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“Esse cara é o ziza” (sic), dizia sempre, falando do amigo, apressadinho. Algumas gírias que se foram e certos regionalismos

Linguagem salutar, que deve ser mantida, defendida e repetida, tal sua simplicidade, naturalidade e importância.

A Pátria se faz de conjuntos, de todos os tipos, de todas as espécies, e da fala, que implica ‘a Unidade Nacional’, sem a qual o povo não se conheceria, não saberia dos próprios costumes, não daria valor ao patrimônio artístico-cultural, teatral, poético etc. que possui.

Sem o idioma, com todas suas facetas, a Nação perde suas entrâncias, entranhas e manhas, seus laços, que a fazem uma colcha de retalhos coloridos. A fala popular e seu ‘pedaço de chão’.

A Literatura de Cordel, os causos, ‘Romanceiro da Inconfidência’ (de Cecília Meireles), as entrelinhas do linguajar, e o idioma ‘está pronto para ser servido’, vivido e divulgado; mutável, apesar de tudo; metamorfoses peculiares, e eis que são muitas.

‘Modernos’ há que pensam só valer o presente! E o passado? A História tem várias eras, ou curvas do tempo. O pretérito se acopla ao moderno para formar o futuro, sem o que as coisas não se diriam, não teriam histórias, nem as têm, estórias, historietas e Historiografia.

Ziza‘, se não for antropônimo (nome próprio de pessoa, mesmo que exista como alcunha, ou ‘pilido’, para se dizer um regionalismo), vira um sujeito inquieto, mas danado de bom e sabido, ligeirinho, sempre por fazer algo a mais, homem de visão sobre o Horizonte, no labirinto da selva de pedra. Calmo, irrita-se com o que lhe dizem.

“Senhor, tu que és sábio, me dizes o que é a Felicidade?”, excerto de um conto?, talvez, árabe, e fica agora a expectativa de que o visitante saiba indicar título, autor e de que terra veio, viveu e perpetuou seu pensamento filosófico.

“Olhe para trás”. E a conversa aumenta, como fermento lento em bolo caipira, mas crescente, dando boa prosa.

“O que vês?”, pergunta-lhe o filósofo.

“Vejo bois pastando”.

“E o que mais?”

“Nada mais.”

“Como queres que te mostre o caminho da Felicidade se teus olhos não enxergam o passado, o que se foi, o que foi feito”.

Seria um resumo precário das falas.

Se o presente não vê o passado, como se pode avaliar o fato construído, bom, ruim, prudente ou imprudente, para se tirar o fio da meada, para se tirar o pé de um lugar e colocar em outro, para se ter firmeza no andar, no dizer, no viver?

Melhor essa linguagem que a ‘moderninha’ cheia de percalços desconhecidos: “Cadê você, sua pirralha”, pergunta a mãe. “Vou indo, minha mãe”, diz a filha atônita, com medo de levar uma sova de fedegoso, macio como galho de vassourinha, que deixa marca indelével de aprendizagem, hoje proibida, mas no passado um tanto educativa, ‘professoral’, que, ligada a um olhar, serviria de norte para o resto da vida, como uma bússola perfeita.

Vou‘, de ir, e ‘indo‘, também o é. E os dois juntos? Esse conjunto não serve.

Estou indo. Vou andando. Vou chegando. Vá lá que essas opções nem tanto; melhores, entretanto, que a primeira.

Já estão criando o verbo ‘biometrizar’, dizendo que nem toda a turma da cidade fez biometria para as eleições deste ano, não ‘desse’ ano, o passado. E aí se fala imponente: ‘Parte da população já está biometrizada’, como disse uma repórter. Vá que seja neologismo, já que se pode dizer ‘institucionalizar’, e por que biometrizar não dormiu no dicionário de ontem para cá?

O que pode ferir é um falar (nem gíria nem neologismo) da ‘Human Reality’, se o nome servir, que diz até o incompreensível: “Vou estar indo participar com vocês…”, ou algo parecido, perecível, um bolachão malfeito, acre e, depois, fétido, capaz de dar disenteria (não ‘desinteria’, vocábulo que não está no dicionário nem como variante gráfica, mas é dito e perpetuado; melhor dizer ‘pra mode nóis ir lá otraveis’, frase de Manuelito, que gosta de uma farofinha de retombo).

É isso aí, cara! Se não der, bote tudo no ofurô, banheira coletiva. O nipônico também oferece seus termos, como o tatame, tão consagrado. Preferível ao ofurô o banho de bica. A velha toma banho na bica…

Tamanho é o ostracismo que se vive no momento, apesar de todo mundo junto. Boa expressão ‘Tudo junto e misturado’, que tem várias acepções.

Isso é um fuzuê, ou furdunço. E se for melhor ‘pra mais de metro’, use furdúncio, que é chique e rima com abrenúncio, anúncio, internúncio, núncio, prenúncio, pronúncio, e outros. Brogúncio? (Bagagem pobre de quem viaja a pé.) Conhece a terúncio? (Pequena moeda de prata.)

A noxa é terrível, como o coronavírus, capaz de matar, mais letal que a fome!

O sarampo, no Brasil, não foi erradicado.

Há quem esteja usando ‘mega’ como se fosse ‘muito’: ‘Estou mega nervoso’ (sic). Conheça megaevento, megalópole, megafone, megalomaníaco, megatério (mamífero fóssil).

Se estaria ‘meganervoso’, estaria ‘megafeliz, megarrico, megassaudoso, megaapressado’? Apenas, muito nervoso, muito feliz, muito rico, muito saudoso, muito apressado.

Inventa, reinventa e ‘desinventa’ o idioma, que sofre com sequelas doentias da fala sem nexo.

Conversando com Iarlla Vieira Reis, que esteve em visita na residência deste e de minha família, na data de ontem, que até parece ‘tresantontem’, sua presença simples foi agradável. Jovem futurista, filha de Ipiaú, aqui na Boa-Terra, estuda na UESC, e de lá veio conhecer as plagas teixeirenses, onde mora Gerhard, nosso neto, e seu namorado, com quem ‘tá ficando’ até a sorte permitir. Diz que conhece gírias, mas deu a entender que as não usa muito, e as respeita. A linguagem grapiúna é cheia de toques do cacau, do chocolate, de histórias da Bahia, da terra de Adonias Filho, autor de Os Servos da Morte e Corpo Vivo, entre outras obras. Filho de Itajuípe, como narra o texto, mas radicado em Ilhéus.

Faz o curso de Línguas Estrangeiras Aplicadas às Negociações Internacionais, nome longo, cheio de dizeres macroeconômicos, supervisionados pela importância de ser uma intérprete poliglota, multilíngue ou trilíngue. Bilíngue é pouco.

Uma gíria que cita: ‘Você me tira’ (do eixo, do sério?) para dizer que a sacaneia, brinca com sua seriedade, como se tudo fosse saracotear o lado de quem não quer chacota, zombaria ou pilhéria.

Insinua que em sua cidade de origem alguns usam ‘pedir’ como ‘perguntar’: ‘Pede para ele se vai sair agora’, regionalismo maior, próprio do local, que se entende como se adora cuscuz com ovo, carne-seca ou linguiça caseira, suína, assim como se frita um retombo ‘de primeira’. Não se espante, a carne de terceira, ou o resto que se tira da carne de primeira e segunda, o retombo, vira acepipe de encher a bocarra faminta. Isto é regional.

Alguém fala que ‘entalhar’, cortar um pedaço de madeira (a xilogravura para fazer arte), é imprimir; imprimir o poema, imprimir uma boa impressão (que redundância maior), e por aí se vai.

E o amigo fala para a colega “Sua poltrona!”, não que a quisesse chamar de ‘móvel da sala de estar’, mas de boboca grandiosa, já que a adora. O poltrão, grandioso bobão, gera o feminino ‘poltrona’, homógrafo, mas de significado relevante: medrosa, covarde, palerma, paquidérmica (figurado), e mais.

O cara tem um muque de dar inveja!

Isso valeu, camarada?!

 

João Carlos de Oliveira

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