: jogral, menu, toalete, trova, joia, granja, chanceler, turnê, cabaré, avenida, chapéu, dossiê.

O objetivo, neste momento, não é citar todos os idiomas dos quais tomamos palavras emprestadas, mas o lembrete é cabível. Basta lembrar que o Inglês, o Castelhano ou Espanhol, o Alemão (guerra!), até o Russo, o Nipônico, entre outros, fazem o nosso ser um idioma mesclado, e tão pouco temos de nosso falar original. Além do passado antropológico, a globalização nos invade, trazendo uma gama de vocábulos que preenchem espaços inimagináveis.

Aos poucos, vamos aprendendo. Excelente, porém, que leitores saibam que não estamos sós no campo da linguagem, que não somos tão autênticos.

A Gramática Histórica dá alguns exemplos italianos: amainar, caricatura, carnaval, gazeta, infantaria, pastel, piano, piloto, pistola, punhal, ópera, salsicha, sentinela, talher. É bom lembrar que esses são vocábulos primitivos e que deles, evidentemente, nascem muitos derivados. De piloto, pilotar; de gazeta, gazetear; esse processo formativo de palavras enriquece o idioma e aumenta o número de palavras.

Se consultamos um bom dicionário, mesmo que não seja puramente etimológico, muitos vocábulos têm a sua origem indicada entre parênteses, até com a possível grafia do idioma de onde vieram.

Assim, temos a explicação: muçarela vem do Italiano ‘mozzarella’. Dessa grafia, em virtude da pronúncia, foram criadas duas outras que circularam, ou ainda circulam, em todo o Brasil: mozarela, e a conhecida ‘mussarela’, uma grafia fônica do original italiano. Agora, os doutos dizem que não se deve grafar o termo com dois ss (dois esses), mas com ç (cê-cedilha). E isso causa estranheza a alguns, ou a muitos, em virtude do hábito de verem essa forma grafada em rótulo desse tipo de queijo e no menu de muitos restaurantes que oferecem comida com essa iguaria.

Paremos aí. Isso basta. A grafia aportuguesada é muçarela.

Tudo isso por que existem vocábulos que deixam dúvida na grafia por terem vivido, ou ainda vivem, momentos de incerteza na sua turbulenta existência, nesta Nação continental?

Maisena.

A caixa do produto, que é o amido de milho, assim como há o amido de mandioca, registra ‘maizena’, mas isso é marca. O produto em si é maisena (maís+ena), nascido da forma aportuguesada mahisí, vinda do Taino, língua falada por indígenas extintos das Antilhas, via Castelhano. Até dizem obras que ‘maís’ tem origem latina. Pelo menos, neolatina é coisa certa.

Nada mais.

Cuide destas grafias: paralisação, Manuel, milanês, milanesa, mausoléu, insensato, pretensão, embriaguez (jamais embriaguês), fase (faze é forma verbal de fazer), alisar, alisante, piche, bisar (que vem de bis, por isso, prefiro busão, que vem de bus), xampu, sinusite, pêsames, xadrez, magazine, aprazível. Já teve dúvida em escrever empecilho, cabeçalho, tensão? (Tenção é o mesmo que intenção.)

Observe que não estão em ordem alfabética, o que faz com que o cérebro pense mais e busque outros exemplos que estariam próximos de cada palavra lida, vista e analisada. Pelo menos em parte, o hábito da imediação ou o da lei do menor esforço (ter tudo pronto) vicia o pensamento. A ‘desordem’, em contrapartida, obriga o pensante a encontrar o esconderijo onde fica cada objeto.

Não meta a mão na cumbuca descuidadamente, dentro dela pode haver surucucu.

Se lápis gera lapisinho; se país, paisinho (não se trata de paizinho, vindo de pai); pires, piresinho, logo, busão ou busu (gíria), que vem de bus. Com z (buzu), tem-se uma grafia menos justificativa.

Grafias nos advertem: esperto e experto, espresso (tipo de café) e expresso; fuzil e fusível; tráfico e tráfego. Etc.

Quem não cuida de uma grafia-problema, costuma confundir mal e mau, cessão, sessão e seção; onde e aonde; há, a, à. A grafia se debate todo dia, mas continuamos com erros xucros, discutidos pelo País afora, inclusive neste sítio (que não é tão panorâmico quanto de autores famosos, mas dá para o gasto do dia a dia). Salvo melhor juízo!

Toda entidade comercial, como CDL, deveria ter um assessor de linguagem, que atenderia orientando comerciantes nos seus bâneres, panfletos e outros, evitando-se ‘Concerta-se roupa’ e outros tantos: Existe à 50 anos!

Preocupa-nos o mau uso do idioma encontrado em repartições comerciais: mixirica, giló, genipapo, ovos branco etc.

Glúten não tem variante gráfica. O plural nos chama a atenção pela sua dupla forma: glutens (sem acento gráfico, como homens, hifens, itens etc.) e glútenes, assim como hímenes, hífenes.

Vamos misturando.

O jornal fala que um terrorista atacou pessoas com uma faca em Paris, que o meliante matou ‘uma vítima’ com uma facada. O esfaqueado já era vítima antes de morrer? Tornou-se vítima da ação após ser esfaqueado e ter vindo a óbito. (O terrorista matou uma pessoa, que foi vítima de facada em plena rua parisiense.)

A empresa, envasadora de produtos lácteos, diz que o leite foi ‘fabricado’. Então, esse leite não é da vaca nem de cabra ou ovelha. É produzido pelo ser humano!

O queijo, sim, fabricado, mas o leite, apenas) envasado.

Estaríamos diante de uma impropriedade linguística. Se isso fosse correto, diríamos que o montanhista escalou o prédio, que a diarista trepou a escadaria, que o balconista enrolou o suco, que o vendedor empacotou o leite in natura.

Curioso é o homem do campo dizer ‘o leite talhou’, isto é, cortou. ‘Talhou’ porque surgiram cortes na massa coagulada; um talho ou corte aqui, outro ali: talhar, cortar, coagular. Tem uma ‘qualhada’ aí, seu moço? Onomatopeia de coalhada. Coagular, coalhar, talhar. No Português rasgado, o popular por fora, ‘qualhar’.

Fiquemos por aqui. Amanhã, eu volto.

 

 

João Carlos de Oliveira

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