0

De tanto repetida, esta expressão se torna bordão televisivo: “Olha só!”, e a partir dela repetem-se outras tantas

Por que esse modus operandi da linguagem cotidiana se vem repetindo tanto?

Seria mais bonito? Trata-se de linguagem apelativa ou de um vício de linguagem?

Simplíssimo ou simplista não é. Surge em um momento em que o usuário quer um destaque, e tasca lá sua fala ultramoderna, com muitos ‘acessórios’, plena de intermediações e frases que buscam um elo entre o fato e ele, o narrador.

Deveria ser a fala natural, demonstrando o conhecimento do narrador ou palestrante para o telespectador. A outra parte, se houver ou se for destaque, fica à mercê do final da história, tirando-se as conclusões se algo valeu a pena.

Um convidado conta um fato, olha para o apresentador, e se dirige, tão-somente, a ele. O narrador ou convidado estaria ali para contar algo apenas para o apresentador?

Que estilo é esse?

Sabe-se que o convidado, narrador ou palestrante fala para o ouvinte, e deve olhar para as câmeras que registram o momento e não para quem o entrevista.

Esse modo de apresentar seu ponto de vista cria perda de tempo ou indica descaminho do que se quer apresentar ao público. Qual seria o outro viés?

Essa maneira de alguém se apresentar na televisão desvia o foco da entrevista, e pode insinuar que o entrevistado quer o destaque para ele mesmo. Não seria o padrão rígido de não poder dar uma paradinha e conversar um pouco com quem apresenta o programa, mas o convidado ficar o tempo todo ‘com os olhos voltados para o apresentador’ gera descrédito ou a visão de que, ali, o foco é ‘ele’ apenas, não o que narra.

Para que foi lá?

E diz tanto, que faz pergunta a ele mesmo e ele mesmo responde, ‘na bucha’, o que seria o certo para aquele questionamento.

Isso incomoda.

Se uma pergunta foi feita, a resposta seria dada pelo público, com o respaldo positivo se a palestra serviu, e com o negativo se ao contrário.

Associado a esse questionamento, temos o tema de hoje: o enjoado ‘Olha só!’, e há quem o repita mais de dez vezes num minuto. Esse procedimento ‘encalha’ o produto vendido ou a imagem do falante.

Cansativo, desvirtuando a finalidade da entrevista.

Desse modo, o entrevistado ‘se atropela’, com o foco negativo para si mesmo. Seria como um professor dar aulas ‘olhando para as paredes, o teto da sala’, e não para os pupilos, ‘dirigindo-se fixamente para cada um deles e todos, em diversos ângulos. Seria preferível o professor ‘que anda no púlpito’ àquele que fica prostrado, olhando para o teto, em frente aos que buscam algo positivo em sua aula’.

O próprio perguntar e ele mesmo responder (que falha, cara) seria como dizer “Respondo porque sei o que digo e ninguém o sabe”, prova de desconsideração ao povo. A não ser que um interlocutor ou o apresentador lhe faça a pergunta, e daria sua versão não como única. A resposta não é absoluta, como se o cientista estivesse classificando a ossada de um dinossauro que ‘morou’ no Brasil há 20 milhões de eras.

Na TV, o convidado fala para as câmeras para se ater ao ouvinte, e poderá ser um pouco diferente se houver ali uma plateia, podendo interagir com ela, com ‘uma obra, um quadro, um objeto relativo ao fato’.

As pérolas “Bom. Sabe. Estou aqui para dizer que o mundo é um mistério. O que acontece? Cadê o nosso direito de expressão? O povo ele… As vacinas elas… deveriam ser gratuitas”.

Isso cansa, e revela conteúdo ‘fosco, inerme’.

Seria melhor fechar as cortinas e encerrar a apresentação teatral. Fica para o outro dia a segunda parte dessa peça dantesca, mambembe.

Outro ponto é a repetição enfadonha “Estamos de volta ao vivo”, que muitos repetem após o intervalo de cada propaganda (nem sempre atrativa).

Enchem o ‘pensar’ do ouvinte de tudo quanto é bobice, e querem o maior índice de audiência. Assim, não vão conseguir.

É preciso falar desses programas, desses famosos que ‘dilaceram’ nossa visão, e se dizem verdadeiros. Assim, vamos pescar que seria melhor.

Mostram uma imagem, falam dela, e tudo quase sempre repetido: “Dá só uma olhada”. Curioso! “Só uma olhada” não seria para ‘confirmar a veracidade do que dizem’, seria o telespectador ‘olhar somente uma vez’ e desligar o televisor, já que pediu ‘só uma olhada’.

Circulando de forma paralela a essas frases ‘cansativas’, há outras que nos levam a pensar:

“Agora, estou webnamorando”, algo que dói. Por que ‘webnamorar’? Seria nova competência linguística que indica uma pessoa moderna, mais evoluída que outra, somente pelo fato de usar ‘vocábulos cibernéticos’ indicativos de poder?

Vá à sua rocinha e use: ‘Agora, vou tweetar com as plantas’. Em casa, ‘Vou bloguear com as vasilhas, com minhas roupas, porque precisam conviver com as facetas da webvivência’.

Para fechar, um poucochito mais.

Falam que a ‘paixão’ é algo passageiro, mas no momento de demonstrar que alguém é ‘cativo’ no que faz, de que gosta muito, que é persistente, assíduo, perseverante, há quem diga “Ele é apaixonado pelo que faz”, para dizer que o fulano tem o hábito de fazer tal coisa há muito tempo, algo ‘constante’.

Se definimos que ‘paixão’ é passageira, por que mudamos bruscamente para dizer que ‘sendo apaixonado pelo que faz’ é algo que acontece há muito tempo? A melhor resposta para essa semântica é a prova de que o dicionário tem um prisma, e nossa realidade, outro.

Condenam quem usa ‘descer para baixo’, ‘subir para cima’ etc., claro que pleonasmos viciosos, mas repetem na TV ‘O governo voltou atrás’. Quem volta ‘na frente’? Não seria suficiente ‘O governo volta e desfaz o que disse antes’? ‘O governo revoga tudo que disse ontem’?

A conclusão seria a de que ‘descer para baixo’ é erro, mas ‘voltar atrás’ é permitido por que se trata de linguagem da TV?

‘Há dez anos atrás’ também é um descalabro, mas a linguagem usa-a como se toma um cafezinho no dia a dia. Outro dizer que fere nossos ouvidos é ‘vítima fatal’, porque faleceu no acidente. A expressão vítima fatal significa a que matou a si mesma. Uma suicida? Fatal é o acidente, que mata. Há a vítima de morte, de lesão corporal etc. Somente isso.

Um visitante (T. S.) questionou se ‘jubilando-se de alegria‘ seria pleonasmo (vicioso). Sim, da mesma forma que ‘exaltando-se de alegria’. Consultado o dicionário, vemos que júbilo e exaltação podem ser sinônimo de alegria. As expressões ‘jubilar-se de alegria’ e ‘exaltar-se de alegria’, portanto, têm o mesmo viés como pleonasmo vicioso.

Basta ‘Ele jubila-se’, podendo completar adiante: ‘Sua alegria é imensa, como se pode ver’.

Abraços.

 

 

João Carlos de Oliveira

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *