0

A mensagem, que seria bíblica, ‘Filho meu, ouve os conselhos de teu pai e guarde os ensinamentos de sua mãe’ (sic), como consta de um livreto, está gramaticalmente correta?

Esse ensinamento, de profundo teor, adequado a todas as épocas, a todos os filhos e, muito mais, ao mundo moderno, seria baseado em Provérbios, livro bíblico.

O mundo religioso é fantástico, desde que vivido sem fanatismo, como deveriam todos pensar e agir. Nossa convivência de respeito a Deus e conduta do bom-viver entre pessoas, seguidoras do mesmo dogma ou não, e de caminhos reinantes diversos, deve ser pacífica.

A exigência de que todos sigam, ou deveriam seguir, as mesmas visões não serve; o agir ou o pensar de que devemos ser ‘inimigos’ daqueles que não comungam ‘nossas’ práticas religiosas não nos leva a nada. Não nos podemos afastar de um vizinho por que segue ele religião diversa da nossa.

Não se precisa, neste momento, enxergar a busca do entendimento humano perfeito, nem precisamos odiar ou abominar o que não segue ‘a mesma estrela’ que a nossa.

Isso bastaria como opinião sobre todas as irmandades religiosas que nos cercam. Bom preceito é vivermos em harmonia com todos, embora de diferentes princípios.

A Bíblia tem linguagem culta, senão erudita, e saber lê-la é ato nobre, sem paixões, sem exigências, sem ostentar divergências que levem ao ódio. Tampouco se deve tomar seu conteúdo profundo e variado, com aplicabilidades a todos os momentos da História Universal dos Povos, ao pé da letra. O cuidado é amplo.

No caso de Provérbios, como citado, há muitos ensinamentos similares às parábolas deixadas por Cristo e seus Apóstolos, salvo melhor juízo.

Divulgá-los, usando-os como introdução a falares e a textos, seria bom hábito, mas o cuidado deve ser máximo: para que não se alterem, para que não sejam ‘reescritos’ de forma diferente da original.

Pode-se perceber em panfletos de cunho religioso que passagens bíblicas vêm alteradas. Por quê? O fato se deu por engano ou foi intencional?

No caso acima, há um lapso forte na troca da segunda forma verbal (no imperativo afirmativo, guarde) e no pronome a seguir (seu). Ambos os casos não cumprem a regra gramatical da Uniformidade de Tratamento, isto é, a redação textual na mesma pessoa verbal por estar inserida no mesmo contexto.

A primeira parte respeita a regra da pessoa ‘tu’ (Filho meu, ouve… de teu pai); a segunda, um engano?, tem como critério o tratamento ‘você’ (guarde… os ensinamentos de sua mãe).

Tudo em ‘tu’ ou tudo em ‘você’.

Corrijamos para os dois casos.

Primeiro, na mesma pessoal inicial, como deve ser a forma escrita na Bíblia, em linguagem escorreita: “Filho meu, ouve os conselhos de teu pai e guarda os ensinamentos de tua mãe” (Provérbios 1:8).

Analise: ouve (tu), teu, guarda (tu), tua, tratamento na segunda pessoa do singular.

Após essa, nota-se que a segunda parte foi alterada (como registrada na introdução).

Se usarmos o critério da flexão verbal seguindo o da segunda parte, teríamos: ‘Filho meu, ouça os conselhos de seu pai e guarde os ensinamentos de sua mãe’, mas essa não é a redação bíblica.

Analise: ouça (você), seu, guarde (você) sua, tratamento na pessoa você, que segue a regra em que a redação fica na terceira pessoa do singular (embora se considere você como tratamento da segunda pessoa do singular, expressão popular, que não foi a forma escolhida pelos redatores quando a Bíblia foi vertida para o Latim, o que a História registra: Vulgata, tradução latina da Bíblia, feita por São Jerônimo (durante anos?), o qual corrigiu o Novo Testamento sobre os maiores manuscritos gregos, e traduziu em grande parte, diretamente do Hebraico, o Antigo Testamento, texto oficial adotado pela Igreja Católica. (…) (Redação adaptada de uma obra compulsada.)

Não se deve alterar essa ‘história’ nem torná-la um texto pessoal, como se fosse o nosso quintal, a nossa poesia, a nossa música popular ou a nossa imaginação. Ao buscarmos os preceitos bíblicos para destacar nossos viveres, respeitemo-los e os deixemos como estão na Bíblia.

Não seria a norma, mas se o redator não gostar da forma verbal ‘guarda’, da segunda parte, já que poderia parecer o substantivo (a guarda), que usasse, a seu modo, mas sem citar o texto bíblico. Essa possível redação, que ficaria correta, seria: ‘e que guardes os ensinamentos de tua mãe’.

Que eu guarde, que tu guardes, que ele (ela, você) guarde, que nós guardemos, que vós guardeis, que eles (…) guardem (os bons ensinamentos bíblicos).

Usando-se ‘e que guardes’, a segunda parte passaria do imperativo afirmativo para o presente do subjuntivo do verbo guardar, com o mesmo aspecto semântico, não com a mesma redação bíblica, embora seja uma variante culta correta.

Repitamos essa suposição: ‘Filho meu, ouve os conselhos de teu pai e que guardes os ensinamentos de tua mãe’.

Isso basta.

Outra frase de hoje é esta: ‘E aí comecei a estudar direito’.

O que se declara?

O verbete ‘direito’ representa a forma correta de estudar ou a Ciência estudada no Curso de Advocacia?

Popularmente, diz-se ‘Eu estudo Direito‘ (com maiúscula, o estudo da Ciência em Curso de Advocacia na Faculdade de Direito).

Em se mantendo o verbete em minúscula, tem-se a semântica de que aquele que estuda está a praticar seus atos ‘corretamente’. Mas isso nem sempre é entendido de forma tão espontânea, porque em um momento o enunciado foi, apenas, ouvido.

Daí, os dois aspectos.

No aspecto voltado para a Ciência, em sendo a frase escrita, melhor, portanto, que o substantivo ‘direito’ venha grafado com maiúscula para que o contexto não ofereça dúvidas. Estuda Direito.

O ‘intérprete’, jornalista que transcreve fala popular, teria muito cuidado com esses critérios. Ouviu a frase e a transcreveu: E aí comecei a estudar Direito (aspecto semântico que deve ser levado em conta; trata-se de um acadêmico do Curso de Direito). E aí comecei a estudar direito (outro, o de que o estudante passou a adotar um critério ‘correto’ de estudar suas matérias, sendo ele acadêmico ou não, estudante do fundamental ou secundarista).

Com letra minúscula, direito, corretamente (direitamente, poderia ser usado?), indica o modus operandi de quem pratica uma atividade. Faça isso direito (equivalente a um advérbio de modo): adequadamente, corretamente.

Ou direito (adjetivo): correto, justo, honrado, íntegro: homem direito.

Direito, a Ciência das normas obrigatórias que regulamentam as relações dos seres humanos na sociedade.

O cuidado é que não se tome o conteúdo ao pé da letra.

Tem-se usado anti-violência, que não está de acordo à regra.

Antiviolência, sim; assunto do momento, que envolve muitos aspectos. Além de reportagens insalubres, com tempero insosso, o uso do hífen nesse caso é indevido.

Anticárie, antiderrapante, antirrugas, antisséptico (a propósito, não se confunda esse adjetivo, escrito com dois esses, com o homônimo que se escreve com c, que existe, anticéptico, que não tem relação com Farmacologia ou Medicina. Anticéptico significa ‘que se opõe ao cepticismo, isto é, doutrina filosófica dos que duvidam de tudo e afirmam que não existe a verdade; que, se existisse, seria o ser humano incapaz de conhecê-la’ (adaptado de bom dicionário).

O fato de citar esse termo se deu em virtude de um remédio natural, como foi dito, ter escrito que o produto seria ‘anticéptico’, em que se nota o engano: seria antisséptico, isto é, capaz de impedir a atividade e a multiplicação de micróbios etc., como a putrefação. Numa linguagem livre, dir-se-ia que água oxigenada é antisséptica.

Antes, escrevia-se anti-séptico; hoje, antisséptico.

Por hoje, é isso.

Obrigado.

João Carlos de Oliveira

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *