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O que é uma coisa atemporal? Um fato atípico? Uma visão amoral? Um indivíduo apolítico?

Os adjetivos do título (atemporal, atípico, amoral, apolítico), se apenas ouvidos, podem causar dúvida, tanto de escrita como de seu aspecto semântico?

Parece que sim, a depender do nível linguístico do interlocutor.

Atemporal seria confundido com o temporal, o substantivo, mas precedido de artigo definindo masculino singular?

O que se pressupõe, pela normalidade de uso de palavras antônimas, é que o usuário entrosado com outros exemplos de derivação prefixal (impróprio, incompleto, indevido, irreal, irresponsável, desfeito), certamente, não teria dificuldade de entender, e usar, atemporal. Outro, talvez, em texto escrito, tenha dúvida quanto à sua grafia, considerando-a incorreta, pelo fato costumeiro de usar temporal.

“Houve o maior temporal na cidade, que inundou tudo, causando muitos estragos”, pensaria.

O prefixo -in é tradicional, visto em palavras cotidianas ou corriqueiras, conforme a classificação de cada um, mas o uso de -a, prefixo também de caráter negativo, geraria incerteza. Seria como, de repente, certo leitor encontrar em texto inamissível, inane, inassíduo, que são incomuns, ou até inodoro, insípido, irresoluto etc., uma vez não-habituado à semântica ou ortoépia, o que lhe pareceria uma escrita fugidia, diferente do que os olhos veem comumente.

Atemporal, fora do tempo, que foge ao tempo habitual, intemporal. Vivem-se no momento situações atemporais do efeito-estufa.

Atípico, que não é típico, incomum, raro, fora do padrão. A Medicina está diante de doenças atípicas.

Amoral, que não é moral nem imoral; que está fora da noção de moral e/ou de seus valores. Indiferente moralmente. A vida física é amoral. E o fato de se pedir redação a crianças sobre sexo pode ser atitude amoral? Implica, mais, ser imoral.

Apolítico, aquele que não é político nem serve a interesses partidários. A funcionária, por ser apolítica, foi excluída do grupo partidário do gestor municipal.

E se segue uma relação de adjetivos desse naipe prefixal: amorfo, anormal, acrônico, analgésico, anacrônico, afônico. E outros.

Teria sentido este enunciado?

A nanociência descobre num exoplaneta um vegetal apófito e amorfo. 

Explique isso, companheiro!

A resposta, meu caro consulente, será dada pela NASA daqui a alguns anos. Duvida?

Melhor entender que dizer algo incerto ou duvidoso, mas vai um recado: nanociência, a ciência moderna que enxerga a vida molecular em detalhes microscópicos; exoplaneta, planeta que orbita uma estrela que não seja o Sol; extrassolar, presente em galáxia fora da órbita do mundo em que vivemos; apófito, planta fora do seu habitat pela ação humana; amorfo, o que não tem forma definida.

E agora? Há mais o que dizer, mas essa seria uma linguagem erudita, em texto clássico, em artigo de caráter científico, para o leitor enfronhado (não, exatamente, debaixo das fronhas), para uma pessoa não-enfezada (não, exatamente, coberta de fezes, como o marruá que não quer ir ao matadouro no final de semana a ser extirpado no domingo pelo magarefe, com a faca mais afiada).

Um cientista tem dizeres, e outro vê algo mais, e se somam informações multifacetadas sobre a nanociência, os exoplanetas e a vida amorfa de seres vivos, animais e plantas. E o que mais?

Eis o nosso linguajar, assim como alguém diz que o professor é aloprado, ou que, se uma pessoa não tiver prudência, alopra diante de tantos fatos horrendos no mundo moderno.

Gostaria de ver uma lista de palavras com os prefixos -a e -an?

Antes o lembrete, se necessário for, se cabível parecer, se lógico for neste momento: os antônimos são formados por dois processos. Os que naturalmente se fazem pela oposição de significados (entrar, sair; perder, ganhar; fome, anorexia; despesa, reserva; cúmplice, inocente; concórdia, discórdia; prestígio, desprestígio; humano, desumano etc.) e pelo acréscimo ao radical de certos prefixos.

Ei-los:

-in, o mais comum. Feliz, infeliz; justo, injusto. Lembre-se de que -in se torna -im antes de b e p: imberbe, imprudente. Pode tornar-se, apenas, -i, ante um vocábulo que já comece por l, m ou n: ilegal, imune, inato, ou tornar-se ir antes de vocábulos que comecem por R: irreal, irrealista, irrestrito.

E um muito popular: -des, desfeito, desmonte, desacato, desventura, desjejum (ou dejejum).

Com semântica negativa similar, temos -anti, muito usado no cotidiano: antisséptico, anticárie, antirrábico, antissemítico etc. Não pode ser confundido com -ante (antessala, anteontem, antedatado, antenupcial), que vem antes, e aquele de sentido oposto.

Mire as grafias antirrosto, antisseborreico, antissonoro, antissoviético, antivenéreo. E outros.

Busque em sua cachola a palavra inassíduo, observados sua grafia e significado. Relembre: inadimplente, inapropriado, inapto, ineficaz.

Se já comparou normal e anormal, entre outros, analise estes exemplos: acéfalo, acardíaco, acárdico, amovível, anaeróbico, analfabeto, anárquico, anatural, anaxial, anêmico, anencéfalo, anônimo, apartidário, apático, apatriota, áptero, apátrida, assimétrico, ateísta, ateu, átono, atóxico.

O prefixo -a se torna -an ou -ana: atípico, anencefalia, anacronia, anacrônico.

Tomara que você saiba mais que o exposto. Vá em busca de seu conhecimento linguístico e faça bom uso dele. Sucesso!

Abraços.

 

 

João Carlos de Oliveira

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