0

Uma caixa de som em frente a um ponto comercial repete: Vocês pediram, e nós ‘trussemos’ (sic), e começa a passar músicas diversas

A ‘programação musical’ é louvável; para quem gosta do repertório veiculado surge o momento de se ouvirem ‘hits’ regionais.

A ‘caixa’ dá um recado comercial; a música escolhida soa estridente, e vêm toadas de ‘sofra quem quiser’.

O que nos chama a atenção é a pronúncia do verbo trazer no pretérito perfeito simples, no modo indicativo: ‘trussemos’ (cuja grafia poderia ser ‘trucemos’ ou ‘truxemos’, esta se o xis for aceito com o valor fonético de dois esses, já que a forma correta, trouxemos, não deve ser pronunciada com o som de ch).

Uma moça comanda o espetáculo.

Ela aprendeu a pronúncia assim? Vem de berço? A aprendizagem foi familiar? Ou houve engano? Não nota a diferença ou consideraria que está correta? Muitos pronunciam ‘catiguria’, que consideram a forma correta, e pensam que todos, sem exceção, a pronunciam da mesma forma.

O culto que diz ‘tiatro, pirigo, disconto’, e outros sons, pode fazê-lo pensando que outros falam do mesmo jeito. O Regionalismo tem o seu sotaque, algum forte, embora não admitido pela Fonologia.

Um exemplo, da linguagem inculta, seria ‘pregunta’, vocábulo que sofreu metaplasmo, ou corruptela, vindo do Latim ‘percontari’. A norma culta aceita somente ‘pergunta’. O Espanhol, irmão do Português, a chamada língua coirmã, pronuncia, e escreve, ‘pregunta‘. O Português falado do Período Medieval mostrou esse aspecto, que veio a se modificar anos depois. Nossos ancestrais, ou muitos deles, tinham como certa a pronúncia espontânea ‘preguntar‘.

O idioma ágrafo, o que somente se fala e não é escrito, tem uma história diferente do padrão culto, distante da linguagem gramatical ensinada na escola e ‘dita’ na norma gramatical.

Todo vocábulo tem três aspectos: a grafia, o significado, a pronúncia; esta com base em seus fonemas, quando falamos, e grafemas, quando escrevemos, pode sofrer alguma alteração com o passar dos anos, e poderíamos cometer ‘erro gramatical’.

Más pronúncias são notórias, e quando alguém comete um engano em meio ao público, o achaque é imediato; o mau falante vive todos os chascos.

Por outro lado, a Fonologia aceita que o t de tia, ou titia, como acontece na Bahia, para se citar uma região, tem diversos valores, sem nenhuma ojeriza.

A palavra porta no gauchês tem seu aspecto, no carioquês, outro, e no paranaense, talvez bem diferente dos demais, tem um R gutural muito forte.

As palavras mágoa e tábua, como vemos, têm ditongos decrescentes de mesma pronúncia embora de grafia diferente, e passam por ‘silabadas’ em todo o País, com base no sotaque, que percorre caminhos diversos: a ‘mágua’ gera o coração ‘maguado’, quando ‘má-goa’, que gera ‘ma-go-a-do’, não diz a mesma coisa da dor de cotovelo.

O proteico, que já foi ‘protéico’, de som aberto, surge também com som fechado, e seria muito chique, sem que se conteste a fala culta.

O ‘e’ que faz parte do ditongo crescente ‘eo’, como em cutâneo, tem o mesmo valor fonético como em ‘sério’, mas se alguém, como seu sotaque, pronuncia ‘a-e-rêo’, o outro critica, e exige ‘a-é-rio’, podendo cometer erro de grafia se assim o escrever.

Palavra de pronúncia difícil que nem todos a entendem quando a escutam é tênue, que gera tenuidade, que faz o plural tênues, podendo gerar debate ferrenho no meio em que não se aceitam quaisquer divergências.

Um causídico bem entrosado com a lei criminal gostava de dizer Eu sou ‘adevogado’ criminalista’, com a sua fama de bom defensor no momento do júri, sem se dirigir ao corpo de jurados, mas à plateia; esta para ele seria o máximo. A atenção deve ser dada aos jurados, e não a quem assiste ao que defensores e acusadores dizem no Dia do Júri, em que não importa o crime, mas o que se diz sobre ele. Em muitos casos, a ‘mentira’ se torna verdade, de tanto ser repetida, ou dita por uma classe famosa, e a verdade, que se fez irrelevante para o caso, se tornou uma ‘mentira’, gerando a aberração jurídica defendida pelo causídico famoso, que pode ganhar causas ‘impossíveis’.

Já ouvi muito alguém dizer ‘arrecardar’ no lugar de ‘arrecadar’ fundos para a Igreja construir o Salão Paroquial.

Agora, tente pronunciar corretamente ‘pterígio’, e passe para gnomo, pneu (não o deixe ser ‘peneu’), ao lado de mnemônico, tmese, psicológico, alcoólico (al-co-ó-li-co), exemplos de palavras que sofrem em nosso modo displicente de dizer as coisas.

Vem a Silabada, pronúncia (considerada) incorreta, conforme a Fonética.

São muitos exemplos.

Fluido (de isqueiro) vira ‘fluído’ (a água tinha fluído pelo cano).

O ínterim se torna ‘interim’, e passa batido, chegando a se dizer que há duas grafias: com acento (ínterim), proparoxítona, e sem acento (in-te-rim), vocábulo oxítona.

O recorde se torna ‘récorde’, similar ao ‘record’, do Inglês, que não é o ‘record’ (oxítona), do Francês.

É mister, sim, ‘é necessário’, e nada tem a ver com Mr., do Inglês ‘mister’ (paroxítona).

A Gramática nos ensina, e aceita, que há ‘projetis’, mas não aparece escrito em texto criminalístico, ou pronunciado assim por um especialista, que sempre diz ‘os projéteis’, que foram identificados pela Perícia Científica.

Diga No-bel (oxítona), ma-qui-na-ri-a, mas maquirio, ao contrário, estaria cometendo a Silabada, erro gritante de pronúncia.

Imagine que o ‘zênite’, o fim, que nasce de ‘zenith’, deu o nome próprio feminino Zenite, tão singularmente usado por aí.

Deveríamos dizer ‘pantano’, paroxítona, mas se tornou ‘pântano’, proparoxítona.

Fica o espaço para você que nos visita relacionar no seu caderno as palavras que sofrem com uma pronúncia diferente.

Hieroglifo ou hieróglifo? Autopsia ou autópsia? Oceania ou Oceânia? Levedo ou lêvedo?

E a pronúncia do cabra arretado, como alguns termos de Vidas Secas, de Graciliano Ramos, como é vista? Cite os exemplos.

Complete sua lista com ‘tóchico, truche, bescoito, melencia, jugar (bola), iogute’. E estas, sem acento gráfico: ioga, obeso, torpe. Palavras estrangeiras, não aportuguesadas, vivem uma miscelânea fonética. Pizza está entre elas.

Abraços.

 

João Carlos de Oliveira

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *