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‘Primeiramente’, você entra à esquerda. ‘Primeiro’, você entra à esquerda. ‘Primeiramente’ ou ‘primeiro’?

Há diferença gramatical e semântica entre um vocábulo e outro, conforme o contexto.

‘Primeiramente’, derivado sufixal, que recebe o único sufixo adverbial em Português (mente), é advérbio que indica modo. Seria comum o uso de advérbios desse naipe no dia a dia: praticamente, rapidamente, continuamente, semanalmente, temporariamente etc., todos com carga semântica de modo ou tempo.

Na segunda parte do título, ‘primeiro’, gramaticalmente, é adjetivo fazendo o papel de advérbio, com o mesmo valor semântico, a que chamam de adjetivo adverbializado.

Frases coloquiais que nos cercam em que o adjetivo vale como advérbio: Bateu rígido o chicote (rigidamente). Entre rápido aqui, menino (rapidamente). Faço isso correto (corretamente). A locutora falou consciente para a plateia (conscientemente).

O marketing não deixa escapar a chance de chamar atenção usando adjetivo com valor de advérbio: ‘A cerveja que desce redondo’, de uma marca conhecida. ‘Que desce redondo’, redondamente.

No momento em que a dúvida bate se poderia flexionar o termo tornando-o advérbio terminado em mente, melhor que fique no seu natural (Ele saiu apressado), mas o valor semântico é de advérbio (apressadamente). Esse uso seria comum na linguagem coloquial.

Vista a primeira parte do título, usando-se primeiramente (inicialmente), seguindo-se a sequência de ‘segundo, terceiro’ etc., teríamos “Segundamente, você entra à esquerda”; “Terceiramente, você entra à esquerda”; “Quartamente, você entra à esquerda”.

Mas essa redação não ‘pegou’, embora correta. Quem usa ‘segundamente, terceiramente’? Porém, aparece: primeiro, segundo, terceiro etc. Às vezes, um derivado não tem a mesma valia do primitivo.

Além de essa forma de redação não ser comum ou usual, o visitante poderia ficar com cisma: haveria erro? Não há; apenas, a frase não se torna simpática ou audível. Não há praticidade nesse aspecto.

Primeiramente deu lugar a primeiro, mas segundo e terceiro não deram lugar a segundamente, terceiramente etc.

O idioma é dinâmico, por isso, a ‘inovação’ em que a semântica suplanta a teoria gramatical, deixando o usuário mais à vontade. Nesse momento, domina melhor seu falar e escrever e tem o deleite de ser criativo, recursos que escrita e fala podem oferecer.

Assim como o poeta usa neologismo (“Inventei o verbo teadorar, intransitivo: Teadoro, Teodora”; Manuel Bandeira), o cidadão comum procura o meio de sair da mesmice, como se costuma ver na fala popular e até na Literatura de Cordel.

Isso basta para dizer que o adjetivo é ‘múltiplo’, podendo viver a derivação imprópria (mudança de classe gramatical).

Buscando mais faceta do que falamos e escrevemos, às vezes, a ordem das palavras pode facilitar, como complicar, o entendimento da mensagem. A frase ‘A maldade é a falta de amor e egoísmo‘ pode oferecer um veio de interpretação duvidoso, pelo fato de ser dúbia.

“A maldade é a falta de amor”, sim, e isso diz muito, mas a sequência ‘e egoísmo’ implicaria haver ‘falta de egoísmo’, quando ‘é egoísmo’. Para evitar a dubiedade, a redação seria alterada: ‘A maldade é falta de amor, é puro egoísmo’. Ou que a ordem se altere: ‘A maldade é egoísmo e falta de amor’.

A manchete de jornais, normalmente, não usa substantivo precedido de artigo. Seria opcional. Melhor que se apresente sucinta, além da questão ‘espacial’, por isso, em manchetes, o uso de artigos, definidos ou indefinidos, não é tradicional.

No futebol: ‘Brasil bate Itália’.

Alternativas: ‘O Brasil bate Itália’. ‘Brasil bate a Itália’.

Essas versões comprovam que a redação não ficou de bom tamanho, além de ser pouco enfática.

E agora?

‘O Brasil bate a Itália’, bem diferente, o que indica que o artigo deve ser usado para todos os substantivos, ou que não seja usado para nenhum deles.

A primeira e última frases são típicas, com a predominância da primeira. A segunda e terceira, no entanto, se tornam truncadas ou falhas: artigo usado para o primeiro substantivo, e não para o segundo; artigo usado para o segundo substantivo, e não para o primeiro, respectivamente.

O leitor discorda? Já teria analisado esse viés? Em trabalhos escritos, já usou títulos de textos, como de redações, com artigo ou sem? Se houver mais de um substantivo, usou o artigo para um e para outro ou outros não? Ideal seria rever a prática.

A palavra silvestre é derivada de silva (floresta). Silvestre, pois, é campestre ou que se relaciona à floresta. O dicionário registra “próprio das selvas; selvagem; terreno coberto de silvas (ou selvas). Silvestre, vegetação que medra espontaneamente, que não precisa ser cultivada pelo homem”.

O fruto tirado diretamente da Natureza é silvestre. Em sentido figurado, silvestre é bravio, rústico. Curioso: pode sofrer derivação imprópria e se tornar nome de pessoa. Silvestre está aí?, pergunta alguém.

O Latim o registra ‘silvester’, do campo, relativo à selva (silva). O Inglês opta por ‘sylvester’ (grafado com y e sufixo er). Sylvester implica charme como nome de autor de cinema?

Ileso e iluso: parecidos, mas não os mesmos; devem ser usados com a devida atenção.

Ileso: são e salvo; ele saiu ileso do acidente; iluso, que teria sido enganado; ele vive iluso; cognato de iludir, iluso indica quem sofreu ilusão.

Há alguns anos, quem sabia escrever, pronunciar e definir a abreviatura hi-tech (de ‘high-tecnhology’) seria aquele com bom nível de conhecimento e sabedor de termos técnicos usados em Informática e outros. Hoje, não é mais novidade; o usuário, no entanto, deve ter cuidado com a pronúncia (‘rai-ték’), em Inglês livre, vista sem sofisticação. Citado termo de outro idioma, o que nos admira é haver, ainda, locutor que não saiba a boa pronúncia de Siemens (‘símens’), em que o primeiro ‘e’ é mudo. Não vale a observação? Locutores, com excelente dicção, no entanto, leigos em pronunciar vocábulos exóticos, fazem-no como se estivessem em casa falando com os mais próximos, o que não convém. Empresa alemã desde l847, Siemens não pressupõe palavra trissilábica.

A maioria sabe disso, mas é bom repisar: semáforo é chamado, também, sinaleira, sinal, luz, farol etc. Cada um defende uma posição. O fato é apenas curioso: a multiplicidade de definições ocorre em todo o País porque o usuário adota o que lhe está mais próximo.

Cuidado: saque, o ato de sacar; saquê (cachaça japonesa feita de arroz), saqué, nome popular do cocar, ou tô-fraco, galinha-d’angola.

Indene, que não sofreu dano; insone, que não dorme; inerte, que não se movimenta; inerme, sem armas ou não tem meios de defesa; inato, congênito, o mesmo que nato; inapto, que não é apto; inane, que nada contém, oco; imune, isento, livre.

Crivo, peneira, ou melhor: o lastro da peneira. Passar pelo crivo: ser aprovado depois de ser submetido à avaliação de banca examinadora.

Cair no ‘reio’ (relho), ou levar uma sova, expressão popular para dizer que o filho ‘é advertido’ pelos pais por algum mal-feito.

Beócio, dialeto da Beócia; ou idiota, em linguagem coloquial, senão vulgar, como se usa por aí.

O nababo não é só aquele que tem vida de elevado poder aquisitivo; pode ser quem gosta de bajular, o bajulador.

Rédea: cabresto que segura a cavalgadura; redil: curral de ovelhas.

Anacoreta: eremita (religioso que vive isolado da sociedade).

 

João Carlos de Oliveira

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